Wanderlei Silva e Chael Sonnen: brigada real e jogada comercial
Wanderlei Silva e Chael Sonnen: brigada real e jogada comercial

O escritor britânico Samuel Johnson morreu há 230 anos, mas, por intermédio de uma frase, manda uma cotovelada curta e certeira para Wanderlei Silva, o lutador de MMA: “O patriotismo é o último refúgio de um patife” (“A Vida de Samuel Johnson”, de James Boswell), na tradução de Paulo Rónai, ou, na versão de Ruy Castro, “o último refúgio dos canalhas”.

Wand, como é chamado pelos íntimos, ou Cachorro Louco, como é mencionado por aqueles que transitam pelo passado, siderados, é, ao lado do americano Chael Sonnen, treinador do Tuf Brasil. Lutadores desconhecidos entram no octógono em busca de um contrato com o UFC, o principal promotor de lutas de MMA do mundo. Enquanto jovens batalham no octógono, Wanderlei Silva ameaça e, até, ataca fisicamente Chael Sonnen — sempre sugerindo que o gringo ganha dinheiro na terra de Machado de Assis e Eder Jofre e fala mal do país. Como se o brasileiro não ganhasse dinheiro nos Estados Unidos. Por certo, até fala mal da nação (cacófato apreciável) de Norman Mailer (“A Luta”, seu livro sobre boxe, é superior à sua literatura) e Muhammad Ali (o James Dean do boxe).

Falar mal de países e de indivíduos é o esporte número um da humanidade, diria o bem-humorado Mark Twain. Sonnen é especialista, como fazia Muhammad Ali com seus adversários — no Zaire, derrotou George Foreman primeiro com a boca e, depois, com os punhos —, na arte de desestabilizar seus adversários. Nem sempre funciona, mas é, no geral, intimidador. Com Wanderlei Silva, a tática não deu muito certo, porque, quando não responde na mesma moeda, com uma língua afiada e nacionalisteira — tenta jogar os patropis contra o americano —, o brasileiro reage com os punhos, o que, se não intimida Sonnen, o coloca na defensiva.

A “briga” entre Wanderlei Silva e Chael Sonnen é “real” ou faz parte de um marketing destinado a promover a luta da dupla? As duas coisas, possivelmente. Os rivais e o UFC de Dana White certamente ganharão com o clima de guerra que está sendo criado. Cautas ou não, as pessoas começam a esperar a luta entre “campeões”… decadentes, mas com meio por cento de elegância. Chael Sonnen, aparentemente menos desgastado, ganhará. É minha aposta. Wanderlei Silva está mais Louco do que Cachorro.

Uma coisa é certa: o Cachorro Velho, opa, Louco, não me representa. Talvez represente apenas seus negócios. O que Wand quer, como Cachorro Manso fingindo-se de Cachorro Louco, é, quem sabe, uma aposentadoria polpuda.

Para terminar aquilo que não termina, o engana-trouxa que é o mundo do espetáculo, citemos, para aderir à nossa cultura bacharelesca, sempre pródiga em citações (não raro sem o mínimo de contexto), Ambrose Bierce, o escritor americano que desapareceu no México, ao lado de Cain Velasquez, ops, de algum revolucionário mexicano: “No famoso dicionário do dr. Johnson, o patriotismo é definido como o último recurso de um patife. Com todo o respeito devido a um lexicógrafo bem informado, mas inferior, permito-me sugerir que é o primeiro” (do “Dicionário do Diabo”). Difícil discordar de Bierce e de Johnson, mas fácil discordar daquele que foi, de fato, o Cachorro Louco do octógono.