Poucas pessoas em Goiânia têm tanta noção de estética quanto o professor Lisandro Nogueira, titular da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás (FIC/UFG) e doutor em Cinema e Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Um dos grandes promotores da cultura no Estado, é a “mola propulsora” do cinema de boa qualidade em Goiás, seja pelo festival anual O Amor, a Morte e as Paixões, seja por seu programa semanal Cinema Falado, na Rádio Executiva FM.

Por isso, é preciso que se leve em conta o desabafo que fez em um depoimento espontâneo em seu perfil Instagram na última semana fora dos lamentos triviais. Parecendo acomodado nas dependências de um restaurante, o professor inicia a fala dizendo que estava naquele momento no hoje nada cinematográfico Setor Marista – talvez o bairro da capital que foi mais explorado pelo mercado imobiliário na última década.

“Eu estou aqui no Setor Marista e, de dez anos para cá, sempre achei que Goiânia iria se arrebentar. É um bairro tradicional de Goiânia, mas não é mais ‘aquele’ Setor Marista”, avaliou. De fato, as construtoras fizeram a festa desde o início da década anterior na capital por inteiro, mas atacaram a região do Marista de modo muito mais intenso.

Quando comecei a trabalhar no Jornal Opção, em 2011, a redação era na Rua 26, entre as ruas 9 e 13, em um dos típicos sobrados construídos por volta da década de 70 – havia outro, “gêmeo”, do outro lado da rua. Vagas de estacionamento na larga via eram fartas. Durante as reuniões de pauta na sala do editor-chefe, Euler de França Belém, no pavimento superior, pela janela era possível observar grande parte da vizinhança ainda que apenas de um andar acima. Mas, dali também, víamos praticamente subir um prédio, que aos poucos foi se mostrando um arranha-céu. Era apenas um das dezenas que invadiriam aquele quadrilátero formado pela Rua 9, Avenida T-9, Avenida Portugal e Avenida D, apenas um pequeno recorte – muito exemplar, porém – de todo o Marista.

Antes “horizontal”, o Setor Marista recebe cada vez mais arranha-céus | Foto: Elder Dias / Jornal Opção

O que era um bairro de se admirar pela arquitetura característica dos sobrados e casarões, combinada com comércios, bares e restaurantes acolhedores. Em algumas residências, havia até minibosques particulares, como em um terreno de uma família de empresários, na Avenida D, onde hoje está erguido um prédio de alto padrão, que encara outro do mesmo tamanho do outro lado da rua. Ambos aguardam para os próximos anos, a vizinhança de mais dois grandes edifícios.

Achar uma vaga em horário comercial, anos atrás, era cômodo. Hoje, se tornou uma façanha. A profusão de estacionamentos particulares, inexistentes há até poucos anos, é sintomática. Nas vias, durante a semana, a maioria das vagas é ocupada por veículos de trabalhadores da construção civil, bem como betoneiras e caminhões pesados em descarga.

Pode-se dizer que o Marista está em processo de “buenização”. Como ocorreu décadas atrás, com o Setor Bueno, o destino do bairro parece ser se transformar em um mar de altas colunas de concreto. É o mais novo “paliteiro” de Goiânia, como, aliás, também aconteceu com a região do Jardim Goiás e Alto da Glória.

Com seu olhar sensível e apurado, o professor Lisandro pega o que vê no Marista para refletir sobre a cidade por inteiro. “É o exemplo em que Goiânia caminha, um trânsito que não precisava ter, aqui não é São Paulo. (…) O que vai acontecer com Goiânia, é uma questão muito séria. Eu acho que [Goiânia] caminha muito… pro mal. Goiânia vai ficar uma cidade muito ruim. Não é otimismo nem pessimismo, é constatação.”

Como alguém que conhece a capital de outros tempos, ele lembra que imaginava que “Goiânia iria para outro lado, que seria uma cidade-jardim”. “Mas está caminhando para esse lado que é caótico”, diz, para concluir, com uma esperança remediadora: “Tomara que pelo menos seja como é São Paulo, que é caótica, mas é fascinante.”