A eleição para presidente da República será disputada daqui a três anos e um mês. Longe, portanto. Mas não tão longe assim. Tanto que políticos e mídia mencionam o assunto com frequência. A disputa para prefeito, em 2024, daqui a um ano e um mês, está na ordem do dia, e não apenas por si. É que, de alguma maneira, se trata do prefácio de 2026. Tanto a esquerda, controlada pelo PT do presidente Lula da Silva, quanto a direita, com influência bolsonarista, já estão se colocando, apontando nomes, por exemplo.

Na esquerda, se estiver bem de saúde, aos 81 anos, Lula da Silva deverá ser o candidato. Sem o petista-chefe, a tendência é que o PT apoie o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, possivelmente com a ministra do Planejamento, Simone Tebet, do MDB, na vice.

Geraldo Alckmin, Lula da Silva e Fernando Haddad: nomes para 2026 | Foto: Divulgação

Com o apoio de um general eleitoral do porte de Lula da Silva, uma chapa com Fernando Haddad e Simone Tebet é, sem dúvida, forte. E será ainda mais sólida se o presidente tiver feito um bom governo, com crescimento econômico, redução da inflação, mais empregos e ampla segurança jurídica. (Geraldo Alckmin, político de direita incrustado no PSB, tem alguma chance? Tudo indica que não consegue motivar nem os velozes e elétricos falcão-peregrino e guepardo. E o PT, hegemonista até os ossos, não aceitaria bancar seu vice.)

Qualquer que seja o adversário bancado pela direita, o postulante da esquerda será difícil de ser derrotado. Pode ser vencido, sobretudo se a economia do país não crescer ou crescer pouco, mas será um páreo duríssimo. Se os pobres e as classes médias forem bem atendidos pelo governo federal, o postulante do PT pode até ser favorito para a disputa de 2026.

Há, porém, o fato de que a direita está viva, vivíssima, e à espreita. Desde já, figura como alternativa à gestão do PT. Tanto que tem três nomes consistentes — Romeu Zema (partido Novo), Ronaldo Caiado (União Brasil) e Tarcísio de Freitas (Republicanos).

A força de Romeu Zema e Tarcísio de Freitas advém mais do fato de administrarem Estados ricos — Minas Gerais e São Paulo — e altamente populosos, portanto com o maior número de eleitores do país, do que propriamente de serem homens de ideias.

Calado, Romeu Zema é um poeta

Calado, Romeu “Eu Ouvo” Zema é um poeta — quase o William Shakespeare dos trópicos. Falando, bem, falando é um verdadeiro Dunga, ou seja, um perna de pau.

Há pouco tempo, quando um radialista mencionou o nome da poeta Adélia Prado — espécie de Carlos Drummond de Andrade de saia —, Romeu Zema perguntou se trabalhava na rádio. Consta que até os microfones, de tanta vergonha, ficaram silentes. Então, jornalistas, nada perguntem sobre Abgar Renault (1901-1995), poeta e tradutor mineiro. O governador talvez pergunte: “É francês?” Há o risco de inquirir se é chinês.

Romeu Zema: o rei das gafes de Minas Gerais | Foto: Reprodução

Mas o problema de Romeu Zema — um Capuleto ou um Montecchio ou os dois num só? — nem é só de (falta de) conhecimento (é bem provável que pense que Guimarães Rosa é dono de floricultura e “Grande Sertão: Veredas” é um livro de botânica). Sobretudo, o político de Araxá, ao que parece, é um mestre do preconceito.

Agora, Romeu Zema decidiu postar-se contra o Nordeste e o Norte, propondo uma frente do Sudeste-Sul contra os brasileiros do Ceará, da Bahia, de Alagoas, de Sergipe, de Pernambuco, do Piauí, da Paraíba, do Maranhão, do Rio Grande do Norte, do Pará, do Amazonas, do Tocantins, do Acre, de Roraima, do Amapá e de Rondônia.

Romeu Zema, o Romeu “Zero”, de acordo com políticos nordestinos e nortenses, sugere que os Estados mais pobres absorvem mais recursos federais. Daí propor uma “guerra” do Sul contra o Norte.

Numa entrevista ao “Estadão”, o ex-secretário da Receita Federal disse aquilo que, se não pensasse só em Minas, Romeu Zema também diria: “As desigualdades existem, o objetivo do Estado brasileiro é reparar as desigualdades e jamais repararia se houvesse uma transferência proporcional”.

Se calado é um poeta, falando Romeu Zema é um fuzil atirando no peito do próprio atirador. O governador de Minas — Estado de Juscelino Kubitschek, Milton Campos e Tancredo Neves (velhos e bons tempos) — planeja disputar a Presidência da República em 2026.

Entretanto, como poderá disputar eleição para presidente se está declarando guerra ao Nordeste? Romeu Zema, por certo, perdeu o senso, o bom, e, quiçá, a memória. Remember 2022. Jair Bolsonaro perdeu para Lula da Silva, em larga medida, porque, antes, perdeu o Nordeste para o petista-chefe.

O Nordeste, que sabe se unir, é uma máquina de destruição de políticos que só têm olhos e bolsos para o Sul dito maravilha. Parece que o Montecchio que habita Romeu quer matar o Capuleto que há no Zema.

Tarcísio de Freitas: saindo do jogo?

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, tem até cara de capataz de fazenda escravagista. Porém, é mais esperto do que Romeu Zema.

Tarcísio de Freitas quer ser candidato a presidente da República? Até quer. Mas sabe que São Paulo não é apenas um Estado — é um país poderoso e riquíssimo, mais afortunado do que os demais países da América do Sul (é a Califórnia patropi, em termos de dinheiro).

Lula da Silva e Tarcísio de Freitas: o governador vai enfrentar o presidente? | Foto: Ricardo Stucker

Com mais chance de ser reeleito, Tarcísio de Freitas pode optar pelo realismo político. Na quarta-feira, 9, o integrante do Republicanos disse: “Não preciso ser candidato à Presidência, não serei e vou apoiar quem o Bolsonaro apoiar”.

A fala é inteligente e, como quase tudo em política, é preciso verificar o duplo sentido, sobretudo o que é subliminar, o subtexto. A rigor, Tarcísio de Freitas está dizendo exatamente que não será candidato a presidente em 2026?

Pode até ser. Mas há outra interpretação possível. Ciente da força de Bolsonaro, ainda um general eleitoral, Tarcísio de Freitas pode estar sugerindo outra cousa, ou seja, que só será candidato se contar com o apoio do ex-presidente. Isto, é claro, agrada ao bolsonarismo. Mostra (suposta) humildade e (suposta) subserviência.

Presidência pode cair no colo de Caiado?

Se sair do páreo, Tarcísio de Freitas deixa uma avenida aberta para outra alternativa política, não do tipo Romeu Zema — que os nordestinos amarão odiar em 2026 —, e sim do perfil de Ronaldo Caiado, o governador de Goiás.

O ex-prefeito de Salvador ACM Neto, do União Brasil, afirmou, recentemente, que Ronaldo Caiado é uma grande alternativa para presidente. ACM Neto representa Bahia, um dos Estados mais tradicionais e emblemáticos do país.

Sem Romeu Zema, inimigo de si próprio, e sem Tarcísio de Freitas, o que farão a direita e a centro-direita? O mais provável é que busquem um candidato à direita, posicionado, com história definida — sem hesitações —, mas, diferentemente de Bolsonaro, com discurso civilizado, moderado.

Governador Ronaldo Caiado: um gestor bem avaliado | Foto: reprodução

Apesar de sua firmeza proverbial, de seu discurso preciso, cortante e posicionado, Ronaldo Caiado não é radical, extremista. Pelo contrário, é moderado e agregador. Tanto que mantém uma relação republicana com o presidente Lula da Silva e com seus ministros, como Fernando Haddad.

Ronaldo Caiado não fala bobagens — é o anti-Romeu Zema, em termos de linguagem — mas, em termos de convicções, não contemporiza. Isto agrada ao eleitorado que não é de esquerda, sobretudo os eleitores de direita, de centro-direita e de centro. A firmeza do governador transmite credibilidade, confiança, segurança.

O que diferencia Ronaldo Caiado da direita dita selvagem — a extrema-direita — é o seu liberalismo verdadeiro. Pode-se sugerir que é mais liberal do que conservador, ao contrário do que se costuma postular. Sua defesa da ciência, desde o início da pandemia da Covid-19, o colocou bem longe da direita dinossáurica. Defendeu a vacina, organizou os hospitais do interior, dotando-os de UTIs e aparelhos adequados para salvar vidas. Ser moderno é ter conexões com a ciência e entender que o Estado é um servo da sociedade, não de interesses de grupos econômicos e seus lobbies.

No governo de Ronaldo Caiado, o Estado está a serviço da sociedade, não das elites, dos grupos econômicos. Em defesa da maioria, aqui e ali, ele choca-se com os poderosos — o que prova que está ao lado de todos os cidadãos.

Poucos políticos de direita são tão preocupados com o social quanto Ronaldo Caiado. O seu governo tem operado em dois fronts. Cuida dos pobres, dando-se a assistência básica — o que os intelectuais chamam de “assistencialismo” —, mas também procura integrá-los. O forte investimento em educação, na área pública, sinaliza que, a rigor, há políticas amplas de inclusão social. Repetindo, sob Ronaldo Caiado, o Estado está servindo à sociedade e é inclusivo.

O trunfo do PT em 2026 será o alto investimento no social, e, ainda que em menor escala, dada a escassez de recursos, Ronaldo Caiado também terá o que exibir ao país.

A disputa em 2026 tente a ser entre a esquerda e a direita que pensam no social e se comportam de maneira civilizada. Lula da Silva e Ronaldo Caiado são doutores em política e se conhecem bem. Eles são do tipo de políticos que dormem acordados, pois estão sempre atentos.

Lula da Silva e Ronaldo Caiado são tão atentos que sabem que, em 2026, terão de operar a conquista dos eleitores de centro. Porque, numa conflagração eleitoral entre esquerda e direita, é preciso conquistar a maioria dos que, possivelmente, não estão nem com a direita nem com a esquerda, mas tendem a fazer escolhas a partir dos indivíduos que estão na lida e são, eleitoralmente, mais fortes e capazes.

Ronaldo Caiado irá precisar do bolsonarismo, portanto de Bolsonaro — que poderá apoiá-lo, inclusive atraindo-o para o PL (o União Brasil, no momento, é a Julieta do quase Romeu-Lula da Silva). Assim como Lula vai operar para ter parte do Republicanos, do pP e de todo o MDB.