Livro de Eduardo Cunha deixa mal Michel Temer, Rodrigo Maia e Baleia Rossi

24 janeiro 2021 às 00h00

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O ex-presidente da Câmara dos Deputados revela que Temer articulou o impeachment, apoiado por Maia, e denuncia esquema de deputado federal tucano

A Editora Matrix lança em abril o livro “Tchau, Querida — O Diário do Impeachment” (um catatau de 740 páginas), do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, em parceria com a filha Danielle Cunha. O repórter Cássio Bruno resenha o livro, de maneira breve, na mais recente edição da revista “Veja”, sob o título de “As revelações do livro de Cunha sobre bastidores do impeachment de Dilma”. Fica-se com a impressão de que o jornalista teve acesso a excertos da obra, porque comenta pouca coisa de seu conteúdo.
A publicação da Editora Abril não recomenda, mas fica a sugestão de que talvez seja crucial acompanhar a leitura do cartapácio com o livro “A Organização — A Odebrecht e o Esquema de Corrupção Que Chocou o Mundo” (Companhia das Letras, 639 páginas), da jornalista Malu Gaspar. Eduardo Cunha é mencionado em 15 páginas. O retrato do ex-deputado sai manchado da exaustiva e irretocável pesquisa da repórter da revista “Piauí”. Não há nada de heroico no político que, para mostrar poder e defender seus interesses e do grupo de aliados, contribuiu, de maneira decisiva, para derrubar a presidente Dilma Rousseff, do PT.

O trabalho de Malu Gaspar é nuançado, com exposição detalhada da corrupção sistêmica, da qual Eduardo Cunha era um dos próceres — um especialista em vender dificuldades para obter facilidades —, que abalou o Brasil e, como diz o título, “chocou o mundo”.
O objetivo de Eduardo Cunha, com “Tchau, Querida”, talvez seja piorar a imagem dos adversários — alguns deles ex-amigos ou ex-aliados — e melhorar a própria. É possível? Melhorar a imagem do ex-parlamentar, produzindo a imagem de uma (quase) vítima, parece ser impossível, até porque há outros livros que retiram a roupa do ex-presidente da Câmara e expõe toda a sua nudez de sua liderança corrupta. Além do livro de Malu Gaspar, há também “Deus Tenha Misericórdia Dessa Nação — A Biografia Não Autorizada de Eduardo Cunha” (Record, 378 páginas), dos jornalistas Aloy Jupiara e Chico Otavio.
Eduardo Cunha revela que, em 2015, num edifício de luxo, no Rio de Janeiro, quatro políticos acertaram que a presidente Dilma Rousseff seria derrubada. Eduardo Cunha, do MDB, Rodrigo Maia, do DEM, Carlos Sampaio e Bruno Araújo, ambos do PSDB, eram os artífices do afastamento da petista. Dez meses depois, a política mineira estava fora do poder.

O ex-presidente Michel Temer participou, como agente ativo, do impedimento de Dilma Rousseff. “Não foi apenas o destino ou a previsão constitucional que fizeram Michel Temer presidente da República. Ele simplesmente quis e disputou a Presidência de forma indireta. Ele fez a ‘escolha’. Foi, sim, o militante mais atuante. Sem ele, não teria havido impeachment”, conta Eduardo Cunha. Uma novidade? Não. Mas, relatada pelo ex-presidente da Câmara, apesar de toda a sujeirada que patrocinou — insista-se: o livro de Malu Gaspar é espantoso, pois indica que a máfia não existe apenas na Itália e nos Estados Unidos —, acrescenta um ingrediente a mais na percepção da podriqueira da política patropi.
Rodrigo Maia, o Botafogo da Operação Lava Jato, não se sai muito bem do livro-vingança de Eduardo Cunha. “Não tinha limites para a sua ambição e vaidade. Na busca pelo protagonismo, Rodrigo Maia quis forçar ser o relator da Comissão Especial de Impeachment. Eu tive de vetar”, sustenta o iracundo dom Quixote da Tijuca. O leitor decerto perguntará: o retrato que Eduardo Cunha faz de Rodrigo Maia, o atual presidente da Câmara dos Deputados, não cai como uma luva no poderoso chefão que, ao defenestrar Dilma Rousseff, também acabou por cavar sua própria sepultura política? A resposta é…sim.
O candidato a presidente da Câmara dos Deputados Baleia Rossi, do MDB, sai com a imagem chamuscada do livro. “A empresa Ilha Produções Ltda., pertencente ao irmão de Baleia e a sua mulher, recebeu nas campanhas eleitorais de 2010, 2012 e 2014 milhões de reais em pagamentos oficiais e caixa dois, inclusive da Odebrecht.” Michel Temer e Baleia Rossi foram procurados pela “Veja”, mas optaram por não se manifestar.
Uma coisa é certa: Eduardo Cunha pode exagerar, até inventar algumas coisas, mas, se realmente contou o que sabe, e ele sabe muito, o livro tende a ser explosivo. Mas certamente contou com assessoria jurídica ao colocar suas diatribes no papel. Porque, dependendo do que revelou, pode até ensejar novas ações contra o ex-deputado.
O leitor talvez fique encafifado: por que a resenha da “Veja” menciona apenas rivais do presidente Jair Bolsonaro, como Rodrigo Maia e Baleia Rossi? Ah, sim, menciona também Michel Temer, que é aliado do defensor da cloroquina.
Condenado a 14 anos e seis meses de prisão — cumpriu três anos e cinco meses em regime fechado —, Eduardo Cunha, no momento, por pertencer ao grupo de risco da pandemia do novo coronavírus, está cumprindo a pena em sua casa, no Bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro. Tudo indica que continua amando odiar seus adversários, que trata como inimigos.