A tendência é que, em algum momento, a economia chinesa supere a americana. Resta saber se os EUA vão perder a hegemonia sem uma batalha

Os Estados Unidos e a União Soviética quase foram à guerra na década de 1960. A batalha só não ocorreu possivelmente por causa da energia nuclear. O risco de destruição era imenso para as duas potências — que tinham a bomba atômica. Depois de uma refrega, que envolveu Cuba, o bom senso do soviético Nikita Kruchev e do americano John Kennedy prevaleceu e optaram não pela guerra física, e sim pela continuidade da Guerra Fria.

A União Soviética desmoronou em 1991, corroída por uma crise econômica estrutural e pelo “desânimo” da sociedade civil, e os Estados Unidos reinaram, por algum tempo, sozinhos. Mas a hegemonia solitária não durou muito. Aos poucos, adotando medidas capitalistas e mantendo o regime comunista, o governo da China criou uma revolução industrial-tecnológica que tornou o país a segunda maior potência global, com a possibilidade de superar o país de William Faulkner e Ernest Hemingway daqui a alguns anos. A China não para de crescer, conquistando o mercado mundial e, de alguma maneira, sendo a estabilizadora ou desestabilizadora de outras economias, como a brasileira, da qual compra, por exemplo, soja e carne.

Os Estados Unidos parecem não saber como lidar com a China. Fica-se com a impressão de que o país “inventou” Donald Trump para conter a ameaça que vem do Oriente. O personagem, que parece ter saído de algum filme de faroeste, é isolacionista e, volta e meia, ameaça os chineses. Suas palavras parecem bravatas, mas refletem o receio de os Estados Unidos perderem a liderança mundial, em termos de economia e, também, de influência política.

Donald Trump e Xi Jinping: guerra fria ou guerra armada? | Foto: Reprodução

Resta saber: o conflito econômico e político entre os Estados Unidos e a China pode levar a uma guerra entre os dois países, transformando a batalha em uma Terceira Guerra Mundial? Há quem acredite que sim. Tendo a acreditar que não, dada a capacidade de destruição em massa das duas potências. Minha tese é que a guerra será (já é) tão “fria” quanto a entre a União Soviética e os Estados Unidos.

Os Estados Unidos permanecerão ameaçando, tentando conter a expansão chinesa, e a China vai ficar na defensiva, mas crescendo de tal maneira que a tendência é que supere a economia da nação de Henry James e T. S. Eliot. Os EUA não se tornaram uma terra devastada, dada a solidez de sua economia e a qualidade de seus criadores tecnológicos, mas possivelmente, em menos cinquenta anos, acabará por aceitar a hegemonia, contentando-se com um honroso segundo lugar, que terá que disputar, quem sabe, com a Alemanha, hoje atrás do Japão. A longo prazo, com governos estabilizadores e maior incentivo ao desenvolvimento tecnológico, a tendência é que o Brasil também se aproxime um dos poucos mais dos gigantes. A Índia também deve se aproximar.

Graham Allison, professor de Harvard | Foto: Reprodução

Aos interessados no assunto, para uma discussão mais substanciosa, a Editora Intrínseca está lançando “A Caminho da Guerra — Os Estados Unidos e a China Conseguirão Escapar da Armadilha de Tucídides” (416 páginas, tradução de Cassio Arantes Leite), de Graham Allison, professor de Harvard.

Leia sinopse da editora

“Historiador analisa o impacto do crescimento da China sobre os Estados Unidos e a ordem mundial e explica as verdadeiras possibilidades de esses países entrarem em guerra.

“A tensão crescente entre China e Estados Unidos vem alarmando o mundo. Conforme esse panorama se delineia, fica cada vez mais nítido que os dois países parecem a caminho da guerra e que as consequências disso serão mundialmente catastróficas. Essa sensação de inevitabilidade foi descrita como a Armadilha de Tucídides.

“Em seu tempo, o historiador da Grécia Antiga que deu nome à expressão observou que ‘a ascensão de Atenas e o consequente temor instilado em Esparta tornaram a guerra inevitável’. Desde então, a armadilha descrita por Tucídides passou a designar o momento em que uma potência em ascensão ameaça tomar o lugar do poder dominante. Ao longo dos últimos cinco séculos tais condições ocorreram 16 vezes ― e em 12 delas uma guerra eclodiu.

“Hoje, enquanto uma China irrefreável desafia a já consolidada supremacia dos Estados Unidos, essas nações correm o risco de protagonizar um conflito de repercussão devastadora. As promessas de seus presidentes de tornar seus países ‘grandes novamente’ são a base da política externa de ambos e oferecem um vislumbre sombrio da construção do décimo sétimo cenário. Conflitos comerciais, ataques cibernéticos, a crise da Coreia ou um acidente marítimo podem facilmente transformar os constantes desentendimentos entre as duas potências em uma guerra declarada.

“Em ‘A Caminho da Guerra’, o professor de Harvard Graham Allison alia história aos fatos atuais para explicar o mecanismo eterno da Armadilha de Tucídides. Ao analisar o impacto do crescimento da China sobre os Estados Unidos e sobre a ordem mundial, Graham esmiúça as difíceis medidas que poderiam ser adotadas a fim de impedir um desastre de magnitude planetária.”

Sobre o Autor

Graham Allison é diretor do Belfer Center for Science and International Affairs, da Universidade de Harvard. Foi reitor fundador da John F. Kennedy School of Government e atuou como conselheiro no Departamento de Defesa nos governos Reagan, Clinton e Obama.