Volta e meia uma autoridade do governo federal expressa inconformismo com brasileiros que não consideram que o País ingressou no primeiríssimo mun­do a partir do dia 1º de janeiro de 2003. Sobre os manifestos do ano passado, por exemplo, o ministro Gilberto Carvalho disse que o governo ficou “perplexo” e o sentimento era quase de “ingratidão”:

Quando acontecem as ma­ni­­fes­tações de junho, da nossa parte houve um susto. Nós ficamos per­plexos. Quando falo nós, é o go­verno e também to­dos os nossos movimentos tradicionais. [Houve] uma certa dor, uma in­com­preensão e qua­se um sentimento de ingratidão. [Foi como] di­zer: fizemos tanto por essa gente e agora eles se levantam contra nós.”

Pois é. Ingrato, esse povo. Gilbertinho deve ter ficado ainda mais assustado e perplexo na semana passada, com a divulgação de pesquisa do Pew Research Center, dando conta de que a maioria significativa dos brasileiros está descontente com a situação geral do país, refletindo um cenário em que houve forte aumento nos últimos 12 meses dos que consideram que a economia vai mal.

Entre 10 e 30 de abril, o levantamento constatou que nada menos que 72% disseram estar insatisfeitos com o estado de coisas no Brasil, bem acima dos 55% registrados há um ano, semanas antes das manifestações de junho de 2013. Já o porcentual dos que afirmaram estar satisfeitos recuou de 44% para 26%.

Anota o “Valor Econômico”: “Nesse período de um ano, a parcela dos brasileiros que consideram que a economia vai mal subiu de 41% para 67%. Apenas 32% dos entrevistados considera que a economia está bem, um tombo expressivo em comparação com os 59% observados na pesquisa de 2013.

“O aumento de preços é apontado como um “problema muito grande” por 85% dos ouvidos pelo Pew, um respeitado centro de pesquisas dos Estados Unidos. Esse porcentual é parecido com os 83% registrados um ano atrás.”

Crescimento econômico baixíssimo — o pior entre os países emergentes —, inflação real derretendo o poder de compra, escândalos quase diários, corrupção deslavada em obras públicas, aparelhamento do Estado. Esses são apenas alguns dos males que a população está percebendo. Não tem nada de “ingratidão”. É indignação.