Demora de Caiado para decidir em 3 grandes cidades tem a ver com a disputa de 2026
17 março 2024 às 00h01
COMPARTILHAR
A política é, por vezes, uma escola de ansiedade. Quase tudo é para ontem, sobretudo no momento de definição de candidaturas. As pressões são intensas. Entretanto, quando se tem uma base ampla, os líderes têm certa dificuldade de decidir. O que é natural, até porque os estrategistas sabem da importância de uma eleição, mas também sabem que há outras adiante, às vezes tão ou mais relevantes.
Neste momento, assiste-se a pressão para o governador Ronaldo Caiado decidir seu apoio em Goiânia, Aparecida e Anápolis, para citar apenas três cidades, nas disputas pelas prefeituras. É fato que a base governista terá candidatos nas três cidades, que, juntas, concentram parte significativa dos eleitores de Goiás. Portanto, são decisivas.
1
Anápolis
Porém, como se disse, a base governista é ampla. Em Anápolis, o deputado estadual Antônio Gomide, do PT, aparece em primeiro lugar nas pesquisas de intenção de voto. Mas ganhará de um candidato apoiado por Ronaldo Caiado (União Brasil), pelo vice-governador Daniel Vilela (MDB) e pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)? Talvez não. Talvez sim.
A história recente de Anápolis é rica em reviravoltas, em mudanças bruscas. Frise-se que o PT perdeu as duas últimas eleições municipais. Em 2020, o derrotado foi exatamente Antônio Gomide. O prefeito Roberto Naves foi eleito com 61,28% dos votos válidos, no segundo turno. O petista, tal como hoje, apareceu, no início da campanha, como favorito absoluto.
No momento, há dois pré-candidatos governistas em Anápolis: Márcio Corrêa, do MDB, e Márcio Cândido, do PSD (opera para se filiar, em breve, ao PL, com o apoio do senador Wilder Morais). Fala-se também no deputado estadual Amilton Filho, do MDB, como um possível tertius — que contemplaria os dois grupos em discórdia.
O empresário e suplente de deputado federal Márcio Corrêa conta com o apoio de Daniel Vilela e o vice-prefeito Márcio Cândido é apoiado pelo prefeito Roberto Naves, do Republicanos.
O que fazer? Márcio Corrêa e Roberto Naves, embora pertençam à base política de Ronaldo Caiado, não falam a mesma língua. Um fala árabe e o outro, digamos, hebraico.
É possível unir forças tidas como inconciliáveis? A vida sugere que sim, a ira de Márcio Corrêa e Roberto Naves sugere que não? Sendo assim, o que fazer?
O caminho mais racional é observar, além das pesquisas de intenção de voto, a capacidade de aglutinação de cada um dos postulantes. Se o bolsonarismo alinhar-se integralmente com Márcio Corrêa, que já tem o apoio do ex-deputado federal Major Vitor Hugo — o político mais ligado a Jair Bolsonaro em Goiás —, o emedebista fica mais forte.
Porém, do outro lado, o pastor Márcio Cândido, devido à articulação de Roberto Naves, conta com o apoio de vários dos mais importantes grupos evangélicos de Anápolis e, mesmo, do Estado. Dado o maciço apoio do meio evangélico, pode ser o candidato do bolsonarismo.
Por ser um líder, e não apenas governador, Ronaldo Caiado tem de verificar, com o máximo de atenção, a correlação de forças anapolinas. Além disso, certamente está se perguntando: quem estará comigo, de verdade, na disputa de 2026? Quem ameaça abandonar o barco agora, escapando da base governista, se não for candidato, pode ser considerado confiável para alianças futuras? Seu projeto está acima dos maiores projetos partidários?
Vale insistir: Ronaldo Caiado é um estrategista político. Como tal, está procurando conectar 2024 e 2026. Está preocupado em manter ou criar uma base governista de maneira tão ampla, de modo a enfraquecer as oposições, com o objetivo de garantir uma eleição de Daniel Vilela a governador menos complicada.
Os que apoiam Daniel Vilela, como Márcio Corrêa, precisam entender que o vice-governador é, desde já, o candidato de Ronaldo Caiado a governador, em 2026, daqui a dois anos e seis meses. Poucos vices na história de Goiás foram tão prestigiados quanto o jovem líder do MDB.
Ronaldo Caiado está fortalecendo Daniel Vilela, criando uma nova base política para o emedebista, porque pretende que a modernização, política e administrativa, de seu governo tenha continuidade. O emedebista representará, de acordo com seu entendimento, a modernização continuada de Goiás.
O que se quer, a rigor, é que tanto Roberto Naves quanto Márcio Corrêa, quaisquer que sejam as suas definições em 2024, permaneçam na base que caminhará com Daniel Vilela em 2026.
2
Aparecida de Goiânia
O verdadeiro político, quando é líder, opera no campo tático e estratégico. Ele percebe as árvores (Aparecida de Goiânia, Anápolis e Goiânia — as prefeituras) mas sem perder de vista a importância da floresta (Goiás — o governo do Estado).
Não há a menor dúvida de que Aparecida de Goiânia, assim como Rio Verde (onde o governismo operou bem ao escolher Wellington Carrijo, do MDB, para prefeito, com o apoio do prefeito Paulo do Vale, do União Brasil), é importante. Importantíssima. Mas será mais relevante que se ter o governador do Estado, digamos Daniel Vilela? Não é.
A base governista tem seu candidato em Aparecida. Trata-se do prefeito Vilmar Mariano. Se não for ele, poderá ser o ex-deputado federal Leandro Vilela. A oposição bancará o deputado federal Professor Alcides Ribeiro, do PL.
Mas Professor Alcides representa oposição ao governo de Ronaldo Caiado? A rigor, não. Mas vale a pergunta: com quem o parlamentar estará em 2026?
O PL planeja lançar, de fato, Wilder Morais para governador… contra Daniel Vilela. É uma possibilidade e os aliados do presidente do Partido Liberal em Goiás sempre falam sobre isto, como se fosse uma certeza.
Entretanto, a dois anos e meio das eleições, não há nada certo. Wilder Morais é, no fundo, um dos principais aliados de Ronaldo Caiado. Portanto, dependendo das conversações, poderá apoiar Daniel Vilela em 2026 e disputar o governo em 2030, quando o emedebista, se reeleito, não poderá disputar de novo.
Então, talvez seja possível sugerir que a disputa em Aparecida não coloca em jogo a disputa de 2026. Pois os dois adversários, Vilmar Mariano e Professor Alcides, ganhando ou perdendo, poderão se alinhar com Ronaldo Caiado e Daniel Vilela.
Pode-se sugerir que em Anápolis e Aparecida, se a disputa não for fratricida, o governismo pode sair encorpado — mesmo se perder a eleição. Em Anápolis, há a possibilidade de Antônio Gomide ser eleito. Mas o PT ainda não é uma força consistente para o governo do Estado.
Com quem, na disputa para o governo do Estado, em 2026, o PT se aliará? Com o PL de Wilder Morais e Major Vitor Hugo, não será. Poderá se aliar com Vanderlan Cardoso? É possível, Mas juntos, PT e Vanderlan Cardoso (talvez com acréscimo do PSDB do ex-governador Marconi Perillo), têm condições de vencer o candidato da aliança Ronaldo Caiado-Daniel Vilela? Muito difícil.
Já a chapa governista, de centro-direita, poderá ser ampliada, com a possível absorção do PL. Uma chapa com Daniel Vilela para governador, Gustavo Mendanha ou Pedro Sales na vice e Gracinha Caiado e Major Vitor Hugo para senador será, sem dúvida, muito forte.
Tal chapa é possível? Parece que sim. Sublinhe-se que o projeto político de Jair Bolsonaro para Major Vitor Hugo é a disputa para o Senado. E o ex-deputado não tem espaço consistente em outra possível chapa — exceto se Wilder Morais for candidato.
A demora para firmar chapas não é falta de opções, e sim uma (re)engenharia política. Ronaldo Caiado está procurando os caminhos para estabelecer uma base política tão sólida quanto renovada, com o objetivo, estratégico, de enfraquecer as oposições.
Sem o PL na oposição em 2026, quais candidatos as oposições poderão lançar? Marconi Perillo ou Vanderlan Cardoso, quem sabe. Mas, se eleito prefeito em Goiânia, Vanderlan marchará realmente para a oposição? Talvez. E se perder? Não é improvável que, qualquer que seja o resultado, o senador se aproxime do governismo. Claro, trata-se apenas de uma hipótese.
O deputado federal Gustavo Gayer, do PL, que não esteve na base de Ronaldo Caiado em 2022, poderá migrar para sua base em 2026. Os dois mantêm boa interlocução. Há quem menospreze o parlamentar. Mas não devia. Porque ele é, do ponto de vista público, visto como o principal representante do bolsonarismo — mais do que de Jair Bolsonaro — em Goiás. Ele fala a “linguagem” do bolsonarismo. Wilder Morais não é bolsonarista — está bolsonarista. Já Major Vitor Hugo e Gustavo Gayer são bolsonaristas convictos.
3
Goiânia
Goiânia, com mais de 1 milhão de eleitores, é uma cidade-Estado crucial. Diz-se que governadores não elegem prefeitos na capital. Mas poucos ressalvam que Marconi Perillo foi eleito governador quatro vezes sem contar com o prefeito da cidade (exceto em 1998, quando obteve o apoio do prefeito Nion Albernaz). Os eleitores são livres e, portanto, votam em quem quiser. Os prefeitos não determinam seus votos.
Nenhum governador, na história de Goiânia, foi tão popular em Goiânia quanto é Ronaldo Caiado.
Pesquisas dizem que a popularidade de Ronaldo Caiado tem a ver com sua eficiente política de segurança pública. De fato, tem. Basta conversar com 50 motoristas de Uber para notar a aprovação do governador entre aqueles que, às vezes trabalhando à noite, precisam do apoio da Polícia Militar. Os motoristas dizem que a polícia está mais presente e combate o crime de maneira dura e ostensiva.
Mas há outro fator, que às vezes as pesquisas não registram, assim como a imprensa, mas as pessoas comentam, e com frequência. A decência pessoal de Ronaldo Caiado é muito bem-vista pela população. Um governador que, além de não roubar, não permite que outros roubem, fiscalizando tudo com rigor, tem a aprovação da sociedade.
Há quem acredite que Ronaldo Caiado está submetendo as eleições municipais ao seu projeto presidencial. Não é totalmente assim. De fato, uma possível aliança com o PL em Goiás pode fortalecer o seu projeto presidencial. Há alguma possibilidade de ele obter o apoio do bolsonarismo no plano nacional na disputa para presidente da República, em 2026. Do ponto de vista ideológico, político e administrativo, é o nome mais consistente da direita e da centro-direita no país. Ele não é “palatável” apenas para a direita.
Mas é bem possível que o gestor goiano esteja operando muito mais para garantir a eleição de Daniel Vilela para governador, em 2026. Porque ele sabe, assim como sabia Antônio Carlos Magalhães, que só é forte na corte quem é forte na província.