O legado de Tagore e o Nobel de Literatura
12 novembro 2024 às 12h11
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*Abilio Wolney Aires Neto
Goiânia tem uma herma na Praça adjacente à Tamandaré, onde o busto de Tagore amanhece e adormece sob a galhadas de um horto desapercebido pelos viandantes.
Rabindranath Tagore, laureado com o Prêmio Nobel de Literatura em 1913, foi uma figura extraordinária que transcendeu as fronteiras culturais e literárias, desbancando os autores europeus de sua época. Ele foi o primeiro escritor não-europeu a receber o prêmio, o que não só destacou seu talento, mas também trouxe à tona a rica herança literária da Índia, até então obscurecida pela hegemonia cultural ocidental. Tagore, que escreveu tanto em bengali quanto em inglês, foi um poeta, filósofo, músico e educador cujas obras carregam profundas reflexões sobre a vida, a natureza e a espiritualidade.
Nascido em 7 de maio de 1861, em Calcutá, no seio de uma família influente, Tagore teve uma educação privilegiada. Ele foi um dos maiores expoentes do movimento de renovação cultural do século XIX na Índia, integrando sua sensibilidade oriental com o pensamento ocidental. Além de suas poesias, escreveu romances, contos, peças de teatro e ensaios, abordando temas como a liberdade, a justiça, a espiritualidade e a busca pela harmonia entre o homem e a natureza.
A obra pela qual Tagore foi mais amplamente reconhecido no Ocidente foi Gitanjali (Oferendas Poéticas), uma coleção de poemas profundamente espirituais que expressam sua visão de um Deus onipresente, com quem o poeta busca comunhão em meio à beleza da vida cotidiana. Seus versos falam de uma verdade universal e de uma unidade essencial que transcende religiões, raças e nações.
Tagore, com sua sensibilidade mística e sua capacidade de expressar o sublime, encantou tanto o Oriente quanto o Ocidente. Sua poesia explora a essência da alma humana, suas angústias e suas esperanças, permeando o leitor com uma sensação de beleza e serenidade.
Ao ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, Tagore tornou- -se um emblema da capacidade da literatura de unir culturas e de transmitir valores que transcendem as divisões geopolíticas e raciais. Ele ofereceu ao mundo uma nova forma de pensar a literatura — não como um domínio exclusivo do Ocidente, mas como uma expressão global da alma humana.
Uma de suas obras mais tocantes é o poema “Da Despedida”, no qual ele reflete sobre a vida, a morte e a inevitabilidade do adeus. Nesse poema, Tagore traz à tona sua visão espiritual, que aceita a morte como parte da grande jornada da alma: “No dia em que a morte vier bater à tua porta/ que presente lhe entregarás? Entregarei a minha vida inteira…/Colhi todos os meus dias para torná-los flores/ e os ofereci; e o meu coração transformei em uma harpa/ e todas as cordas que nela eu estendi/quando o tempo me chamar, romperei com as mãos/ e ficarei em silêncio.”
Nesse fragmento, Tagore revela sua aceitação pacífica da morte, não como um fim, mas como uma continuidade do ciclo da vida. A morte, para ele, é uma porta para a eternidade, e o presente que ele oferece ao universo é sua própria vida, vivida plenamente e com propósito.
Outros versos de Tagore também destacam sua percepção sensível da vida e da conexão entre o ser humano e o cosmos. Em um de seus belos poemas, ele escreve: “Agradeço-te a vida/ pela dádiva da luz que me mostraste./ Agradeço o esplendor do amanhecer/ que me envolve e enche a minha alma de esperança/ e pelo crepúsculo que fala de descanso e paz.”
Aqui, Tagore expressa sua gratidão pela beleza da vida e pela oportunidade de testemunhar os ciclos naturais do mundo, o amanhecer e o crepúsculo, símbolos do renascimento e do repouso. A simplicidade com que ele descreve a vida cotidiana, imbuída de significados profundos, é um dos elementos mais marcantes de sua poesia.
Em outro verso, ele escreve: “Caminhei pela estrada em busca de paz/ e a encontrei dentro de mim/ onde floresciam os campos da alegria/ banhados pela luz de tua presença.”
Esses versos capturam o espírito de Tagore, que via na espiritualidade e na busca interna as chaves para uma existência plena e harmoniosa. A paz que ele menciona é aquela que se encontra no centro do ser, uma paz que transcende as perturbações externas.
Tagore foi muito mais do que um poeta; ele foi um pensador que ajudou a redefinir a forma como a literatura pode expressar as dimensões mais sutis da experiência humana. Ele lutou pela liberdade da Índia colonial e defendeu uma educação que promovesse a autodescoberta e o florescimento humano.
Sua obra continua a ser uma fonte de inspiração, com sua mensagem de unidade, paz e beleza ressoando em um mundo muitas vezes dividido. Ao desbancar os autores europeus no Prêmio Nobel de 1913, Tagore demonstrou que a literatura, em sua essência, pertence à humanidade como um todo, e não a uma única cultura ou tradição.
Através de seus versos, Tagore nos lembra da fragilidade e da beleza da vida, e de como, em meio às adversidades, podemos sempre encontrar esperança e luz. “E quando chegar o fim/ e as portas da eternidade se abrirem/ que eu possa partir em paz/ como um sopro suave ao vento da tarde.
*Abílio Wolney
- Juiz de Direito da 9ª Vara Civel de Goiania.
- Cadeira 9 da Academia Goiana de Letras, Cadeira 2 da Academia Dianopolina de Letras, Cadeira 23 do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás-IHGG, Membro da União Brasileira de Escritores-GO dentre outras.
- Graduando em Jornalismo.
- Acadêmico de Filosofia e de História.
- 15 títulos publicados
- Colunista do Jornal Opção.
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