Economia melhora, mas a crise política complica
25 fevereiro 2017 às 11h21
COMPARTILHAR
Na semana em que Temer pôde comemorar queda de juro e melhora nas contas públicas, ele perde auxiliares importantes
Ninguém que tenha senso minimamente apurado da realidade política brasileira esperaria que o governo transitório de Michel Temer fosse uma maravilha, ou, pelo menos, tranquilo. As turbulências estavam previstas, naturais num governo que assume após um impeachment, processo que não deixa de ser traumático, mesmo que tenha se dado dentro da lei e da Constituição.
Temer assumiu um governo em crise econômica e política. E de início, já se sabia que ele teria de dar respostas no sentido de iniciar o conserto da tragédia econômica causada pela incompetência de Dilma Rousseff. Demorou um pouco, mas essas respostas começaram a aparecer, graças principalmente à boa relação do governo com o Congresso.
Aprovação do pacote contra os gastos públicos e da reforma de Ensino Médio, e o encaminhamento da reforma da Previdência, entre outras medidas, desanuviam o ambiente econômico. Na semana passada, por exemplo, foram anunciados queda dos juros e de melhora nas contas públicas.
Mas as dificuldades por que passa Temer estão se agravando. Se a crise econômica está sendo superada aos poucos, a crise política vai aumentando. E isso é causado em consequência das investigações em curso pela Polícia Federal e Ministério Público Federal, que pegam auxiliares do presidente – e até o próprio é citado em irregularidades.
Aqui, é necessário que se faça uma observação: até o momento, nenhum, repita-se, nenhum, episódio de corrupção foi relatado dentro do governo Temer, ou seja, no período em que o peemedebista sentou-se na cadeira de presidente da República. Em termos éticos, o mais lamentável certamente foi o episódio Geddel, o ex-ministro que fez lobby em interesse pessoal. E foi devidamente defenestrado.
Então, há uma diferença crucial entre os governos petistas de Lula da Silva e Dilma Rousseff — com ministros e até o próprio ex-metalúrgico e sua família se enriquecendo vergonhosamente graças tráfico de influência — e o governo Temer: o primeiro, o mais corrupto da história brasileira; o segundo, sem nenhum caso de corrupção. Isso são fatos, não cabe discussão ideológica.
Mas, em que pese essa realidade, fato é que auxiliares de Temer vão caindo um após outro por causa de fatos passados, anteriores ao governo do peemedebista. E isso vai minando a governabilidade tão necessária para levar com mais calma estes 22 meses que faltam para acabar esse período de transição – em 2019 entra o presidente que será eleito no ano que vem.
A semana que passou foi representativa dessa montanha russa que tem sido o governo Temer. Ele apostava que terminaria a semana melhor do que começou. Anúncio de queda dos juros e de melhora nas contas públicas criou a expectativa de reverter o desgaste de imagem causado pela concessão de foro privilegiado a Moreira Franco, que se tornou ministro, citado na delação da Odebrecht.
Reconhecidamente uma raposa política, habilidoso negociador, Temer acreditava que iria para o recesso de carnaval surfando nos índices econômicos que indicam o início claro de melhoria da crise. Mas o que se viu é que a crise política aumentou.
Reportagem da “Folha”, na sexta-feira, 24, lembrou que em dois dias, Temer perdeu um aliado estratégico na equipe ministerial, criou um racha na bancada peemedebista da Câmara e teve seu ministro da Casa Civil envolvido em um episódio nebuloso revelado por um ex-assessor do próprio presidente.
“E tudo isso em meio à expectativa de abertura dos sigilos da delação de 77 executivos da Odebrecht nas próximas semanas. Os depoimentos estão em poder da Procuradoria-Geral da República, que deve pedir abertura de inquéritos contra os citados, incluindo Padilha.”
Na quarta-feira, o tucano José Serra pediu demissão do Ministério de Relações Exteriores, alegando problemas de saúde. Temer teria sido pego no contrapé, porque Serra tem sido um dos principais fiadores da aliança entre PMDB e PSDB no governo.
Temer imediatamente procurou a cúpula tucana para negociar o nome do substituto de José Serra — segundo a “Folha”, o favorito, por enquanto, é o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), atual líder do governo no Senado.
Mas o tormento de Temer não pararia por aí. Na quinta-feira, parte da bancada do PMDB da Câmara se rebela com a escolha do deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) para ministro da Justiça. O vice-presidente da Câmara, Fábio Ramalho (PMDB-MG), anunciou rompimento com o governo e avisou que sua vontade agora é impor seguidas derrotas ao Palácio do Planalto. Sim, o leitor certamente se lembrou de Eduardo Cunha com Dilma Rousseff.
Mas as dores de cabeça de Temer não terminariam. A imprensa divulgou que o advogado José Yunes, ex-assessor da Presidência, afirmou que serviu de “mula” do ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, em 2014, em São Paulo.
O caso deve ser apurado pela Procuradoria-Geral da República e, segundo auxiliares e assessores presidenciais, torna a situação do chefe da Casa Civil “delicadíssima”, aumentando a pressão para que ele deixe a pasta. Padilha tirou licença do governo alegando problemas de saúde. A previsão era de que ele iria fazer, neste fim de semana, uma cirurgia para retirada da próstata.
Segundo a “Folha”, a partir de agora o presidente vive uma guerra de versões: ou o ministro da Casa Civil encontra uma boa explicação para se livrar da história, ou Michel Temer não terá muita escolha a não ser tirá-lo da Casa Civil.
Anota o jornal que o presidente percebeu nos últimos dias que é preciso lidar com a frustração. “Mais do que isso. O inquilino do terceiro andar do Palácio do Planalto reparou que nem sempre a saída mais segura — ou a que mais lhe agrada — poderá ser sua opção final.”
Cassação de chapa
Como preocupação pouca é bobagem, Michel Temer tem outro flanco para cobrir, esse no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Numa articulação que envolve ministros, políticos e magistrados, o governo tenta protelar no órgão o desfecho da ação que pode resultar na cassação da chapa Dilma Rousseff—Michel Temer e na consequente interrupção do mandato do atual presidente da República.
O jornalista Josias de Sousa, no Blog do Josias, na sexta-feira, apurou que o temor no Palácio do Planalto e entre aliados do peemedebista é que o ministro Herman Benjamin, relator do processo no TSE, votará a favor da cassação. O medo foi potencializado pela decisão de Benjamin de interrogar delatores da Odebrecht sobre repasses ilegais feitos ao comitê de campanha vitorioso nas eleições presidenciais de 2014.
Dois dos sete ministros que compõem o plenário do TSE terão de deixar o tribunal. Henrique Neves sairá em abril. Luciana Lóssio, em maio. Caberá a Michel Temer indicar os substitutos que irão compor o colegiado incumbido de julgá-lo.
O blog apurou que o presidente pende para a indicação de dois advogados que já atuam como substitutos dos titulares no TSE: Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira de Carvalho Neto. Na quinta-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou a lista tríplice com os candidatos à vaga do ministro Henrique Neves. Os nomes de Admar e Tarcísio, preferidos de Temer, constam da lista. O terceiro é Sérgio Banhos.
Ainda segundo o blog, a movimentação do relator Herman Benjamin sugere que ele não está alheio ao que se passa ao redor. “Ao intimar delatores da Odebrecht para depor em plena Quarta-feira de Cinzas, o ministro sinalizou a intenção de submeter seu voto ao plenário do TSE antes da saída dos colegas Henrique Neves e Luciana Lóssio. Ao farejar o risco, operadores de Temer passaram a cultivar o desejo de que um dos ministros da Corte Eleitoral formule um pedido de vistas do processo, empurrando o julgamento com a barriga.”
Como se vê, Michel Temer tem imensas dificuldades internas e externas para levar a bom termo seu mandato de transição. l