Governo Lula é melhor do que dizem seus críticos e pior do que acreditam os petistas
14 julho 2024 às 00h00
COMPARTILHAR
De acordo com reportagem do jornal “Valor Econômico”, a economia do Brasil deve crescer entre 1,9% e 2% em 2024 (o FMI sugere um crescimento de 2% a 2,5%). A expectativa do mercado é quase sempre pessimista, por isso há a possibilidade de o dado variar para cima, como ocorreu em 2023.
Sobre o governo Lula da Silva, há “indicadores” positivos, como a inflação baixa, a estabilidade político-institucional, apoio dos bancos públicos ao empresariado e manutenção da segurança jurídica nos tratos com o mercado.
Em termos de economia, nem tudo é positivo. Mas, em alguns momentos, aquilo que expressa o diário “Estadão”, que parece fazer oposição político-ideológica ao governo Lula da Silva e ao PT, não é o mesmo que veicula o “Valor Econômico”, do Grupo Globo. Na quinta-feira, 11, o “Valor” deu três notícias com destaque na capa. Primeiro, “Shopping centers — Setor supera pela primeira vez a receita pré-pandemia e segue em transformação com mais serviços”. Segundo, “Agronegócios — Inpasa, maior produtora de etanol de milho da América Latina, investe R$ 5 bilhões em novas fábricas e expansões”. Terceiro, “Energia — Compass assume o controle da Compagas por R$ 906 milhões. ‘Foco em ativos que destravam valor’, diz Simões”.
As informações do maior jornal de economia do país — e há mais dados positivos — sugere que a economia está ativa, em movimento, com novos investimentos. Noutras palavras, o governo de Lula da Silva não está contribuindo para paralisar o país. Pelo contrário, está incentivando o crescimento porque sabe que a expansão dos negócios capitalistas é vital ao desenvolvimento (ao social).
Realista e racional, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem operado no fio da navalha, tentando segurar, ao menos parte, a expansão dos gastos públicos. Sabendo, é claro, que se trata de uma missão impossível. Porque o que se faz mesmo não é parar o gasto público, dentro do limite proposto. Batalha-se, isto sim, para que o gasto público não ultrapasse em muito a meta traçada. As enchentes do Rio Grande Sul exigem, desde já, pesados investimentos do governo federal. Ou seja, o governo Lula da Silva terá de gastar — está gastando — com um problema, de grande proporção, que não havia sido previsto.
O Estado (com sua face visível, o governo) não é uma empresa privada. Como tal, investe a fundo perdido, como no caso da enchente do Rio Grande do Sul. Depois, o mercado, com sua cantilena habitual, vai chorar as pitangas nos jornais, corroborado por colunistas ditos liberais. O gasto público, se excessivo — e, em geral, os governantes, como o “liberal” de direita Jair Bolsonaro e o socialdemocrata Lula da Silva, são gastadores inveterados —, é nocivo. Porém, por mais que o mercado sugira o contrário, a função do governo não é ter lucro (financeiro), exceto lucro social.
Os Estados Unidos, o país mais rico do mundo, tem uma dívida pública imensa. Para financiar os gastos do governo, com suas guerras e outras coisas? Não só. Muitas vezes, como no governo do ex-presidente Barack Obama, para financiar o mercado, que é vítima, na maioria das vezes, de seus próprios erros, e não dos equívocos do Estado.
A crise imobiliária americana, durante o governo de Barack Obama, resultou da “pressa” em lucrar do mercado capitalista, da falta de sustentabilidade de seus investimentos e empréstimos aos cidadãos. Portanto, se o mercado imobiliário dos EUA quebrou (como está quebrando o chinês), levando de roldão vários bancos, o Estado nada tem a ver com isto. Porque, em defesa da liberdade econômica, a iniciativa privada é contrária a medidas regulatórias.
Então, se o estado gasta muito (e, não raro, mal), ao financiar a sociedade e o mercado (a Caixa Econômica Federal, o BNDES e o Banco do Brasil são, digamos assim, seus “sócios”), o mercado comete, por vezes, vários equívocos — por exemplo, ao criar necessidades, como a aquisição desenfreada de imóveis (e outras mercadorias, como automóveis), às vezes muito caros, sem que os indivíduos tenham, no médio prazo, condições de pagá-los. Noutras palavras, os empresários e banqueiros tentam criar um mercado — compradores para seus produtos —, a fórceps, mas, a partir de determinado momento, as pessoas não têm condições de pagar por “seus” sonhos. Daí a quebra das famílias e, por extensão, do mercado.
Governo Lula: estrumbica por que não comunica
No momento em que é mais criticado por alguns jornais, como “Folha de S. Paulo” e “Estadão” — que em tese são a voz do mercado —, os índices de Lula da Silva começam a melhorar. Por qual motivo?
De acordo com pesquisa da Genial/Quaest, divulgada na quinta-feira, 11, o governo de Lula da Silva é aprovado por 54% dos brasileiros (subiu 4%). Numa sociedade democrática, com a crítica livre, o índice não é ruim. Pelo contrário, é positivo. A reprovação caiu de 47% para 43%.
A pesquisa mostra que a população aprova Lula da Silva nas críticas aos juros altos determinados pelo Banco Central. É por ter pesquisas próprias, as chamadas “internas”, que o presidente permanece no ataque ao presidente do BC, Roberto Campos Neto.
Porém, ao contrário do que prega o petismo, Roberto Campos Neto não joga nem contra o governo nem contra o país. A política de juros é realista e tem sido responsável pelo controle da inflação.
Quando bombardeia Roberto Campos Neto, para agradar a plateia, Lula da Silva conquista popularidade, mas o país sai perdendo. Porque sua fala, afinal trata-se do presidente da República, gera instabilidade no mercado. No caso, o populismo não é positivo para o país. Não é só o mercado que perde quando o dólar sobe. Todos perdem, inclusive os pobres.
A crítica de Lula da Silva aos banqueiros é inócua, mas as pessoas gostam quando um político “bate” num poderoso, numa espécie de “Judas”, no “agiota”. Na verdade, os banqueiros sempre lucraram e, no momento, não são responsáveis por nenhuma crise no país. Porque estão fazendo o que sempre fizeram: especulando e ganhando dinheiro. Se a economia crescer acima de 3%, lucram ainda mais. Então, é tolice acreditar que torcem contra o governo Lula da Silva. Ninguém, em sã consciência, torce contra o próprio bolso.
Se o Brasil não cresce em níveis chineses, a culpa, a rigor, é menos do governo Lula da Silva e muito mais dos empresários brasileiros, que, desde o auge da pandemia, estão cautelosos nos investimentos. Por mais que os economistas deblaterem, em sua multiplicidade de pontos de vista, não há prova cabal de que o país cresce pouco por causa do governo Lula da Silva. Mas os banqueiros também não estão travando nada, porque a eles interessa o crescimento econômico, e não a estagnação ou a recessão.
Discutir o crescimento reduzido como responsabilidade apenas do governo é ignorar a parcela de responsabilidade do mercado. Se o governo Lula da Silva, dada a segurança jurídica comprovada, não trava os investimentos — pelo contrário, suas estruturas financeiras (BNDES, CEF e BB) estão investindo —, pode-se sugerir que, de maneira geral, o mercado é, na essência, culpado por um crescimento de menos de 3%. Não seria a hora de sugerir que o mercado — os empresários — assuma sua “culpa”, ao menos em parte, pelo problema?
Por que, se tem menos culpa do que parece, quando se trata de um crescimento econômico tido como não satisfatório, o governo Lula da Silva não consegue dizer isto, com todas as letras, à sociedade?
Porque não tem uma política de comunicação assertiva, com grande capacidade de inserção na sociedade.
A comunicação do governo Lula da Silva precisa entender, convencendo primeiramente o presidente, que as pessoas, a maioria, não estão interessadas no debate ideológico e se Roberto Campos Neto é liberal ou um epígono dos banqueiros. A popularidade da gestão do petista-chefe crescerá se a vida das pessoas, no dia a dia — na hora de fazer compras, alimentar-se e divertir-se —, melhorar.
O que as pessoas comuns, avessas ao debate ideológico — esquerda versus direita —, querem é consumir, alcançar certo nível de satisfação.
Na questão da segurança pública, há a sensação, na sociedade, de que o governo de Lula da Silva não se preocupa muito com o assunto. Com o crime estando altamente organizado, dando lição de empreendedorismo no mercado — o PCC já teria a quinta maior rede de postos de gasolina do país —, o governo federal não deve brincar em serviço.
Fica-se com a impressão de que, em termos de segurança pública, o governo Lula da Silva prefere o debate a respeito da criminalidade, como a discussão acadêmica sobre suas causas, ao combate imediato e sistemático a um problema que preocupa a sociedade (por causa do tráfico de drogas e da violência). Na verdade, há combate. Mas prevalece a ideia de que se fala mais do que se ataca o crime organizado.
Diz-se que Lula da Silva, de 78 anos, é um presidente analógico. E é mesmo. Seria até estranho se não fosse. Mas o governo não pode ser analógico e, por isso, precisa modernizar sua comunicação. (Um parêntese: há muita coisa digital por aí que é de um primarismo tanto na forma quanto no conteúdo. O bolsonarismo é mais digital, por assim dizer, que o petismo no poder. Mas, quanto ao conteúdo, é um desastre. Porque não quer informar, e sim convencer, com ideias primárias e manipuladas, seguidores a atacar seus adversários.)
Há uma intelligentsia de esquerda, com presença na e fora da universidade — hábil no uso de inteligência artificial, para citar um aspecto —, que o governo de Lula da Silva não está sabendo utilizar para melhorar a imagem de sua gestão e, mesmo, do país.
Então, se a imagem do governo Lula da Silva é pior do que o próprio governo (que, frise-se, não é excelente — sobretudo, é lento para pôr as coisas em funcionamento; há quem brinque que o “motor” do ministro Ricardo Lewandowski, um homem sério, só vai pegar em outubro de 2026), a culpa é menos do excesso das falas do presidente (que se comunica bem, mas precisa ser orientado sobre os novos tempos da comunicação, pois está fora do tom) e muito mais daqueles que operam a comunicação do governo. Talvez o presidente seja menos analógico do que parte de seus auxiliares.
Não se pode falar em paraíso brasileiro, mas o governo Lula da Silva é, insistamos, menos ruim do que aparenta. É a sensação de que o governo não anda — estaria paralisado — que precisa ser combatida… com uma comunicação moderna, atenta às redes sociais. Noutras palavras, o que o petismo, o moderno, precisa fazer é colocar as ideias no lugar. Sem precisar mentir. Basta usar a verdade. O “Valor Econômico” mostra todos os dias, com n informações, que o país não está nada mal (também não diz que está uma maravilha, ao contrário do que pensam muitos petistas). Os criadores da comunicação red deveriam ler o jornal com o máximo de atenção. Os fatos do “Valor” são mais ricos do que as opiniões do “Estadão”.