Leitor espera que o cantor Roberto Carlos não tente censurar novo livro de Paulo César de Araújo

24 maio 2014 às 10h49
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A Editora Companhia das Letras lança o polêmico “O Réu e o Rei — Minha História com Roberto Carlos, em Detalhes”, que, se não for censurado, deve se tornar um dos best sellers deste ano

de Araújo começa a provocar polêmica, mas provavelmente
não será censurado pela Justiça
Roberto Carlos é um grande cantor e um cidadão de bem. Não à toa é uma referência para vários artistas e, diferentemente de alguns pares, nunca se envolveu em escândalos e falcatruas. Mas há um Roberto que parece não entender o que o Rei significa para o país. O cantor é um ícone — consagrado entre todas as classes sociais, com receptividade em praticamente todas as idades, menos, talvez, entre os mais jovens, que preferem rock e outros gêneros. Durante anos, a esquerda intelectual se sentia compelida a odiá-lo e a amar Chico Buarque e, às vezes, Caetano Veloso. Isto para consumo público. Privadamente, poucos deixaram de curtir uma, duas ou mais músicas do cantor de “Como é grande o meu amor por você”.
Por ser quem é, um ídolo nacional, os brasileiros querem saber mais sobre Roberto. Porém, tentando preservar sua intimidade — o que é praticamente impossível no mundo moderno, no qual o público e o privado se misturam e se contaminam, sobretudo quando se tratam de pessoas públicas —, o artista, com seus advogados, busca censurar biografias e livros despretensiosos. Numa longa e bem-sucedida batalha, conseguiu tirar de circulação a biografia “Roberto Carlos em Detalhes” (Editora Planeta), de Paulo César de Araújo.
“Roberto Carlos em Detalhes” é uma biografia absolutamente decente, e até laudatória, por vezes com aspecto de hagiografia. O texto é preciso e amoroso. Paulo César de Araújo revela-se apaixonado pelo Rei, talvez excessivamente apaixonado. Mesmo assim, por ser um pesquisador meticuloso, sabe que biografias ou contam tudo, tornando-se uma referência, ou escondem quase tudo, tornando-se uma obra a se evitar. Fica-se com a impressão, concluída a leitura, que o autor sabe tudo, ou quase, sobre o cantor e compositor. Como não se trata de uma obra que pretende examinar as músicas do Rei criticamente, mas fundamentalmente evidenciar como foram criadas e o sucesso que obtiveram, consagrando o artista como uma espécie de Frank Sinatra patropi, não convém nem mesmo sugerir que, nesta questão, a biografia fica a dever. Como se trata de um trabalho pioneiro, sem obras anteriores para fundamentá-la e como o cantor não quis se pronunciar, esclarecendo pontos nebulosos — além de acrescentar questões que só ele pode revelar —, não há como não se referir a ele com o adjetivo excelente. O próprio Roberto terá de consultá-lo para saber mais de si, principalmente a respeito do que os outros disseram dele.

Roberto precisa entender, e certamente vai compreender isto, que é muito mais importante que um biógrafo sério, como Paulo César, vasculhe e conte sua vida, com precisão, do que, mais tarde, quando não estiver entre os vivos para promover alguma contestação, algum biógrafo inescrupuloso esparrame histórias sensacionalistas que, na falta da contradição, podem se tornar dominantes. Dizer que uma pessoa perdeu uma perna, devido a um acidente na infância, não é crime. Porque a informação é verdadeira.
Comentar a vida amorosa, especialmente de uma figura pública, como Roberto, não é o mesmo que assassinar reputações. O artista poderia ter convidado Paulo César para uma conversa e explicitar que alguns aspectos de sua pesquisa não estão devidamente apurados. Mas censurar a biografia apenas transformou Paulo César em vítima e Roberto numa espécie de censor que ele nunca quis nem quer ser.
Espera-se que Roberto não implique com o livro “O Réu e o Rei — Minha História com Roberto Carlos, em Detalhes”, de Paulo César, que acaba de ser lançado pela Companhia das Letras (528 páginas).
O livro revela a batalha jurídico-pessoal de Paulo César para tentar liberar a biografia “Roberto Carlos em Detalhes”. Para publicar “O Réu e o Rei”, a Companhia das Letras agiu em segredo, pelo menos durante algum tempo, e articulou uma distribuição rápida do livro (em papel e eBook) para evitar uma possível apreensão. A editora, de sócios brasileiros e internacionais, cercou-se também de um aparato jurídico para enfrentar o poderio de Roberto. “Estamos cientes dos riscos e resolvermos assumi-los”, afirma o publisher da editora, Otávio Marques da Costa. O editor não acredita que o livro será censurado. “O primeiro livro era uma biografia tradicional. Esta agora é a história do Paulo César, a visão dele sobre toda essa experiência. Os fundamentos que levaram à proibição da biografia não se aplicam neste caso. Essa é a nossa defesa”, diz Costa. As informações são da “Folha de S. Paulo”. Os advogados de Roberto por certo estão examinando a obra. Se as informações que incomodaram o cliente na biografia foram reproduzidas (não há como contorná-las) no segundo livro, possivelmente Roberto vai acionar o autor. Mas, desta vez, dificilmente vai conseguir retirar o livro de circulação, pois ele não é, em definitivo, uma biografia disfarçada. Mas os advogados e, sobretudo, Roberto podem discordar desta avaliação.