Ronaldo Caiado compreendeu formato da CPI do MST

04 junho 2023 às 17h59

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O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (UB), ao ser convidado para participar da CPI do MST na Câmara dos Deputados, só pode ter encarado o momento como uma oportunidade para defender a pauta com que entrou na vida pública nacional. Caiado defendeu a importância do agronegócio e do Centro-Oeste para a expansão do PIB Brasileiro muito antes da onda “agro pop” — em 1989, por exemplo, quando disputou a eleição presidencial pelo PSD contra Lula, Maluf, Leonel Brizola e Ulysses Guimarães.
Na ocasião, entretanto, Caiado obteve 0,68% dos votos; em parte porque, nos debates, o varguista Leonel Brizola conseguiu colar no jovem político a pecha de autoritário, fazendo referência à figura do coronel, associado às famílias tradicionais da política interiorana. Agora, a estratégia de opositores é a mesma, mas o cenário é muito diferente. O governador de Goiás não esconde que pretende disputar a presidência da República novamente e, na quarta-feira, 31, quando foi chamado para participar da CPI do MST no Congresso, viu opositores baterem na tecla do autoritarismo para minar sua plataforma política baseada no agro.
Contra intuitivamente, como publicado pelo Jornal Opção, é possível que os ataques tenham dado início à campanha presidencial de Ronaldo Caiado. Neste momento de orfandade da direita, com o espólio de Bolsonaro (PL) sendo disputado por Tarcísio Freitas (Republicanos), Romeu Zema (Novo) e outros, a janela de oportunidade para ocupar o vazio se fecha rapidamente. Caiado ganhou a oportunidade de expor suas ideias estampadas nas manchetes de “Estadão”, “Globo” e “Folha de S. Paulo”.
A defesa da esquerda foi semelhante àquela que funcionou em 1989, entretanto, quase 35 anos se passaram e é improvável que a estratégia dê resultados novamente. Primeiro, porque a comunicação é profundamente distinta. A deputada Sâmia Bonfim (PSOL-SP) talvez tenha sido a parlamentar mais vocal em suas críticas ao governador, e aquela cujas falas tenham tido mais compartilhamentos vídeos excertos nas redes sociais.
Porém, os trechos de vídeos com o “lacres” ou a “mitadas”, como se diz hoje em dia (ou seja, frases de efeito com argumentos contundentes contra o adversário), só circulam na própria base de cada político. Sâmia Bonfim teve bons momentos, ao lembrar do histórico de injustiças contra camponeses e ambientalistas em Goiás, e Caiado teve maus momentos, ao igualar o MST com tráfico de drogas. Mas as vitórias da esquerda só circulam na esquerda.
Da mesma forma, o momento em que a CPI teve de ser encerrada por conta de um bate boca com o deputado Paulão (PT-AL) é uma clara vitória para Ronaldo Caiado, que demonstrou firmeza e não se acuou frente a ofensas pessoais. Caiado também foi assertivo ao expor dados que refletem aumento na segurança pública na zona rural de Goiás e o fato de que muitos assentamentos do MST subsistem de apoio do governo estadual. Da mesma forma, as vitórias da direita circulam apenas na direita.
Isso se deve, é claro, ao viés de confirmação. É natural (embora indesejável) que procuremos apenas informações que reafirmam nossos pontos de vista prévios. Mudar de opinião requer admitir um erro, o que é doloroso. Cantar que sempre esteve certo é prazeroso. Por isso, selecionamos os trechos que preferimos ouvir e descartamos evidências de nossos equívocos. Esse fenômeno pode ser superado com treino e humildade, mas é inerentemente humano e foi beneficiado pela comunicação fragmentada, que nos permite conversar com nossas respectivas bolhas sem ser expostos ao contraditório.
Atualmente, as Comissões Parlamentares de Inquérito representam um efêmero palanque onde se sobe apenas para gravar stories e se pode deixar a cena antes de ouvir respostas. Se, no final das contas, o saldo político de uma CPI for reduzido a quem tem a maior bolha, não há disputa: a direita já ganhou. Primeiro, porque a maior parte da população é conservadora, desaprova invasões de terras, e 24,5% do PIB do país vem do agro. Depois, porque a comunicação digital da direita está muito mais avançada do que a da esquerda.
É importante que, em alguma etapa deste processo, a razão e o diálogo entrem em jogo. O que a esquerda não compreendeu é que há um problema: Invasões de terras cresceram com Lula e tiveram baixa com Bolsonaro. A esquerda não conseguirá convencer ninguém além de si mesma com a ideia ingênua de que as invasões de terras são uma solução ambiental, trabalhista ou social. Tampouco convencerá que o agro é o vilão, pois um em cada quatro brasileiros subsiste dessa atividade.
Da mesma forma, o que a direita não conseguiu ouvir por cima da gritaria na CPI é que o MST não é composto por “sicários armados que usam dinheiro público para ensinar comunismo”. Qualquer um que visite um assentamento pode verificar esse fato, como o Jornal Opção fez em setembro de 2022, quando reportou o trabalho do Assentamento de Canudos, próximo a Palmeiras de Goiás, onde 314 famílias cultivam em 12.757 hectares de terra anteriormente improdutivas.