Compensação de perdas do ICMS é ação de pacificação política

12 fevereiro 2023 às 00h00

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A política econômica já era apontada como uma prioridade desde o período das eleições de 2022, antes mesmo do resultado que deu a Luiz Inácio Lula da Silva (PT). De fato há uma preocupação real como futuro econômico do país, mas a discussão pareceu perder espaço diante de ataques aos prédios dos Três Poderes e a crise humanitária dos yanomami. Mas não deixou de ser uma questão latente, e passa também pela pacificação política – principalmente quando se fala na relação com os estados.
Embora as manchetes se voltem para uma tensão entre o presidente Lula e o presidente do Banco Central, Campos Neto. Há outro tema que pauta os estados: ICMS.
A política do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) forçou mudanças nas alíquotas de ICMS para combustíveis, energia, comunicações e transportes no ano passado ocasionaram perda de receitas de R$ 44,2 bilhões aos estados no segundo semestre de 2022, de acordo com levantamento feito pela Associação Nacional das Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite). É preciso lembrar que o ICMS é o principal tributo dos estados, que estão brigando pela recomposição dos valores com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Conforme levantamento da Febrafite, doze estados registraram perdas superiores a R$ 1 bilhão de arrecadação – Ceará, Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso, Pará, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. Juntos, eles perderam R$ 37,8 bilhões em arrecadação de tributos que incidiriam sobre combustível, energia, comunicações e transportes.
Segundo cálculos da Secretaria de Economia de Goiás, o estado perdeu em 2021, R$ 5,5 bilhões referente ao ICMS. Valor significativo para os cofres estaduais e motivação para uma articulação para compensação dessa perda.
Embora a discussão sobre a compensação enfrente obstáculos por causa do teor vago da lei, que menciona a compensação de diferenças de arrecadação entre 2021 e 2022, com gatilhos, mas sem indicar correção inflacionária, abrir o diálogo e demonstrar interesse em uma solução terá seus efeitos políticos junto aos governadores e as bancadas no Congresso.
O pagamento de uma reparação pela União aos estados foi colocado entre os principais temas na pauta das reuniões entre os 27 governadores e o presidente Lula no último mês. O governo de Lula intensificou as tratativas para pôr fim ao impasse. Em dezembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu um prazo de 120 dias para União e estados chegarem a um acordo. Mas o presidente demonstra ter interesse em solucionar o assunto para tratá-lo como um ato político e emplacar uma agenda positiva nos estados.
A compensação aos estados pelos cortes de ICMS pode custar à União até R$ 36,9 bilhões a União. O governo federal fez uma série de estimativas do valor que seria devido a cada um dos 26 estados e o Distrito Federal e, no cenário menos extremo, a fatura ficaria em R$ 13,2 bilhões. As simulações consideram diferentes cenários e é estudado até o parcelamento dessa compensação, negociação que o governador Ronaldo Caiado (UB) demonstrou ser favorável. Segundo o governador, a compensação vai “oxigenar” o caixa dos estados e dos municípios, que recebem 25% da arrecadação do ICMS. “Entendemos que o governo, ao parcelar compensação, também está nos atendendo no momento em que ele nos ajude a ter do Supremo [Tribunal Federal] o parecer favorável a esses temas.”
A União discorda de vários dos pleitos dos estados, mas pode acabar atendendo a um ou dois itens de forma a conseguir acelerar o desfecho do acordo. A orientação é verificar qual desses pontos teria menor impacto nos cofres do governo federal. A forma de pagamento também está sendo estudada. Por um lado, alguns estados já obtiveram liminares e estão abatendo valores de suas parcelas da dívida. O valor compensado até agora chega a R$ 9,05 bilhões. Por outro, o governo federal tem restrições fiscais a serem observadas no caso de escolha por um repasse aos estados —entre elas o resultado primário e o teto de gastos, que limita o crescimento das despesas à inflação.
Essa boa vontade do governo federal em negociar as compensações por perdas ocasionadas por uma política desastrada de Bolsonaro tem como uma das razões – talvez a maior delas – o futuro político do governo. Lula tem importantes projetos para aprovar no Congresso. Um deles, a Reforma Tributária, que deve enfrentar resistência de parte significativa dos parlamentares. A ideia de Lula é prestigiar governos estaduais e lideranças com seus pleitos quanto ao ICMS e demandas locais, para cobrar a fatura mais adiante no Congresso.
Essas tratativas sobre a compensação do ICMS vai ao encontro do discurso de campanha de Lula que afirmou que iria retomar as relações com os governadores. A expectativa do governo, inclusive, é de que sejam realizadas reuniões periódicas com os chefes dos Executivos estaduais. Seria uma forma de contrapor o governo anterior, marcado por embates com os governadores, principalmente em razão das restrições definidas pelos estados para tentar conter a disseminação da Covid-19.