Não se curvando à pressão dos “mictórios do ódio”, a médica da USP entrou grande e saiu gigante do Palácio do Planalto

A médica Ludhmila Hajjar, nascida em Anápolis mas radicada em Sampa, onde se tornou professora da Universidade de São Paulo (USP) e trabalha em hospitais de alta qualidade — o cardiologista Roberto Kalil diz que, além de uma grande profissional, é uma gestora eficiente, uma workaholic —, é uma mulher de fibra, de coragem.

Ludhmila Hajjar: a médica ficou maior como não-ministra | Foto: Reprodução

Convidada pelo presidente Jair Bolsonaro para ser ministra da Saúde, aceitou conversar, pois queria entender se poderia mudar “tudo”. Porque o governo federal está errando, em tempo integral, no combate à pandemia — inclusive quando seu líder máximo não usa máscara, duvida da eficácia da vacina e faz pilhéria com as mortes (por sua fala, fica-se com a impressão de que as pessoas estão morrendo não por causa do novo coronavírus, da Covid-19, e sim por falta de coragem).

Ludhmila Hajjar quis saber se o presidente estava mesmo disposto a mudar sua postura pessoal (“contaminante”, porque é um “influencer”) e a modificar a ação (inação) do governo no combate à pandemia. Seria uma volta para o caminho da ciência (e do humanismo), que, desde a saída do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, se tornou um “demônio” para Bolsonaro e seus principais aliados.

Não era exatamente o que pretendia o presidente. Bolsonaro queria mudanças cosméticas, algumas adaptações, para o governo voltar a ser popular e, deste modo, ter garantias de que irá para a reeleição com chance de vencer os candidatos do PT e do centro.

A medicina, nestas condições, não estaria a serviço da vida, de salvar vidas, e sim a serviço de elevar a popularidade de Bolsonaro. Isolamento social mais rigoroso no Nordeste? De jeito nenhum. Porque lá o Lula da Silva do Bolsa Família ainda é um político forte.

Uma campanha mais acentuada pela vacinação? Também não. O governo Bolsonaro não está inteiramente inerte, mas, tendo chegado atrasado para adquirir vacinas — quando outros países, como Estados Unidos e Israel, saíam na frente —, não busca acelerar a vacinação. Como vítimas de uma guerra civil, à qual as pessoas (quase) não têm como reagir, por falta de amparo do governo federal, já morreram quase 300 mil brasileiros.

Ludhmila Hajjar, médica, e Jair Bolsonaro, presidente: prevaleceu a coragem de uma mulher, médica e cientista contra o populismo eleitoreiro | Fotos: Reproduções

Pois, ao saber que teria de fazer mudanças cosméticas, mais para elevar a popularidade de Bolsonaro, Ludhmila Hajjar teve a coragem de dizer “não”. Sabia que, ao rejeitar o convite, seria atacada pelos “gabinetes do ódio”; na verdade, um equivalente eufemístico para “mictórios do ódio”. Mas seu histórico de médica altamente qualificada é um antídoto eficaz — uma vacina poderosa — contra os ataques tão gratuitos quanto articulados pelo exército bolsonarista.

Quem conhece Ludhmila Hajjar diz que a jovem médica, de 43 anos, nasceu séria. De fato, pacientes contam que é extremamente focada e dedicada. Sabe o que quer e o que não quer. Sabe o que funciona e o que não funciona. A médica entrou “grande” e saiu “gigante” do Palácio do Planalto. A dra. ficou maior como não-ministra. Se tivesse aceitado o cargo, dado o caráter errático de Bolsonaro, talvez, no médio prazo, saísse menor como… médica.

No lugar de ler e assistir paralisado às agressões a Ludhmila Hajjar nas redes sociais, o Brasil deveria aplaudi-la e defendê-la. Pela coragem. Pela competência. Pela humanidade. Por entender que salvar vidas não tem nada a ver com eleições. Bolsonaro não quer saber, mas a vida não tem estepe — é só uma.