Pesquisas refletem com precisão o quadro real do país ou apenas a insatisfação das pessoas, que, no geral, querem mudanças substanciais e rapidamente?

No momento, talvez porque não esteja conseguindo inspirar esperança e confiança, o governo do presidente Lula da Silva não está sendo bem avaliado pelos brasileiros. Em termos de intenção de voto, figura atrás do ex-presidente Jair Bolsonaro — que é inelegível — e tem Michelle Bolsonaro, ambos do PL, nos seus calcanhares.

Bolsonaro fez, entre 2019 e 2022, um grande governo? Não fez. Pelo contrário, embora a memória seja curta, na sua gestão, por causa de seus equívocos anticientíficos e negacionistas, morreram quase 700 mil pessoas, em decorrência da Covid. O desmatamento da Amazônia atingiu níveis altos. As desigualdades sociais aumentarem. O país não cresceu em níveis satisfatórios.

Para piorar o quadro, Bolsonaro conspirou contra a democracia e contra o Supremo Tribunal Federal. O ex-presidente tramou um golpe de Estado. Não deu certo. Mas as digitais do golpismo são, como todos sabem — e não apenas o tenente-coronel Mauro Cid —, de Bolsonaro.

Uma das vantagens de Lula da Silva é que, ao contrário do presidente anterior, não trama contra a democracia e não persegue integrantes dos poderes Legislativo e Judiciário. Do ponto de vista político e institucional, o país está em paz.

O governo do petista-chefe opera, com os programas sociais, para reduzir as desigualdades sociais. A situação dos pobres tem melhorado.

Lula e Bolsonaro: dois populistas, um de esquerda e o outro de direita | Foto: reprodução

Mas a classe média, que se sente órfã — não considera ter representantes no governo federal e parece acreditar que Bolsonaro a representa —, não está convencida de que Lula da Silva faz um governo “positivo”, com crescimento econômico que, se não é em ritmo chinês, não é de todo ruim.

A economia capitalista precisa mesmo do governo para crescer? Em parte, sim. Porque, se o governo atrapalha, o mercado anda mais devagar. A rigor, o governo de Lula da Silva está atrapalhando? Pelo contrário, não está. Não há nenhuma evidência disso.

Porém, o capitalismo no país está cauteloso, e não por causa do governo Lula da Silva — que, na verdade, é um aliado, inclusive com financiamento público —, e sim, sobretudo, por causa do mercado internacional. Há o problema do preço do petróleo. Há a possibilidade de queda de importações de commodities. Ou seja, são problemas que o governo petista, mesmo que quisesse, não tem como resolver.

Se capitalistas não investem, ou se investem menos, não é por falta de recursos — públicos e privados. O que eles temem? Nem é o endividamento em si. Mas a possibilidade de, não conseguindo vender os produtos, com preços satisfatórios, de recuperação judicial e, mesmo, falência.

Piorando o que não é excelente mas não é ruim

O país não vai mal. Mas a comunicação do governo Lula da Silva não consegue explicar isto aos brasileiros. Uma comunicação mais moderna — menos analógica, digamos assim — poderia mostrar ao país o que se está fazendo, quais resultados já se obteve (no campo social é evidente) e quais se poderá obter.

Como há uma oposição forte e aliados que se comportam como oposição — operando para manter o governo fragilizado, porque isto o torna refém —, a imagem que se passa é que tudo ou quase tudo está dando errado.

A imprensa, para manter sua ética do deslize — ou seja, a vigorosa instância crítica contra tudo e contra todos —, também parece não compreender o que está acontecendo no país. Para se mostrar crítica parece ter prazer em “piorar” aquilo que, de fato, não é excelente. Mas também não é ruim.

O que Lula da Silva pode fazer? O presidente envelheceu, mas não em termos de idade, porque permanece lúcido. Envelheceu no sentido de manter uma equipe que, cozinhadinho de quintal, está “perdida” e não consegue responder ao país real.

Com sua equipe de ministros, Lula da Silva faz o governo das boas intenções, mas, no geral, não o dos bons resultados. Quando atrasa as negociações com o Centrão, por inapetência de sua articulação política, que tartarugueia, o governo petista mostra imperícia.

A tendência é que se veja o Centrão — que, ao lado do Exército, não apoiou o golpe de Estado programado por Bolsonaro — tão-somente como fisiológico. Não se está dizendo que não é. Mas, quando se faz um compromisso, é preciso cumpri-lo. O atendimento ao Centrão e aos outros grupos políticos pode, quem saber, acelerar o governo de Lula da Silva.

O que tem faltado ao governo Lula da Silva são o realismo, o pragmatismo e a pressa do Centrão. A tática de ceder, mas tardiamente, criando arestas que podem se tornar instransponíveis, não tem funcionado. O presidente é, dos petistas, o mais pragmático. Mas tem parecido pouco atento. Mas é o que o país tem de melhor, no momento — inclusive para garantia da democracia.

Novo fenômeno: direitas quase pós-bolsonaristas

Ronaldo Caiado: o governador integra uma direita civilizada, democrática e moderna | Foto: Divulgação

Se o governo de Lula da Silva não é tão ruim, e se o petista é melhor do que Bolsonaro, por que aparece atrás do político da extrema-direita? Por que a economia não vai bem? O fato é que a economia não vai tão mal assim. Basta perguntar para um produtor de soja de Rio Verde, Catalão, Cristalina ou Jataí se seus negócios estão ruins. Não estão.

Entretanto, as pesquisas registram um quadro real preocupante para o PT e as esquerdas em geral. As direitas estão fortíssimas e, dependendo dos resultados — e não dos discursos — do governo Lula da Silva, sobretudo em termos de economia, podem se tornar ainda mais sólidas.

As pesquisas de intenção de voto para presidente — extemporâneas, é claro — têm exibido dados pouco analisados. Primeiro, a esquerda só tem um nome no jogo — Lula da Silva, do PT. Ciro Gomes, do PDT, aparece relativamente bem, ao lado (e até, ligeiramente, na frente) de postulantes da direita.

Tarcísio de Freitas: é bolsonarista mais por razões eleitorais | Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

Mas, assim como absorveu Leonel Brizola, impedindo que se tornasse presidente, Lula da Silva absorveu Ciro Gomes. A ira do político do Ceará é que sabe que, enquanto o petista estiver na política, ele ficará fora do circuito federal, em termos de Presidência da República.

No campo da esquerda, como político invasivo, Lula da Silva não abre espaço para uma alternativa. Porém, ao mesmo tempo, acaba por ficar isolado. Porque, se Ciro Gomes estivesse ao seu lado, poderia atrair um público da classe média que, apoiando o paulista do Ceará, é relativamente parecido com o eleitorado bolsonarista. O moralismo de Bolsonaro é quase o mesmo que põe Ciro Gomes no jogo, mas não para ganhar, e sim para competir.

Ciro Gomes não emplaca porque “perde” na esquerda para Lula da Silva e “perde” na direita — na questão do moralismo de matiz udenista — para Bolsonaro.

Romeu Zema, governador de Minas Gerais: seu problema é o provincianismo | Foto: Reprodução

Há um segundo aspecto. Com Bolsonaro, entre 2018 e 2022, havia uma direita — cada vez mais radicalizada. O radicalismo, os excessos contra a democracia, por certo afastou parte do eleitorado de centro — aquele que, sem aderir ao debate ideológico, acabou optando por Lula da Silva em 2022.

Com seu discurso iracundo — antidemocracia, anti-mulher (ainda que de verniz misógino-heterossexual) e anti-imprensa —, Bolsonaro perdeu, digamos, conexão com parte das classes médias, que, politicamente, são de centro-direita.

Em 2024, houve uma mudança no quadro político. Bolsonaro, com o bolsonarismo, continua forte — tanto que aparece à frente de Lula da Silva, mas num quadro de empate técnico, o que é sempre perigoso eleitoralmente. Para dos dois.

Vale insistir que a eleição de 2026 será realizada daqui a dois anos e quatro meses. Ou seja, o quadro pode mudar até lá. Mas há a questão de que, apesar da distância, o jogo eleitoral está nas ruas, com antecipação habilmente articulada pelas direitas.

Vale sublinhar: direitas. Não há mais só uma direita. Há direitas e elas não são inteiramente bolsonaristas. Nem mesmo o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, do partido Republicanos, integra a direita empedernida do bolsonarismo. Pode-se sugerir que integra uma facção da direita bolsonarista racionalista e, tudo indica, democrática. Ele tem os pés no chão. Pode precisar de Bolsonaro, inclusive para ser reeleito no Estado mais rico do país, mas não de todas as ideias — algumas alopradas — do bolsonarismo.

Talvez seja possível sugerir que Tarcísio de Freitas integra uma direita tecnocrata — ao estilo da equipe do presidente Ernesto Geisel, na década de 1970. No fundo, deve rir dos excessos e, até, do provincianismo de Bolsonaro e de vários bolsonaristas.

Há também o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, do União Brasil, que tem um discurso mais afiado do que o de Tarcísio de Freitas e outros integrantes da direita.

No caso de Ronaldo Caiado, não é apenas discurso, que é, enfatizemos, afiado. O governador pode mostrar resultados ao país.

Na questão da segurança pública, área sobre a qual se fala muito e se faz pouco, Ronaldo Caiado acertou a mão. A criminalidade no Estado caiu e os artífices do crime organizado, ainda que atuem em quaisquer lugares, receiam operar em Goiás. Na verdade, estão em todos as regiões, mas no Estado é combatido de maneira mais dura e articulada. O tema segurança tende a ser um dos pontos-chaves do debate da disputa eleitoral de 2026.

Um pacto das elites, que envolve políticos, empresários e magistrados, enterrou a Operação Lava Jato e ainda tenta denunciar aqueles que a investigaram, denunciaram e condenaram corruptos. Os eleitores certamente estão observando isto? Estão aprovando? É possível que não. Então, em 2026, o tema da corrupção pode voltar com energia redobrada.

Mais uma vez, Ronaldo Caiado pode se sair bem. Porque faz um governo sem corrupção. Quando surge uma denúncia, mínima que seja, corta o início do mal pela raiz. Uma mera suspeição acarreta o afastamento do auxiliar. O governador não titubeia quanto à questão da probidade.

Ratinho Júnior: seu nome, se for candidato a presidente, vai virar piada global | Foto: Marcelo Andrade

No campo social, à semelhança do governo do PT, Ronaldo Caiado criou uma ampla rede de proteção — o que o aproxima do centro, quer dizer, da socialdemocracia. Ou seja, ele tem um discurso — um diferencial — que o bolsonarismo não tem.

Ronaldo Caiado, médico e homem da ciência, se coloca, mais uma vez, acima do bolsonarismo negacionista.

Há, por fim, Ratinho Júnior e Romeu Zema. Talvez possa até parecer preconceito, mas pode um país que é a nona (se tornando a oitava) maior potência do mundo eleger um presidente com o nome de Ratinho? Vai virar piada internacional. Por certo, dirão: “Se virar presidente, vai se tornar Ratão”.

Romeu Zema é pão de queijo demais — quer dizer, mineiro em excesso (nada tem a ver com Juscelino Kubitschek, que era um político cosmopolita) — para se tornar palatável ao país. É um gerentão. Só isso. O país precisa é de um estadista que, ao mesmo tempo, saiba administrar. No momento, existem três: Ronaldo Caiado, Lula da Silva e Tarcísio de Freitas. Os dois primeiros são hábeis profissionais da política, mas também gestores experimentados.