Administração de Iris Rezende começa a fazer água por todos os lados. Coleta de lixo continua irregular, e o caos nos Cais chega à Maternidade Dona Iris

“Iris Rezende terá que se redescobrir enquanto administrador eficiente e que monta e comanda governos eficazes”

Aos poucos, em meio a uma crescente e surpreendente decepção, a população de Goiânia se estende sobre uma dúvida: o que está acontecendo com o prefeito Iris Rezende? A pergunta faz sentido porque o Iris que aí está nem de longe se parece com o Iris que sempre foi. É verdade que ele recebeu uma herança de papagaios vencidos, fornecedores enforcados pelas dívidas e juros altos da rede bancária, máquina desproporcionalmente inchada e, para completar, teve que negociar no sempre caro e quase nunca totalmente republicano varejinho político para superar a minoria que recebeu das urnas na Câmara Municipal. Tudo isso é inegável. Em outras palavras, é mesmo verdade que Iris Rezende encontrou um paciente moribundo, respirando artificialmente numa UTI desaparelhada. A questão, porém, é que o tal paciente não está reagindo, e o próprio Iris não demonstra qualquer empolgação. Se é possível adjetivar emocionalmente a administração de Goiânia talvez fosse o caso de dizer que ela é só tristeza. Nem mágoa tem. Só tristeza.

Essa situação tem, óbvio, tudo a ver com a falta de dinheiro no caixa da Prefeitura, além das dívidas herdadas. E isso não é somente uma justificativa, mas uma realidade inquestionável. Paralelamente, há ações da coluna de divulgação da Prefeitura nas redes sociais tentando vender uma imagem absolutamente irreal, seja de ações da Comurg, espécie de primeira vitrine do serviço público municipal, seja em atividades sociais. É bobagem nadar contra a correnteza porque quase sempre a realidade vivida pela população supera a irrealidade da imagem falsamente trabalhada. Ou seja, ao invés de colaborar com a melhoria da imagem da administração, a falsidade cria uma frustração maior ainda diante do que a população percebe no dia a dia.

O caso da demissão dos estagiários numa paulada é mais chocante quando se depara com a informação de que Iris contratou para os três primeiros escalões administrativos uma leva de 34 candidatos derrotados nas urnas. Se por si só demitir estudantes em formação é ruim, a sequência da necessidade política de construção da base de governabilidade na Câmara Municipal transforma-se num petardo negativo de vários megatons. A sorte de Iris e da imagem de seu início de governo é que os principais adversários, PT e PSDB, não estão jogando contra abertamente. Ao contrário. O PT se cala porque sabe o estado deplorável em que passou a Prefeitura para o comando do peemedebista, e Marconi Perillo preferiu o caminho da conciliação administrativa, com evidentes reflexos também políticos, com Iris Rezende, apesar de alguns setores de seu partido não gostarem, e até trabalharem contra a convivência pacífica entre eles.

Iris sabe que terá que cortar dramaticamente a máquina que recebeu. Ele já falou sobre isso embora de forma bastante rápida e superficial. A tão sonhada nova temporada do ITU/IPTU, que era percebida como a salvação da lavoura das finanças imediatas da Prefeitura, é absolutamente frustrante diante da grandeza dos problemas e demandas, além do rombo das dívidas vencidas. A maior prova disso é que o governo de Goiânia faz água por todos os lados. O único serviço que funcionou a contento foi a reparação imediata da rede pavimentada. E o quase fim das chuvas deu uma boa contribuição para esse resultado. O resto dos serviços rotineiros prestados pela Prefeitura ficou como estava ou piorou. A Comurg permanece como dantes, sem conseguir equacionar a logística do trabalho elementar de recolhimento de lixo. A situação se agravou de tal forma que se tornou impossível ocultar a realidade diante das montanhas de sacos de lixo amontoados em vários setores da cidade. O presidente e dirigentes da empresa foram obrigados pelas circunstâncias e pela pressão da população a explicitar a dimensão do problema: de uma frota necessária de pelo menos 80 caminhões, a empresa conta com um quarto disso, cerca de 20 caminhões. Não há nem milagre e nem eficácia administrativa que supere esse obstáculo de um dia para o outro.

Aliás, o problema da Comurg não é novo, e também não pode ser creditado ao governo de Paulo Garcia. Ao assumir a Prefeitura em 2004, portanto quatro anos antes de firmar parceria político-administrativa com o PT, nas eleições de 2010, Iris encontrou, o que é natural em se tratando de administrações brasileiras, alguns problemas na empresa. E resolveu mudar a filosofia e a forma da prestação de serviço, abandonando a boa prática adotada desde Nion Albernaz, em meados de 1990, de terceirização da coleta. Ele anunciou uma economia na casa dos quatro milhões de reais com a troca. O lucro é irreal quando se leva em conta que em apenas cinco anos um veículo pesado de coleta de lixo se transforma praticamente numa sucata, conseguindo ainda atender uma área cada vez mais restrita. Foi exatamente a falta de renovação da caríssima frota de caminhões que colapsou a coleta de lixo na administração de Paulo Garcia. O modelo estatal de recolhimento de lixo, portanto, precisa ser repensado, e talvez seja mais proveitoso e econômico retornar ao antigo formato.

E antes que alguém repita a matemática anterior do lucro estatal de quatro milhões, deve-se explicar de onde vem a vantagem da empresa locadora ao prestar o mesmo serviço. É extraordinária a diferença e peso financeiro da administração de uma estatal e de uma empresa privada. E esse é apenas o início de como a iniciativa privada consegue lucrar sem causar prejuízos à maquina terceirizada. Na manutenção, enquanto a empresa tem total liberdade para procurar o melhor preço para peças, e fazer a aquisição delas imediatamente, a estatal move-se a um custo financeiro maior, movimentando mais setores e mão de obra em processos lentos e cheios de regras que desembocam nas licitações. O parafuso da estatal será sempre muito mais caro do que o mesmo parafuso da empresa privada. Por fim, a Comurg só vende seus caminhões quando eles encerram completamente a vida útil, enquanto a empresa monitora o veículo e o repassa imediatamente quando o custo operacional se torna mais caro e a área atendida/suportável diminui. A estatal vende sucata, a empresa vende caminhões usados.

Enfim, Iris Rezende terá que se redescobrir enquanto administrador eficiente e que monta e comanda governos eficazes. Sua boa fama fez dele um veterano vencedor de eleições na capital de Goiás, praticamente imbatível. Mas a questão é que os problemas que ele vem enfrentando explodem diariamente feito pipoca no óleo quente. Se havia inicialmente verdadeiro caos nos Cais, a crise avança por todo o sistema e agora ameaça hospitais, como a Maternidade dona Iris e o Hospital da Mulher. Falta à atual gestão não somente alguma ação que consiga tapar os furos do casco. Falta até reação para que se retire a água que ameaça afundar de vez a Prefeitura, com imprevisíveis consequências no futuro.