Cresce abismo entre Lula e evangélicos
06 março 2024 às 15h09
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A revolução da fé no Brasil é imensa. O número de templos evangélicos no Brasil cresceu 228% ao longo de mais duas décadas, segundo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) com base no CNPJ dessas instituições. Em 1998, quando começou a pesquisa, haviam 26,6 mil igrejas evangélicas no país ou 54,5% dos locais de culto. Até 2021, esse número saltou para 87,5 mil templos, sete em cada dez estabelecimentos religiosos registrados. O número pode ser maior, já que muitas casas de culto funcionam informalmente. E são para esses eleitores organizados e hierarquizados que o governo Lula precisa direcionar seu olhar.
Está passando da hora do governo federal buscar formas de chegar até eles. É preciso reconstruir pontes com diferentes denominações evangélicas, especialmente com aquelas mais pragmáticas e aquelas com as quais o governo Lula já se relacionou, como o Republicanos, ligado à Universal. A sigla esteve com Lula até 2018, e acabou rompendo apaixonadamente em um discurso quando o bispo Edir Macedo chegou a dizer na ocasião que o diabo tinha nove dedos. Depois, em tempos mais recentes, o bispo chegou a pedir desculpas pelas agressões, mas de lá para cá as conversas nunca mais foram as mesmas. De qualquer forma, da base de Lula são evangélicos que ele pode contar a ministra Marina Silva, a senadora Eliziane Gama, a deputada Benedita da Silva e o deputado Pastor Henrique Vieira, e eles precisam ser acionados.
A mais recente pesquisa Quest divulgada hoje, 6, mostra que a imagem do presidente Lula teve nova queda no nicho evangélico. A rejeição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) entre os evangélicos é de 62%. Esse é o maior patamar desde o início do terceiro mandato do petista. Em dezembro do ano passado, a avaliação do presidente neste grupo era negativa para 56% dos entrevistados.
Conforme o levantamento, a maioria (60%) acha que Lula exagerou ao falar sobre ações de Israel. Para outros 28%, porém, o presidente não se excedeu ao comparar a ofensiva israelense na Faixa de Gaza com a morte de judeus por Adolf Hitler. Essa nova rodada de pesquisas pode também refletir os atos da Paulista em apoio ao ex-presidente que reinflaram o apoio do segmento a Bolsonaro.
Não é surpresa que desde o início do mandato o presidente Lula tenha encontrado maior dificuldade de aceitação entre o público evangélico, já que a resistência vem desde a campanha eleitoral. Os evangélicos apoiaram em peso o então presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL), que se associou a lideranças como o pastor Silas Malafaia e o bispo Edir Macedo.
Em nova tentativa de amenizar o desgaste com evangélicos, no Congresso, o governo corre para aprovar logo a PEC que amplia a imunidade tributária para igrejas. A proposta, aprovada simbolicamente em Comissão Especial da Câmara já semana passada, segue agora para o plenário, onde a aprovação é esperada, apesar de representar uma possível perda de R$ 1 bilhão.
O texto contempla isenção de impostos sobre a aquisição de bens e serviços necessários para igrejas, incluindo reformas. A bancada evangélica pressiona para que a votação ocorra até o final da Semana Santa – 30 de março. O impacto fiscal não é considerado alto, se o governo realmente quiser tentar diminuir o abismo que o separa dos evangélicos.
Resta saber se os privilégios concedidos a igrejas evangélicas, como concessões de emissoras de rádio e TV a grupos neopentecostais, a manutenção de benefícios fiscais, e o espaço concedido a lideranças neopentecostais nos primeiros governos de Lula e Dilma, servem ou serviram para ampliar diálogos ou fundamentalismos.