Folha de S. Paulo denuncia que revista da Abril, além de usar IA, cometeu plágio
10 março 2024 às 00h17
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Num sebo de Palermo, bairro de Buenos Aires, comprei o livro “Orwell — La Conciencia de una Generación” (Vergara, 443 páginas, tradução de M. Dulcinea Otero), de Jeffrey Meyers. Em 2016, depois de concluída a leitura da biografia, publiquei um texto, no Jornal Opção, informando que a brasileira Mabel Robinson Fierz havia contribuído para a publicação do primeiro livro do escritor britânico Eric Blair (George Orwell).
Antes de iniciar a redação do texto, verifiquei se havia alguma reportagem em português. Não havia. Observei também se existia alguma fotografia de Mabel Robinson Fierz na internet. Não havia. Então, depois de traduzir os trechos em que a brasileira — filha de pais ingleses — é citada, publiquei uma matéria a respeito.
Dias depois, o poeta Carlos Willian Leite me alertou que um jornal do Sul do país havia publicado uma reportagem sobre o assunto e, mesmo usando trechos de minha resenha-reportagem (inclusive as traduções feitas por mim), não citou o Jornal Opção. O bardo goiano enviou uma crítica à redação. Pouco depois, um redator recauchutou o texto, para descaracterizar o plágio evidente. Inclusive, a fotografia de Mabel Robinson Fierz é a publicada primeiramente pelo Jornal Opção.
Em seguida, outras publicações divulgaram textos a respeito da “patrocinadora” brasileira de Orwell, sem acrescentar nenhuma informação nova a respeito. Sinal de que, no geral, meu texto, ainda que não citado, é a matriz das “novas” reportagens. Faça o teste: procure, em qualquer veículo de comunicação brasileiro, um texto anterior ao meu a respeito do assunto Mabel Robinson Fierz.
A internet, com seus milhares de sites, se tornou uma terra de ninguém. O plágio se tornou uma instituição. Há também jornalistas que estão usando inteligência artificial para escrever “seus” textos — às vezes surrupiando reportagens de várias publicações, com o objetivo de ganhar tempo (para não falar na preguiça de pesquisar).
Revista “Bebê”, da Editora Abril
Na quinta-feira, 7, o repórter Pedro S. Teixeira”, da “Folha de S. Paulo”, publicou a matéria-denúncia “Abril retira do ar textos sob suspeita de terem sido escritos por IA”.
De acordo com a “Folha”, “nos primeiros 25 dias de janeiro, 311 textos publicados no site da revista ‘Bebê’ da Editora Abril tinham como assinatura Vanessa Tavares — é o equivalente a mais de 12 textos diários”. Porém, como a jornalista não foi localizada, há suspeita de que seja uma repórter fantasma. Quer dizer, alguém da publicação pode ter postado as reportagens sob assinatura de um nome inventado.
Procurada para apresentar uma explicação, a Editora Abril não se pronunciou. Helena Galante, diretora da “Bebê” na época dos problemas, disse apenas, à “Folha”, que não é (mais) responsável pela revista.
O levantamento da “Folha” mostra que, “em 22 matérias publicadas pela revista, há trechos idênticos aos textos publicados antes por veículos de comunicação como ‘Folha’, UOL, ‘O Globo’, a concorrente ‘Crescer’ (da Editora Globo) e a estatal britânica BBC”.
Entrevistas de especialistas concedidas a outros meios de comunicação foram reproduzidas pela “Bebê” — sem nenhuma citação às fontes.
A “Folha” procurou assessorias de imprensa, que foram mencionadas por “Vanessa Tavares” em reportagens, e elas informaram que não foram “procuradas pela suposta jornalista”.
As ferramentas Smodin e GPTZero detectaram uso de inteligência artificial por “Vanessa Tavares”. Pelo menos parcialmente. As reportagens — ou recortagens — não informaram o possível uso de IA. Professor de jornalismo digital da USP, Rodrigo Ratier disse a Pedro S. Teixeira que jornais, revistas e sites precisam informar aos leitores que, em determinadas reportagens, foi utilizada IA. “É o critério ético mínimo.”
A “Folha” aponta que duas jornalistas que publicavam reportagens no site da “Bebê” foram demitidas. Eram uma editora e uma repórter. Depois do afastamento delas, os “mais de 300 textos assinados por Vanessa Tavares” foram postados.
Depois da denúncia da “Folha”, sublinha o Portal Imprensa, a revista “Bebê” retirou do site “quase todos os textos com a assinatura de Vanessa Tavares. Em 26 de janeiro, o site da revista ‘Bebê’ teria saído do ar, voltando apenas no dia 31”.
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