Hora de ter cuidado para a campanha não seguir rumo à baixaria
19 julho 2014 às 13h37
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Material apócrifo contra Marconi foi distribuído fartamente na inauguração do comitê de Iris Rezende. Se a coligação comandada pelo PMDB entrar por esse viés, corre sério risco de fazer um jogo desleal, inconsequente e suicida
No início dos trabalhos eleitorais, logo após as convenções, esta é uma das tradicionais primeiras falas dos candidatos, ainda que com algumas variáveis: “Vamos fazer uma campanha propositiva e procurando sempre manter o alto nível do debate.” Se declaração com esse formato contasse como uma das muitas promessas que os postulantes fazem durante os meses de corrida atrás do voto, poder-se-ia assegurar: a maioria já estaria desonrando compromissos assumidos mesmo antes de chegar às urnas.
É que, quando os índices das pesquisas de intenção de voto não sobem ou começam a patinar e não há uma coordenação de campanha que priorize a ética como valor, instaura-se, em meio ao desespero, a busca pelo objetivo — ser eleito — sem que haja um comedimento no uso da estratégia — o “como” ser eleito. O fim não só justifica, mas também avaliza os meios. A eleição vira um vale-tudo.
Uma das armas do lado obscuro das campanhas é a farta distribuição de material apócrifo. Como de resto ocorre em todo o País, essa tática pouco digna também não é raridade em Goiás. Pelo contrário, esteve presente em eleições anteriores e, infelizmente, deverá voltar a ser notícia no próximo pleito.
Para citar um exemplo de dez anos atrás: em 2004, o então prefeito de Goiânia, Pedro Wilson (PT), candidato à reeleição, já em desvantagem em relação ao adversário Iris Rezende (PMDB), às vésperas do dia da votação, foi vítima de um material sem assinatura em que aparecia em uma charge com seu rosto em corpos de tartaruga e de bicho-preguiça. A ideia dos panfletos era fazer colar à imagem do petista— como, aliás, já tinha conseguido — a figura de político sem agilidade e sonolento, incapaz de administrar uma capital.
Agora, no início de uma nova e disputada campanha, já aparecem notícias de panfletos apócrifos. Eles circularam durante a abertura do comitê de Iris Rezende, que disputará a sucessão estadual pela terceira vez contra Marconi Perillo (PSDB). O impresso tentava sustentar uma suposta ligação entre o governador e Carlos Cachoeira, o empresário ligado a jogos e pivô da Operação Monte Carlo.
De acordo com a legislação eleitoral (Resolução 23.191 do Tribunal Superior Eleitoral), todo material impresso de campanha eleitoral precisa conter o número do candidato no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) — há uma inscrição específica nesse sistema para cada um dos postulantes —, além do CNPJ ou CPF do responsável por sua confecção. Isso ocorre para que haja o devido controle e, obviamente, para que o candidato seja identificado e, caso necessário, responsabilizado por alguma ocorrência.
Há brechas na legislação eleitoral, mas, mais do que isso, na prática têm havido apenas punições brandas: se um juiz fizesse a mais radical das interpretações, o máximo a que poderia condenar um autor de material apócrifo seria a dois anos de prisão, o que não confere regime fechado. Ou seja, de fato não há cadeia para quem opta por essa tática eleitoral nada ética.
A preocupação com a disseminação de inverdades e injúrias por meio da reprodução e distribuição de material físico é antiga. O que não há são medidas efetivas para combatê-la. Em vez de um cenário com tendência a se tornar mais positivo, outra ameaça aos princípios da democracia está cada vez difundida: a agressão virtual.
À mesma maneira que o panfleto apócrifo, a divulgação de banners e textos pela internet de forma a ridicularizar determinado candidato ou coligação tornou-se mais uma opção para quem quer disseminar a mentira e jogar ódio na disputa eleitoral. Nas redes sociais, esse tipo de material é geralmente introduzido por fakes. É bom ressaltar que fakes são perfis constituídos apenas com a finalidade de fazer o que não pode ser feito abertamente, portanto, de forma transparente. Fakes existem para executar delitos de autoria desconhecida. Quem fala ou divulga algum material por meio de um fake é antes de tudo um covarde, até que se prove o contrário.
Seja por material impresso ou virtual, a Justiça Eleitoral precisa obter meios para reprimir com rapidez, rigor e eficácia as tentativas de levar o jogo eleitoral para longe da discussão de proposta e para perto do abismo das baixarias. Especialmente a disputa goiana merece atenção, porque os adversários já se conhecem e são arquir-rivais. Mais do que isso, Iris Rezende quer porque quer a revanche com Marconi Perillo, para quem já perdeu duas eleições. E sabe que essa é sua última chance, seja pelo fator idade, seja pelo fator desgaste político.
No caso da inauguração de seu comitê eleitoral, por ser um material apócrifo, não se pode acusar diretamente a direção do PMDB por sua confecção. O que é possível dizer é que, no mínimo, houve tolerância da coligação à distribuição, ocorrida em um evento de sua responsabilidade. Se o partido entrar por esse viés, corre sério risco de fazer um jogo desleal, inconsequente e suicida. Desleal, porque bate em um tema já totalmente dissecado — a vida de Marconi já foi revirada e o próprio governador já passou por uma dura sabatina de uma CPMI, respondendo a todos os questionamentos e saindo aplaudido até por quem em princípio o havia acusado; inconsequente, porque rebaixa desde já o nível da corrida eleitoral, podendo causar desdobramentos nada agradáveis à condução da disputa, já que para cada ação há uma reação; e suicida, porque são muitos os esqueletos no armário do PMDB e cada um deles — o dinheiro da Caixego, a quebra do BEG, o caso Astrográfica, a venda de Cachoeira Dourada etc. — ainda está no arquivo de dados da memória do eleitor. E tudo o que o PMDB não precisa, agora que quer pautar um discurso de ética na política e traz para seu lado uma figura como Ronaldo Caiado (é bom lembrar que o deputado do DEM foi um dos que mais denunciou os escândalos peemedebistas), é se ver envolto pelos erros do passado.