Resta saber qual é o papel de Bolsonaro e ministros do STF na operação pra desmontar operação que pôs corruptos na prisão e obrigou-os a devolver dinheiro ao Erário

Sérgio Cabral, ex-governador do Rio de Janeiro; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados; Marcelo Odebrecht, ex-príncipe dos empreiteiros brasileiros; e o ex-presidente da República Lula da Silva: poderosos finalmente foram presos no país | Fotos: Pedro Dias (Cabral); Reprodução; Ricardo Stuckart Filho (Lula)

A Revolução de 1930 é vista como um divisor de água na história do Brasil. Até esse ano, havia um pacto entre São Paulo e Minas Gerais, traduzida na política do Café (São Paulo) e Leite (Minas Gerais). Os dois Estados, sempre que possível, revezavam-se no controle da Presidência da República. O presidente Washington Luís, representante de São Paulo, deveria apoiar Antônio Carlos de Andrada, de Minas Gerais, mas optou por bancar Júlio Prestes.

Minas Gerais rebelou-se e decidiu apoiar a candidatura de Getúlio Vargas, do Rio Grande do Sul. Júlio Prestes foi eleito, mas não assumiu. A Revolução de 30 derrubou o presidente Washington Luís e impôs Getúlio Vargas no comando do país.

Nos Estados (não em Minas), os governadores foram trocados por aliados de Getúlio Vargas e dos mineiros. Em 1932, com a Revolução Constitucionalista, São Paulo rebelou-se, mas acabou contido pelo governo federal. Mas a troca de oligarquias nos Estados representou mesmo uma mudança significativa? Politicamente, houve uma reviravolta acentuada, com acomodações paulatinas. Mas as elites econômicas permaneceram as mesmas — com o apoio do governo federal. O presidente, ainda que considerado hostil a São Paulo, praticamente salvou a maioria dos cafeicultores da debacle. A indústria de São Paulo recebeu forte incentivo para crescer. A rigor, aos poucos, as elites foram “ajeitando” seus negócios. Trata-se da conciliação pelo alto.

Em 1945, Getúlio Vargas caiu da Presidência — derrubado por aqueles que o haviam mantido no poder por 15 anos, na semidemocracia (1930-1937) e na cruenta ditadura do Estado Novo (1937-1945). O general Eurico Gaspar Dutra, que antes era simpatizante do nazismo de Hitler e depois se tornou democrata com a vitória dos Aliados na Europa, foi eleito presidente, capitalizando a queda do ditador e derrotando outro militar, o brigadeiro Eduardo Gomes. Mas, para ser eleito, contou com o apoio de Getúlio Vargas, este, por sinal, eleito senador.

Pode-se dizer que Dutra “guardou” a vaga para Getúlio Vargas, que se elegeu presidente, em 1950. Apesar de pressionado pela direita política — incrustada na União Democrática Nacional (UDN) — e pela direita militar, de matiz autoritário, o presidente, agora democrata, não governou contra os interesses das elites patropis. Os cofres dos bancos públicos permaneceram abertos — até abertíssimos — aos grandes industriais, comerciantes e produtores rurais. Durante a Segunda Guerra Mundial, entre 1939 e 1945, o governo de Getúlio Vargas operou uma política de substituição de importações que fortaleceu amplamente o mercado interno — quer dizer, o empresariado nacional. As divergências políticas — a luta pelo poder — não conseguem esconder que, de alguma maneira, havia uma conciliação pelo alto.

Sergio Moro, Marcelo Bretas e Deltan Dallagnol: o primeiro (ex-juiz) e o terceiro (procurador da República) são criticados pelos “legalistas”, mas têm o apoio das ruas; o segundo é um juiz firme contra os corruptos | Fotos: Reproduções

O suicídio de Getúlio Vargas representou um tiro no coração do movimento golpista liderado por, entre outros, Carlos Lacerda. Além de ter retardado o golpe que os tenentes de 1930, com o apoio de vivandeiras, como Carlos Lacerda e Magalhães Pinto, preparavam para 1954 e só conseguiram levar adiante em 1964, ao derrubarem João Goulart, possibilitou que o centro político, aliado à esquerda, conquistasse a Presidência.

Em seguida, Juscelino Kubitschek, eleito presidente, operou com habilidade a conciliação pelo alto, com elites de vários setores — inclusive com a participação de udenistas no governo, ainda que o udenista-mor Carlos Lacerda pregasse a sua derrubada de manhã, à tarde e à noite. JK contribuiu para modernizar a indústria do país, e não só a automobilística, e construiu Brasília, como símbolo de sua política de descentralização tanto da economia quanto do poder.

Por que, se militares e civis queriam defenestrá-lo, Juscelino Kubitschek não caiu e escapou de ser o Getúlio Vargas de Minas Gerais? Primeiro, porque, politicamente, era hábil, articulando com líderes de vários partidos políticos — inclusive o radical Leonel Brizola, cunhado de seu vice-presidente, João Goulart, e udenistas. Segundo, porque, conciliando pelo alto, não contrariou, de maneira significativa, os homens do capital. Serviu-os. Admitir isto significa que foi um presidente ruim? De maneira alguma, foi um presidente modernizador e, apesar da inflação, a economia cresceu de maneira espetacular. Dado o espírito democrático, e a abertura à novidade — a arquitetura de Brasília, por exemplo, persiste moderna e atraente para o mundo —, inclusive as artes, como a Bossa Nova, floresceram.

Curiosamente, em 1961, a UDN finalmente elegeu um aliado, Jânio da Silva Quadros, que, aliás, não tinha o perfil do udenismo, exceto pelo moralismo produzido pelo marketing pessoal. O general Henrique Lott, do PSD e apoiado por Juscelino Kubitschek, tinha mais a cara da UDN (“o preço da liberdade é a eterna vigilância”). A questão é que, ao contrário de JK, Jânio Quadros, político personalista, decidiu confrontar parte das elites, sobretudo as políticas. Talvez por isso, quando renunciou, por meio de um autogolpe — pois pensava voltar nos braços dos militares e do povão —, o presidente não obteve apoio relevante para a retomada do poder. Militares de direita, apesar de não apreciarem João Goulart e de terem tentado evitar a sua posse, não conseguiram coesão pela volta de Jânio Quadros ou condições objetivas para um golpe da caserna. Conciliando pelo alto, as elites viram no Parlamentarismo uma solução para, mantendo o petebista João Goulart na Presidência, engessá-lo. Se o Parlamentarismo tivesse sido mantido, com um articulador político hábil como Tancredo Neves, o golpe de março-abril de 1964 talvez não tivesse acontecido. Porque nem os mais radicais, civis e militares, acreditavam que o político mineiro representasse alguma ruptura na ordem capitalista.

Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal, e Gilmar Mendes: dois ministros que defendem a legalidade, o Estado Democrático de Direito | Foto: Reprodução

Jango Goulart caiu, em 1964, e os militares ficaram no poder por 21 anos, até 1985. Parte da esquerda, a comunista, prefere tratar a ditadura apenas como militar para reforçar que se tratava de um regime de exceção e cruento. Tachá-la de civil-militar, nesta interpretação, seria uma maneira de suavizar a ditadura. Pois pesquisadores competentes, com doutorado, como Daniel Aarão Reis Filho, prefere chamá-la de ditadura civil-militar. Porque, da constituição do golpe aos governos ditatoriais, os civis foram decisivos. Os civis Carlos Lacerda e Magalhães Pinto, para citar apenas dois, operaram pelo golpe, de maneira intensa, articulando e pressionando militares, como os generais Castello Branco, Odilio Denys, Luiz Carlo Guedes e Amaury Kruel, para que derrubassem Joao Goulart. De Minas Gerais, terra de Magalhães Pinto, saiu o movimento do general Olímpio Mourão Filho, conhecido como Vaca Fardada, que antecipou e deflagrou o golpe.

Na ditadura, a decisão estava nas mãos de generais, como Castello Branco, Costa e Silva, Emilio Médici, Ernesto Geisel e João Baptista Figueiredo — os cinco presidentes militares. Mas há várias influências para se tomar uma decisão. Civis como Roberto Campos, Octávio Gouveia de Bulhões, Delfim Netto e Mário Henrique Simonsen, entre outros, contribuíram, de maneira decisiva, para a formulação tanto do planejamento quanto da política fazendária dos governos ditatoriais. Políticos da Arena, como Petrônio Portella — uma figura respeitável —, deram ampla cobertura ao governo, eventualmente contribuindo para moderar a ditadura. Os governos militares significaram uma profunda ruptura com o tempo anterior? A rigor, não. Embora os militares chamem o golpe de 64 de “Revolução”, com R maiúsculo, o fato é que as elites anteriores, com exceções, continuaram no poder. Grupos políticos às vezes foram trocados, mas sem mudanças significativas. As elites patropis aprenderam, camaleônicas que são, a se “apropriar” de quaisquer governos — sejam democráticos ou não.

Em 1985, com a eleição de Tancredo Neves para presidente, até a Imprensa pareceu acreditar numa grande mudança — deixando de notar, quem sabe, que seu vice era José Sarney, o político que havia se tornado comensal da ditadura civil-militar por 21 anos. Agora, na transição do regime militar, a ditadura, para o regime civil, a democracia, a conciliação pelo alto funcionou mais uma vez. Sarney, amparado pelo general Leonidas Pires Gonçalves, acabou se tornando presidente, com a morte do político mineiro. Há até quem considere seu governo como a última das gestões militares — e não só pela tutela de Pires Gonçalves. Na verdade, o poder estava nas mãos de um político que havia servido, de maneira competente e leal, a todos os governos militares.

Jair Bolsonaro, presidente da República, e Sergio Moro, ministro da Justiça: o primeiro foi eleito por combater a corrupção | Fotos: Tânia Rego e Marcelo Camargo / Agência Brasil)

Tomasi di Lampedusa é autor de um romance magistral, “O Leopardo” (ou, numa tradução, “O Gattopardo”). Tancredi, sobrinho de Don Fabrizio, assinala, notando com argúcia a transição do poder da elegante mas decadente aristocracia para a estulta mais rica burguesia: “Se não nos envolvermos nisso, os outros implantam a República [trata-se da unificação italiana, que acabou se dando sob domínio da monarquia]. Se quisermos que tudo continue como está, é preciso que tudo mude. Fui claro?” Pois José Sarney foi claríssimo ao, com habilidade, contribuir para o controle da “mudança” — que se tornou, por isto, menos mudança. Tancredo Neves não levaria o país a uma mudança radical, pois era um político moderado, mas talvez a mudança fosse menos moderada do que foi com Sarney — um político de “todos os tempos”, por assim dizer.

Lava Jato e a reduão da impunidade

Judiciário, um poder da República, Ministério Público e Polícia Federal, atuando em conjunto ou separadamente, produziram a Operação Lava Jato.

Trata-se de uma grande operação cujo objetivo é investigar, denunciar e condenar corruptos — aqueles que, atuando nas entranhas do Estado e na iniciativa privada, colaboraram para assaltar o Erário. Desde sua constituição, em 2015, a Lava Jato (e operações correlatas) levou à prisão figuras coroadas da República, como o ex-presidente Lula da Silva, o ex-presidente Michel Temer (liberado), os ex-ministros José Dirceu de Oliveira e Antonio Palocci, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, o ex-deputados Eduardo Cunha (ex-presidente da Câmara dos Deputados), e Geddel Vieira (MDB), o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, Andréia Neves (irmã do deputado Aécio Neves, liberada), os empresários Marcelo Odebrecht (conhecido como príncipe das empreiteiras, e antes intocável), Eike Batista e Joesley Batista (liberado). Parte da República, a política e a empresarial (empreiteiros e doleiros, sobretudo), está ou esteve na cadeia. Igualmente importante é que os corruptos devolveram parte significativa do dinheiro que roubaram aos cofres públicos.

A lição mais importante a reter da Lava Jato é que “destruiu” o mito da impunidade dos poderosos — a conciliação pelo alto. No início, pensava-se que, a partir de determinado momento, a operação acabaria em pizza, derivada da conciliação pelo alto entre as elites, que, em tese, estariam no controle de todos os poderes da República. Mas algo deu errado e membros destas elites acabaram denunciados, julgados e, em alguns casos, presos em penitenciárias (o ex-presidente Lula está preso na Polícia Federal há mais de um ano). O pacto entre as elites, desta vez, falhou. Porque as instituições — Polícia Federal (sim, deve ser vista como instituição), Ministério Público Federal e Judiciário — escaparam ao controle de indivíduos poderosos e contribuíram para a construção de uma legalidade que não se via no Brasil. Detalhe crucial: não houve caos, ameaça de ruptura, devido à prisão de potentados do capital e de políticos destacados.

Recentemente, quando o site The Intercept publicou mensagens trocadas entre Sergio Fernando Moro, quando era magistrado em Curitiba, e o procurador Deltan Dellagnol — sugerindo que Judiciário e Ministério Público agiram de maneira casada, com o primeiro subordinando e orientando o segundo —, houve um escândalo público, com ampla repercussão na Imprensa e entre advogados. Nas ruas, pouco ou nada ouvidas pelo jornalismo — que refletem mais a opinião de segmentos organizados (talvez por isso tenha demorado a perceber a força eleitoral de Jair Bolsonaro, em 2018) —, o sentimento popular era e é outro bem diferente.

As ruas dizem, numa linguagem crua e franca, que Sergio Moro e Deltan Dallagnol, como agiram para colocar corruptos na cadeia — aqueles “dignos” representantes dos que “mandam” no país há 500 anos —, não merecem nenhum desapreço. As ruas postulam que não há nas conversas entre o ex-magistrado e o procurador de justiça nenhum acordo para roubar o Erário e prejudicar o país e o povo. As ruas formulam que é muito difícil, quase impossível, fisgar gente muito poderosa, que é useira e vezeira na arte de furtar o Erário. Para capturá-la, ou ao menos denunciá-la, é preciso forçar a barra. As ruas pensam assim, por isso Sergio Moro permanece aprovado — o que parece incomodar inclusive o presidente Jair Bolsonaro, que teria ciúme do sucesso popular de seu auxiliar. Bolsonaro parece não entender que, se enfraquecer Sergio Moro, acabará por enfraquecer seu próprio governo e num aspecto caro às ruas: o ético.

Sergio Moro e Deltan Dallagnol cometeram excessos, não há dúvida. Chegaram a ferir a lei, apesar de sustentarem que as conversas, republicanas, têm amparo na legislação. Não estão dizendo assim, mas as ruas entendem que, para combater máfias gigantes e altamente estruturadas, entranhadas no Estado — assaltam-no há anos —, não se pode fiar na estrita letra da lei. Juristas podem e até devem clamar por um mundo “perfeito”, os rigores da lei, mas as ruas entendem diferente: os corruptos só foram “pegos” porque policiais federais e procuradores agiram de maneira organizada — e com o apoio de magistrados intimoratos, como Sergio Moro e, entre outros, Marcelo Bretas. Há uma rede altamente eficiente, articulada para roubar os cofres dos governos (federal e estaduais) e, para entendê-la e capturá-lo, era, no entendimento das ruas, necessária uma “remontagem” tanto da Polícia Federal e Ministério Público Federal quanto da Justiça Federal. Noutras palavras, ainda que não doutas e republicanas, exigiu-se um pouco de ilegalidade — mas sem venalidade — para combater uma ilegalidade profissional e refinada.

Com Sergio Moro fora da Lava Jato, tendo deixado o Judiciário para ser ministro da Justiça de Bolsonaro — o que pode ter sido o grande equívoco de sua vida, porque a lógica da política é “canibalizante” —, está em marcha uma orquestração, da turma da conciliação pelo alto, para destruir a operação? Suspeita-se que tanto na direita quanto na esquerda, passando pelo centro, há grupos que gostariam de ver a Lava Jato desmoralizada. Há grupos que aparentemente torcem para que o país retorne ao tempo de 2015, quando a Lava Jato destampou a panela da corrupção.

Há uma grita nas ruas de que há venalidade no Supremo Tribunal Federal. Não há provas conclusivas disso — o que há são campanhas, organizadas, mas não documentos comprobatórios. Por incrível que pareça, há gente séria — até advogados competentes e ilustres — que diz, sem apresentar provas e a mais comezinha evidência, que há ministros venais no STF. O que há, até agora, são fofocas, que, de tão vulgarizadas, parecem fatos, se tornam fatos — embora, rigorosamente, não sejam fatos. O ministro Gilmar Mendes é o mais “atacado”. O presidente do STF, Dias Toffoli, começa a ser agredido. Um dos motivos é que, na visão das pessoas, seriam contrários à Lava Jato. São? Tudo indica que não. O que querem é mais legalidade e direito de defesa ampla para os acusados. São defensores do Estado Democrático de Direito.

Parte dos ministros do Supremo estaria conluiada com os adeptos da conciliação pelo alto — os donos do poder, diria Raymundo Faoro — e jogando contra a Lava Jato? Talvez não. Há concepções diferentes sobre o Direito, sobre decisões judiciais. Se até a Matemática pode variar, em determinada circunstância, imagine o Direito — que não é preciso e demanda interpretações, daí, por exemplo, a jurisprudência. A lei é uma, mas sua interpretação varia de magistrado para magistrado, ainda que seja salutar que se busque uma certa unidade no julgamento, fiando na ideia central da legislação — a sua média, digamos.

Na semana passada, a Segunda Turma do STF decidiu anular a condenação do ex-presidente da Petrobrás e do Banco do Brasil Aldemir Bendime. Alega-se que, quando juiz, Sergio Moro “abriu um único prazo para todos os réus apresentarem alegações finais”. Os ministros avaliam que “o correto é primeiro a manifestação de réus delatores e, depois, dos delatados”.

O ex-presidente do STF Carlos Velloso discorda da Segunda Turma. O ex-ministro sublinha que “a Lei de Organizações Criminosas que regulamenta a delação premiada não exige períodos distintos para as alegações finais de delatores e delatados” (trecho de reportagem de “O Globo”). Suas palavras: “Nem o Código Penal, nem a lei da colaboração premiada fazem esta distinção que o Supremo adotou. Penso que não é possível o tribunal, invocando o direito de defesa, ampliar norma processual”. O ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp segue por caminho parecido: “A decisão deve servir de precedente e vai ser sim utilizada pelas defesas nos processos que guardarem semelhança fática e jurídica. Mas isso vai ser analisado caso a caso”. Os dois foram entrevistados pelo jornal “O Globo”.

Estariam abrindo uma porta para libertar Lula da Silva? É possível. Mas Francisco Ortigão, professor de processo penal da UFRJ, concorda com os magistrados da Segunda Turma: “O que os ministros fazem é aplicar o princípio do contraditório, que é assegurado a todos os acusados em geral. Tem que se oportunizar ao réu delatado fazer a desconstrução da imputação feita”.

Parte do Supremo estaria cedendo aos donos do poder, à conciliação pelo alto — ignorando os clamores da sociedade contra a impunidade —, e, portanto, contribuindo para derrubar a Lava Jato? Talvez sim. Talvez não. O mais provável é que os ministros do STF queiram menos açodamento — e controle do veio justiceiro de promotores e magistrados jovens — e estejam propondo mais cuidado nas denúncias e julgamentos. Mas, sim, há setores da sociedade, tanto na política quanto no meio empresarial, que planejam soterrar a Lava Lato. Advogados gabaritados, dos melhores escritores do país, estão sob pressão de seus clientes — os donos do poder — para que, de alguma maneira, restabelecem a conciliação pelo alto. Os de baixo, representados por policiais federais, promotores e magistrados, têm de saber o seu “lugar” na sociedade. Basta de “penalizar” os homens do capital. Parece discurso de marxista, mas não é, pois até marxistas, como alguns do PT (que não é marxista, falando nisso) e do PC do B, são contrários à Lava Jato — que estaria “pegando todo mundo”….