Os cronistas do jornal da família Câmara receberiam juntos quase R$ 10 mil por mês e 115 mil reais por ano

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A missão principal do executivo Maurício Duarte é preparar o jornal “O Popular” para os novos tempos, nos quais vai predominar — o índice de leitura já é maior na internet, mas o comercial da rede ainda não supera o impresso — o jornalismo online. Depois de uma auditoria, que apurou produção e produtividade, o Grupo Jaime Câmara demitiu dezenas de funcionários, na redação e na área administrativa. Os novos gestores avaliam que ainda há “gordura” para eliminar; pouca, mas há. A cúpula decidiu cortar aquilo que avalia como “extra” e que não faz parte da estrutura funcional do jornal. Entram aí os colaboradores: cronistas, articulistas e colunistas.

Maurício “Mãos de Tesoura” Duarte afastou os 11 cronistas do jornal. A editora do “Magazine”, Daniella Gaia, ligou para os cronistas, informou que o jornal está passando por uma série de reformulações e assegurou que, adiante, poderão voltar. Ao menos alguns deles. É evidente que está transmitindo um recado da diretoria. Mas há outra versão. Cada colunista recebia um salário mínimo por mês. Com o aumento do salário mínimo para 880 reais, o jornal passaria a pagar quase R$ 10 mil por mês e R$ 115 mil por ano para os cronistas. Dada a qualidade do material publicado, uma referência cultural de vários anos, não se trata de um valor alto. Porém, num momento de contenção de custos, em que a empresa está cortando duramente funcionários com quase 30 anos de casa, chegou-se a conclusão de que, com os quase 10 mil reais mensais, é mais adequado manter alguns quadros fixos.

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Jornais como “O Globo”, “Folha de S. Paulo” e “O Estado de S. Paulo” pagam aos seus colaboradores fixos ou não. Mas em Goiás não é praxe — tanto que o “Diário da Manhã” mantém um caderno, quase um jornal, só com textos escritos por articulistas não remunerados — remunerar colaboradores. “O Popular” tende a seguir os demais jornais. Os próximos cronistas — se confirmada a informação de Daniella Gaia — provavelmente não serão remunerados, ou, se forem, não receberão mais um salário mínimo por mês.

Nos debates nas redes sociais, escritores e leitores lamentam, com razão, o afastamento dos cronistas. Porque as crônicas eram uma espécie de “suspiro” — ou até um corpo estranho — num caderno que é mais de entretenimento (e até sobre moda e turismo) do que de cultura. Dispensar Adelice Silveira Barros, Bariani Ortencio, Brasigóis Felício, Celso Costa Ferreira, Edival Lourenço, Flávio Paranhos (poucos autores dominam tão bem a arte do diálogo), Gabriel Nascente, Luiz Araújo, Maria José Silveira (cronista ímpar, segunda foto), Maria Lúcia Felix (leva o leitor a pensar e, se se pode dizer assim, a “despensar”; primeira foto) e Ursulino Leão é como arrancar Neymar e Messi do time do Barcelona. Maurício “Mãos de Tesoura” Duarte “demitiu” uma seleção de escritores de primeira linha, não apenas de Goiás, e sim do Brasil. Trata-se de um suicídio cultural. É provável que, no afã de ajustar a empresa — adaptando-a aos tempos de crise econômica, com faturamento em queda —, não tenha lhe sobrado tempo para ler ao menos um texto de um dos cronistas.

Ao “contratar” os cronistas, as ex-editoras Cileide Alves (chefe) e Rosângela Chaves (do “Magazine”) exigiam exclusividade: nenhum deles poderia escrever noutros jornais de Goiás. Quando algum desobedecia à “ordem”, era avisado de que a empresa não ficara “satisfeita”. Curiosamente, segundo um ex-editor, dois nomes estavam (estão) vetados e não podiam (podem) escrever no jornal. Um deles é poeta e, o outro, jornalista.