Ao priorizar candidatura de deputados, partidos enfraquecem terceira via

29 maio 2022 às 00h00

COMPARTILHAR
Siglas estão focadas em ampliar seu poderio no Legislativo, deixando de lado projeto para o Executivo
Há 33 anos ocorria primeira eleição com direito ao voto direto após a ditadura militar. Em 1989 foi registrada uma quantidade de candidatos a presidência que até hoje é um recorde nacional. Naquele ano foram 22 nomes concorrendo ao Palácio do Planalto. A fragmentação política pelo qual o país passava é a principal razão para a quantidade de candidatos no pleito, segundo os historiadores e analistas.
O que ocorreu em 89 também foi uma demonstração de vigor da democracia. As candidaturas postas vieram carregadas de ideologias, cada qual representando bem os setores e segmentos que davam vida a candidatura. Nas eleições seguintes, em 94, apenas nove políticos concorreram a presidência. Podemos considerar uma queda drástica na participação e representação política/ideológica brasileira.
Existem quem defenda que apenas dois partidos políticos seriam suficiente para o sistema eleitoral brasileiro. Mas ao se levar em conta a heterogeneidade ideológica, o dinamismo e as contradições da população, fica evidente que não cabem em uma limitada divisão entre centro-esquerda e centro-direita. Por essa visão, podemos defender que quanto mais partidos políticos, mais projetos de nação são representados e mais forte é a democracia. Mas, embora o Brasil tenha registrado uma alta na taxa de natalidade de partidos políticos, o país não é referência quando o assunto é a estruturação de partidos ideológicos e programáticos. Pelo contrário, nossa política é reconhecida pela prática do “balcão de negócios”, ou do “toma lá, dá cá”.
Quem quiser defender a representatividade partidária brasileira ainda encontra argumento na existência de 32 legendas no País. Entretanto, isso não significa candidaturas que possam de fato serem colocadas como opções aos eleitores. Veja que nas eleições presidenciais de 2018, 13 candidatos concorreram ao pleito. Este ano, até o momento, são 12 pré-candidatos – a tendência que diminua até as convenções. Ainda assim, a disputa está polarizada, como uma espécie de continuidade do segundo turno de 2018, em que PT e Jair Bolsonaro (PL) são os protagonistas.
Uma das principais razões que desencorajam o surgimento de candidaturas solidas ou mesmo a consolidação da terceira via é o desinteresse dos partidos em “bancar” uma campanha para presidente.
O ex-governador de São Paulo João Dória (PSDB) foi a última vítima do desinteresse de alguns partidos em estarem na disputa pelo Palácio do Planalto. Antes do tucano, vieram João Amoêdo, Luciano Huck, Luiz Mandeta, Rodrigo Pacheco, Alessandro Vieira e Sergio Moro. Cada um tem uma história e razões diferentes para o enfraquecimento de seus projetos eleitorais para disputa da presidência, mas todos guardam algo em comum: o fato de seus partidos não fazer valer a candidatura própria para presidente.
O fato demonstra uma fragilidade no processo eleitoral brasileiro e que, os olhares mais apurados podem notar, faz mal para democracia. Em uma breve avaliação, é possível apontar que as mudanças implementadas no conjunto de regras eleitorais nos últimos anos afetou as disputas – favorecendo o lançamento de candidaturas ao Legislativo, em detrimento ao Executivo.
Uma das mudanças que provoca esse efeito é a proibição, feita pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de doações de empresas aos candidatos. Essa regra faz com que parlamentares que tinham meios para conseguir financiamento privado para suas campanhas, passem a depender exclusivamente de verbas públicas. Neste cenário, o candidato ao executivo passa concorrer com deputados na busca por recursos do partido. E os partidos já demonstraram quem tem a prioridade.
O modo estratégico de fortalecer as chapas legislativas está presente em partidos de todas as correntes ideológicas. Lideres de esquerda, direita e todo o espectro que há entre eles, trabalham para priorizar, na disputa em outubro deste ano, as 513 cadeiras na Câmara dos Deputados. O Legislativo tem ganhado maior importância a cada eleição que se passa. Além das atribuições históricas desses parlamentares, as siglas estão de olho nos recursos partidários, nas emendas orçamentárias e no poder de barganha com o Executivo.
O sucesso nas urnas das chapas de deputado federal é a representação da força do partido no Legislativo Nacional. É exatamente essa força que é usada como critério para a distribuição da maior parte das verbas dos fundos partidário e eleitoral (com previsão de gasto de mais de R$ 3 bilhões em 2022) e do tempo de propaganda dos candidatos na TV e rádio, ambos instrumentos essenciais à sobrevivência dos partidos.
Além da importância para distribuição dos recursos, a eleição de deputados federais também demonstram forças em outros pontos. Entre eles, está o fato de a Câmara dos Deputados ser a Casa aonde maior parte das leis do país são definidas. Para os partidos e suas ideologias, é importante ter peso nessas votações. Maior exemplo é o fato de ser os deputados que autorizam o Senado abrir um processo de impeachment contra o presidente da República.
Para atender as demandas partidárias e ampliar suas influências nas bases eleitorais a figura do deputado assumiu nos últimos anos uma importância impar. Isso porque está na mão dos parlamentares o poder de destinar verbas públicas bilionárias previstas no Orçamento da União – trata-se das emendas parlamentares. A indicação de destinação de verbas pode ser feita individualmente por cada um dos 594 deputados e senadores, além das de bancada estadual. Vale lembrar que não se trata apenas de sugestão para um investimento ou outro. São emendas com caráter impositivo, em que o presidente é obrigado liberar a verba para as obras e investimentos no reduto eleitoral dos políticos. Vale destacar que no ano passado essas emendas representam R$ 16,4 bilhões do Orçamento federal.
Numa concorrência entre candidatos ao Executivo e ao Legislativo, os partidos já escolheram os seus. Para evitar financiamento de campanhas para presidente em um cenário de extrema polarização, os líderes partidários preferem ver os projetos eleitorais naufragarem. Esse fenômeno resulta no desencorajamento de novas lideranças, na falta de opções para o eleitor e no enfraquecimento da democracia.