Nova biografia do poeta curitibano Paulo Leminski: espera-se que não seja mais uma hagiografia
Nova biografia do poeta curitibano Paulo Leminski: espera-se que não seja mais uma hagiografia

Paulo Leminski é o poeta pau para toda a obra. Precisa-se de um verso de impacto para fortalecer um artigo aparentemente insosso, pimba: Leminski. O articulista quer apimentar seu texto com uma frase bem humorada, às vezes picante, não resta outra alternativa: convoca-se o Ranieri “Modess” Mazzilli da poesia e da frase de efeito. O momento exige um poema que seja meio piada, mais ou menos inteligente e, especialmente, “espirituoso” (palavra que deveria ser banida do Bananão), pois não: chame o Leminski. Há algum tempo, publicaram sua biografia — “O Bandido Que Sabia Latim” —, que mais parece ode a um deus do que descrição da vida de um homem. A família do bardo curitibano, que sabiamente criou e cultivou a própria mitologia, proibiu a nova edição, deixando de perceber que se trata de uma hagiografia das mais inofensivas.

Agora, um escritor, um bom escritor, Domingos Pellegrini lança “Minhas Lembranças de Leminski” (Geração Editorial, 200 páginas). Sabe-se que a família, ciosa (há até uma ex que se apresenta como “mulher”, tipo Maria Kodama e Yoko Ono), tentou interferir, quiçá para aumentar a santidade do santo. Como o livro está saindo, e por uma editora consistente, é sinal que as controladoras, mulheres e filhas, quem sabe com “estrela” em baixa e raízes poéticas “ruins”, não conseguiram censurá-lo. E isto, diria a Bíblia, Deus acha bom.

Release da editora: “É uma biografia não convencional, altamente poética, onde não são as ações que estão enfocadas, como a narração da vida do biografado, mas seus pensamentos… Pellegrini traz Leminski à vida a partir do que viveu com ele, suas constantes e intensas conversas, ao mesmo tempo em que narra o Leminski da mídia, famoso e cultuado escritor da poesia concretista”. Fiquei intrigado: os pensamentos? Que tipo de pensamentos? Leminski pode mesmo ser enquadrado, a fórceps, como poeta ou “escritor” concretista? O vate (ops!) paranaense não era, certamente, concretista.

Sua poesia talvez seja mais próxima do “brincadeirismo” de Oswald de Andrade e, até, de Mario Quintana. Em termos formais, no geral ao menos, está distante da poesia de Haroldo de Campos, de Décio Pignatari e de Augusto de Campos. A ousadia formal de Leminski está muito mais acentuada no romance “Catatau”, no qual, aí sim, está próximo de um deus amado pelos concretistas e pelos apóstolos da literatura de invenção — James Joyce, o de “Ulysses”. O Leminski que talvez possa ser nominado de filho — edipiano? Sabe-se lá — do concretismo é mais o tradutor. É possível que as traduções inventivas (ou transcriativas) dos brothers Campos e as de Leminski sejam irmãs.