Com a crise econômica e as denúncias na Petrobrás, Presidência da República virou passageiro da agonia. Coalizão é a única saída

Dilma Rousseff: obrigada a dividir o poder com o PMDB | Roberto Stuckert Filho/ PR
Dilma Rousseff: obrigada a dividir o poder com o PMDB | Roberto Stuckert Filho/ PR

É a primeira vez em dezenas de anos que um governante eleito não conta com certa blindagem natural nos primeiros meses de mandato. Normalmente, são quatro, cinco, até seis meses de trégua. Somente depois desse prazo é que as cobranças começam a ecoar. A presidente Dilma Roussef, que inaugurou mandato em janeiro deste ano, não teve um só dia de folga. No mês passado, em março, foi o auge, com o registro de manifestações de rua gigantescas. Bem que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentou, com seu messianismo popularesco de sempre, criar uma onda de enfrentamento com seus “exércitos”. Mas não teve jeito. Desta vez, nem Lula e ninguém mais conseguiu reverter a situação, e a popularidade da presidente raspou o fundo do tacho ao registrar insignificantes 7% de aceitação.

Na Câmara dos Deputados e no Senado, o PMDB aproveitou a ocasião para se estabelecer de maneira ainda mais forte na Esplanada dos Ministérios, com direito de livre acesso ao principal Palácio da República, o do Planalto. Foi então que Dilma “piscou”. Não uma, mas várias vezes. E teve que se dobrar diante do vice-presidente da República, Michel Temer.

Se na economia o barco já tinha atracado nos portos mais liberais do país, onde reina a linha seguida por Joaquim Levy, ex-Bradesco, agora a política passou para os braços do comando do PMDB. Os opositores do PSDB e do DEM, em Brasília, satirizaram ao afirmar que a presidente estava terceirizando a Presidência da República: economia com os conservadores, a política com os profissionais.

É, obviamente, uma força de expressão, apenas. Um jogo de palavras. A presidente não terceirizou coisíssima nenhuma. No máximo, estendeu de fato o governo para a proposta de coalizão. Faz sentido. O que não tinha nexo algum era a situação anterior, em que o PMDB, por exemplo, maior partido da base de sustentação do governo, era pouco mais do que espectador privilegiado do jogo.

Essa situação deveria servir para realmente construir essa proposta de coalizão. Ela é mesmo necessária no presidencialismo mitigado como se tem hoje no Brasil. Nos Estados, isso ocorre naturalmente sem maiores problemas. Os partidos se unem, vencem as eleições e depois dividem os bônus. Na Presidência, não. Dilma, mais ainda do que Lula, monopolizava o cenário juntamente com o PT. A partir de agora, e provavelmente sem possibilidade alguma de recuo, o poder será exercido de maneira compartilhada de fato.

O grande problema é que com a falta de uma base de metas nessa coalizão, o que se vê, e em certo sentido a sátira dos opositores tem alguma razão de ser nesse ponto, é mesmo uma abdicação do poder ou pelo menos de boa parte dele. Para se ter uma melhor ideia como se deu isso, basta recordar a ação direta do vice-presidente Michel Temer nas negociações para garantir o governo minimamente no Congresso: a caneta das nomeações passou para as mãos dele. Ele, o vice, e não ela, a presidente, é quem decide o que, para quem e onde. Mais explícito do que isso é impossível.

Qual é a única saída para escapar desse cerco ao Palácio do Planalto? Exatamente a tematização dos limites e obrigações de cada um dentro da coalizão de governo. Não é muito difícil montar uma estratégia político-administrativa como essa antes das eleições. Fazer isso agora é, como se costuma dizer, trocar o pneu furado com o carro andando. No caso do carro da Dilma, tem que trocar não um, mas os quatro pneus arriados de uma só vez.

Há riscos de uma operação como essa dar errado? Claro que há. Principalmente em função do PT. Se o partido não entender que sozinho dificilmente vai conseguir sobreviver no comando e boicotar a tal coalizão, aí o caldo não vai apenas entornar. Vai explodir de vez. Neste momento, Dilma é passageira de toda essa agonia do governo federal, que faz um ajuste fiscal sem cortar gastos e buscando mais dinheiro no bolso da classe média. Ela apenas torce para que os motoristas não errem a mão e conduzam a carruagem para a tragédia. Seria o pior dos mundos. Não apenas para ela, mas para todos os brasileiros.