Uma substância isolada do veneno da aranha caranguejeira Vitalius wacketi, encontrada no litoral do estado de São Paulo, emerge como uma promissora esperança para o desenvolvimento de um tratamento contra o câncer. Essa descoberta é resultado de mais de duas décadas de pesquisa conduzida pelo Instituto Butantan em colaboração com a Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein. Em experimentos realizados in vitro, a molécula derivada do veneno da aranha demonstrou a capacidade de eliminar células de leucemia

A substância pode ser sintetizada pela combinação de duas moléculas previamente identificadas, eliminando a necessidade de extrair o veneno da aranha e tornando o processo mais eficiente. Este método foi elaborado pelo cientista Pedro Ismael da Silva Junior, do Laboratório de Toxicologia Aplicada do Butantan. Ele explica que a réplica do veneno produzida em laboratório é capaz de inibir o crescimento de tumores de maneira semelhante à molécula original presente na aranha.

Um dos principais atributos distintivos desta substância reside na sua capacidade de eliminar as células tumorais por meio de apoptose, um processo de morte celular programada, em vez de necrose. Isso implica que a célula se autodestrói de maneira controlada, sem desencadear uma resposta inflamatória, o que se diferencia do mecanismo adotado por muitos dos tratamentos quimioterápicos atualmente disponíveis.

“A morte por necrose é uma morte não programada na qual a célula colapsa, levando a um estado inflamatório importante. Já no apoptose, a célula tumoral sinaliza ao sistema imune que está morrendo, para que ele remova posteriormente os fragmentos celulares”, explica Thomaz Rocha e Silva, pesquisador do Einstein.

Existem outros métodos no mercado capazes de induzir apoptose em células de câncer, mas são tecnologias que exigem grande investimento e tempo para produção. De acordo com Thomaz, a nova molécula é pequena, e o processo de síntese é muito mais simples e barato, o que pode facilitar o acesso ao produto caso ele chegue ao mercado.

O composto conseguiu eliminar, inclusive, células leucêmicas resistentes a quimioterápicos. O próximo passo dos pesquisadores é realizar testes em células de câncer de pulmão e de ossos. Além disso, a tecnologia será estudada em células humanas saudáveis para confirmar se não há toxicidade, ou seja, se ela é seletiva e danifica apenas as células cancerosas.

Devido ao potencial da invenção, as duas instituições patentearam o processo de produção da molécula. O objetivo é licenciar a tecnologia para uma empresa com capacidade de produzir em maior escala, desenvolver testes em animais e, futuramente, em humanos, caso se prove segura e eficaz.

“Já fizemos um mapeamento de potenciais interessados e estamos em contato com algumas empresas. Isso poderá acelerar o estudo para que ele se torne um produto e possa chegar mais rápido aos pacientes”, pontua o diretor de Inovação do Butantan, Cristiano Gonçalves.”

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