Por A.C. Scartezini

[caption id="attachment_21359" align="aligncenter" width="620"] Petista Devanir Ribeiro: ruim de conta e pressa para dar boa notícia ao governo (Jose Cruz/Agência Brasil)[/caption]
A oposição está se impondo aos governistas na batalha para evitar a aprovação pelo Congresso da nova Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) sem exigir o superávit no fechamento das contas de 2014 — a economia que a Lei de Responsabilidade Fiscal impõe desde sua criação na era FHC para evitar que o governo gaste mais do que arrecada. Nas duas últimas semanas foram duas vitórias oposicionistas.
Na primeira, Dilma estava na Austrália para a reunião do grupo G20. O governo pediu urgência ao Congresso para a LDO. A oposição ameaçou recorrer ao Supremo Tribunal Federal se houvesse urgência. O governo recuou. Na volta de Dilma, os governistas chegaram a declarar a aprovação da emenda que suprime o superávit. A oposição prometeu ir ao tribunal. O governo voltou a recuar.
Assusta o governo a hipótese de recurso ao Supremo quanto ao orçamento para 2015 porque precisa que o Congresso aprove o projeto até 22 de dezembro, quando os congressistas saem em férias. Antes, o governo teria de aprovar a nova LDO. Sem ela, não se vota o orçamento. O Supremo não teria prazo para julgar o recurso e também sairia em férias na mesma época.
Nesse impasse, é duvidosa a eficácia da disposição de Dilma em negociar as posições de aliados no mercado de empregos da Esplanada apenas depois de aprovada a LDO com um texto que não a denuncie por crime de responsabilidade: o não cumprimento da exigência do superávit anual. Nem se fale no vexame de ser a primeira presidente a não conquistar a meta de economia fiscal.
O pior é que o planejamento parlamentar tático falhou nas duas derrotas em torno da aprovação da emenda da LDO. Na primeira, os governistas erraram ao recomendar ao Planalto o pedido de urgência na tramitação. Se aprovada, a pressa apenas travaria a pauta de votação até a urgência ser votada. Seria uma boa contribuição à disposição oposicionista em obstruir os trabalhos.
A segunda tentativa foi tão patética quanto à da semana anterior. No mesmo dia em que Dilma se reuniu com o PT para discutir a crise em geral, o presidente da Comissão Mista do Orçamento, o deputado Devanir Ribeiro, petista de São Paulo, proclamou a aprovação da emenda do superávit. Mas ele estava enganado.
No dia seguinte, a votação foi anulada quando a oposição provou que o gesto do companheiro Ribeiro era um erro aritmético dentro de um equívoco regimental, emoldurado pela ansiedade do deputado em anunciar o êxito de sua operação a favor do governo. Naquele momento, a emenda contava com o apoio de 15 votos. Ainda faltavam três: eram necessários 18 votos.
Os governistas que boicotaram a votação em protesto contra alguma coisa ganharam um argumento precioso: no espaço imenso do Congresso, eles estavam a caminho da sala de votação quando a pressa de Devanir Ribeiro encerrou a coleta de votos. Agora, cabe ao Planalto tentar a sorte pela terceira vez nesta semana.
A presidente? Com uma dose de ingenuidade, Dilma encomendou à equipe uma providência para conquistar votos a favor da LDO um pacote fiscal que deseja anunciar também nesta semana, quando a emenda à LDO retorna ao cartaz. A ideia é reunir um conjunto de corte de gastos que garanta a conquista do superávit primário nas contas públicas do próximo ano.
Seria uma aposta no mercado futuro para os governistas descontentes. No ano que vem, o novo perfil da Esplanada estará desenhado e em operação. Eles estão interessados é no mercado a curto prazo, com demandas e ofertas aqui e agora. O oportunismo político não se interessa por uma declaração de intenções da presidente. Mais valiosa é uma assinatura em nomeação ou liberação de verba.
[caption id="attachment_21352" align="alignright" width="250"] Presidente da Eletrobrás, José Costa Neto: “Vamos parar o País” Agência Brasil[/caption]
Os movimentos se tornaram perceptíveis nos últimos dias. Em busca de salvação para a Lei de Diretrizes Orçamentária sem o superávit primário, ministérios passaram a alertar associações que representam empresas para o risco de o orçamento de 2015 não ser aprovado ainda neste ano pelo Congresso. Com isso, pagamentos seriam atrasados e programas sociais reduzidos.
Sutilmente, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, em vias de se retirar da Esplanada, alertou para a coincidência entre o impasse no orçamento e as prisões de empresários por conta do petrolão e os processos que implicam bloqueio de contas bancárias, multa e restituição de dinheiro arrecadado na pilhagem sobre a Petrobrás.
A construção civil, mais modesta, por exemplo, depende de obras do programa Minha Casa Minha Vida e não dispõe de fôlego para suportar atrasos compridos de pagamento. A Caixa Econômica Federal financia programas sociais e conhece as necessidades de sua clientela. O banco é organicamente enredado com empresas e fregueses da assistência social.
O Ministério da Fazenda vaza informações sobre o congelamento do dinheiro distribuído pelo Bolsa Família, um mês depois de o governo acusar amplamente o presidenciável tucano Aécio Neves de pretende eliminar o programa se fosse eleito. Salários seriam congelados. O salário mínimo seria reajustado no limite da inflação, sem ganho real.
Entre outras coisas, o seguro desemprego e os benefícios da previdência social diminuiriam. Não seriam renovados no próximo ano os pacotes que reduzem a taxação tributária para estimular a produção e o consumo social. A contratação de servidores públicos seria suspensa – não se menciona a redução dos cargos de confiança do governo.
A sério, a presidente Dilma alertou o governador da Paraíba, Ricardo Coutinho, sobre a paralisação de obras públicas por causa da punição a grandes empreiteiras. “O país não pode parar”, afirmou e advertiu sobre as obras de transposição do São Francisco. O governador é do PSB e pode influenciar políticos quanto à LDO e o petrolão.
“Vamos parar o país”, alertou o presidente da Eletrobrás, José Costa Neto, sobre o que pode acontecer se, de uma hora para outra, as empreiteiras e seus trabalhadores suspenderem as atividades como decorrência do petrolão. “Por enquanto, acho que a atuação dessas empreiteiras tem de ser preservada”, recomendou diante de repórteres.
[caption id="attachment_21345" align="aligncenter" width="620"] Governo cogita passar obras públicas para empreiteiras menores Foto: Edson Rodrigues[/caption]
Por causa de encrencas com o petrolão, a presidente Dilma terá de repensar a sua antiga ideia em promover o desenvolvimento com programas como o pré-sal e a concessão de serviços públicos de infraestrutura em escala. Hoje, estão em xeque a Petrobrás e grandes empresas nacionais que poderiam disputar novas concessões, que não deverão sair tão cedo, pelo menos para as gigantes.
Com a crise de confiança, interna e externa, na economia nacional, mais a participação em corrupção, as maiores empreiteiras teriam dificuldade em captar investimentos com o lançamento de debêntures no mercado de capitais. A falta de credibilidade na política fiscal se acentua com a manobra do Planalto para esconder a falta de superávit nas contas públicas.
Há uma ideia na equipe econômica em deixar de lado as oito empreiteiras enrascadas com o petrolão e voltar-se para a presença de empresas abaixo das gigantes na disputa de concessões. Mas é preciso saber se elas receberiam a atenção de bancos para a captação de investimentos e se suportariam pagar juros altos por causa do rebaixamento da nota de risco.
[caption id="attachment_21346" align="alignright" width="250"] Foto: Anderson Pierre[/caption]
A presidente Dilma confiou no poder como uma arma de sedução capaz convencer o banqueiro Luiz Carlos Trabuco a ficar mais perto do Planalto como novo ministro da Fazenda. Depois de todo o cerco ao seu favorito, esperava que ele cedesse. Não cedeu. Pesou em Trabuco a rejeição pessoal ao modo ríspido com que a presidente trata sua equipe em momento de crise.
Quem disse isso foi o próprio Trabuco a íntimos, dias atrás. Poder por poder, ele também o tem como presidente do Bradesco. De sua cadeira pode se entender com qualquer autoridade pública ou privada do país. Conhece bem a casa onde trabalha e nela ascendeu sem depender de gentilezas de políticos ou dos chefes internos.
Porém, a rejeição não foi apenas à pessoa da presidente e à máquina política. O chefe da Casa Civil, economista Aloizio Mercadante, tratou com desenvoltura da adoção de uma nova política econômica desde que se soube que o atual ministro Guido Mantega não ficaria em sua cadeira até o fim do primeiro mandato de Dilma. Trabuco e Mercadante poderiam trombar.

Seja quem for o escolhido, deverá ter paciência suficiente para suportar e, se possível, levar para casa os desaforos da presidente em momentos de tensão

[caption id="attachment_20826" align="alignright" width="620"] Ex-ministra Marta Suplicy: carta de demissão em que critica asperamente a política econômica de Dilma Rousseff | Antonio Cruz/ Agência Brasil[/caption]
Sempre na ausência da presidente Dilma, as manifestações críticas do secretário Gilberto Carvalho e da ex-ministra Marta Suplicy ganharam sequência na quinta-feira numa reunião de deputados do PT. O encontro a portas fechadas era para discutir uma candidatura à presidência da Câmara alternativa ao nome do desafeto e líder do PMDB, Eduardo Cunha, do Rio.
Mas a pauta mudou. O que aconteceu foi a manifestação em série de descontentamentos petistas em relação ao governo. O impulso de oposição dos deputados aproveitou a presença de três enviados do primeiro escalão do Planalto: Aloizio Mercadante (Casa Civil), Gilberto Carvalho (Secretaria Geral) e Ricardo Berzoini (Relações Institucionais).
Na volta a Brasília, Dilma terá um quadro convincente de insatisfações no Congresso, agora reforçada pela volta de Marta Suplicy à sua cadeira no Senado por São Paulo, com mandato por mais quatro anos. A rebeldia da senadora como ministra e autonomia com que opera Gilberto Carvalho estimulam os parlamentares. A presidente não terá como retaliar Suplicy.
Não há dúvida que o impulso de revolta no partido de Lula e Dilma tem a ver com o momento político de negociação da presidente para alinhar seus novos quatro anos de mandato com a redistribuição de posições em troca de compromissos. O problema petista é que o movimento visível nessa ação é de negócios com partidos aliados, como o PMDB. O PT que espere.
Longe do Planalto, a percorrer a Ásia e Oceania, Dilma viveu uma semana atribulada em Brasília, onde até o PT teve surtos de oposição. Agora, de volta ao batente no palácio depois de participar do grupo G-20 na Austrália, a presidente poderá encarar mais de perto os impasses políticos que brotaram em sua ausência.
O que se ouviu na reunião foram pedidos por um ministério “mais qualificado” em representatividade. Entre os 39 chamados ministérios de Dilma, o PT detém 17 posições, mas quer mais. Pediram mais diálogo, ou seja, acesso a Dilma para as reivindicações de cada um.
A plateia vibrou com um discurso em que o deputado gaúcho Paulo Pimenta denuncia a decadência do PT e a atribui à falta de apoio do governo federal. “Como um partido que está há 12 anos no governo perde 19 deputados federais e só elege dois senadores?”, referiu-se às últimas eleições quando o país elegeu 27 senadores, mas o partido não concorreu a todas as vagas.
“Tínhamos 149 deputados estaduais no Brasil e elegemos 109”, continuou Pimenta. Houve perda de protagonismo do PT na formatação e execução de políticas públicas. No PT estamos muito mais expostos para defender o governo nas questões mais difíceis”, queixou-se Pimenta e reclamou de atenção maior a partidos aliados.
Alegou o deputado que “enquanto isso, representantes de partidos aliados que fizeram campanha para Aécio (Neves) e Marina (Silva) estão na ponta da execução de políticas do governo”. Mas Paulo Pimenta não mencionou nomes de aliados. “Somos governo, mas precisamos ter mais protagonismo”, concordou o deputado Jorge Bittar, do Rio.
Lá fora, a presidente Dilma manteve a pose diante dos desafios que recebeu de dois companheiros do seu primeiro escalão no governo ao partir de Brasília rumo à reunião do grupo G-20. Agora, de volta ao trabalho no Planalto, poderá se sentir mais à vontade para enfrentar as críticas do secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, e da ex-ministra Marta Suplicy. Ambos contaram com a viagem da chefe para lançar seus desafios pelas costas. No mesmo dia, Carvalho, considerado olhos e ouvidos de Lula no Planalto, ofereceu a entrevista sobre falhas da chefe na liderança governo. No outro dia, terça-feira, Marta Suplicy, mandou entregar no palácio o seu pedido de demissão no Ministério da Cultura. Dilma ainda não comentou as declarações de Carvalho, a quem costuma ignorar. Na verdade, ao assumir a vaga de Lula em 2011, a presidente manteve o secretário-geral distante de si o quanto foi possível precisamente por ser uma pessoa de Lula infiltrada no palácio para manter o ex-presidente informado sobre a intimidade palaciana. Encarregado da articulação com os movimentos sociais, Carvalho censurou o desinteresse de Dilma pelas demanda dos movimentos. “A reforma agrária e a questão indígena avançaram pouco”, criticou. Afirmou que falta diálogo com a sociedade mais ampla, numa frase um tanto imprecisa: “Deixou de fazer da maneira tão intensa como era feito no tempo do Lula, esse diálogo de chamar os atores antes de tomar decisão, de ouvir com cuidado e ouvir muitos diferentes para produzir sínteses que contemplassem interesses diversos.” O que mais chamou atenção foi o momento em que Carvalho se referiu à crise na economia e à dificuldade de Dilma em se entender com políticos: — Afastou-se dos principais atores na economia e na política. Apesar de tudo, o secretário disse que continuaria no governo se convidado a permanecer. “Preciso trabalhar, eu acumulei experiência”, justificou-se. “Se ela me convidar a ficar no governo, eu vou ficar”, arrematou, num gesto que se pode entender como desafio à demissão pela presidente. Carvalho confia na força junto a Lula. As incertezas da economia foram também o ponto principal da carta de demissão de Marta Suplicy no Ministério da Cultura, com este parágrafo antológico, digno da melhor oposição ao governo: “Todos nós, brasileiros, desejamos, neste momento, que a senhora seja iluminada ao escolher sua nova equipe de trabalho, a começar por uma equipe econômica independente, experiente e comprovada, que resgate a confiança e credibilidade ao seu governo e que, acima de tudo, esteja comprometida com uma nova agenda de estabilidade e crescimento para o nosso país. Isto é o que hoje o Brasil, ansiosamente, aguarda e espera.” Em entrevista sobre a carta, Dilma se mostrou compreensiva em Doha, capital de Qatar, a caminho da Austrália. “Ela não disse nada de errado”, sustentou. Afirmou que já conhecia o conteúdo da carta, que expressaria apenas a opinião da ex-ministra. Se tudo era natural e sabido assim, por que Suplicy mandou entregar a carta um dia depois da viagem da chefe? Ambos, Carvalho e Suplicy, possuem dificuldade no relacionamento com a presidente porque abertamente jogam a favor de Lula. No primeiro semestre, a então ministra patrocinou três jantares, em São Paulo, para engrossar o movimento pela candidatura do ex no lugar da reeleição de Dilma neste ano. Os dois mencionaram as dificuldades de Dilma lidar com a crise na economia que corrói a credibilidade do governo. Isso no momento em que Lula procura influenciar a escolha do ministro da Fazenda com alguma opção extraPT que traga confiança a uma nova política econômica. Mas a presidente não revela tendência a favor de uma nova linha econômica. O bom desempenho do novo governo Dilma é importante à criação de ambiente favorável ao retorno de Lula ao Planalto dentro de quatro anos. Novas trombadas da presidente, entre tanta corrupção, não ajudam a permanência do PT no poder. Inclusive porque a denúncia do petrolão ganhou fôlego para deixar os escândalos em cartaz até a sucessão presidencial em 2018.

[caption id="attachment_20833" align="alignright" width="620"] Vice-presidente: missão de levar a violação da LRF ao Congresso | José Cruz/ Agência Brasil[/caption]
Ao sair de Brasília na tarde de segunda-feira rumo à Austrália com escalas no caminho, a presidente Dilma deixou para a equipe a tarefa de repassar ao Congresso a consumação da violação da Lei de Responsabilidade Fiscal: a aprovação da emenda à Lei de Diretrizes Orçamentárias com a redução da meta do superávit primário para 2014.
Na terça-feira, o palácio enviou o projeto da emenda ao Congresso, onde se notou que faltou ao Planalto pedir urgência na tramitação da peça. Alegou-se que, sem a urgência, não seria possível tocar o projeto com a velocidade adequada. Então, na ausência da chefe, o vice-presidente Michel Temer assinou o pedido de urgência na quarta-feira.
No dia seguinte, Temer pagou mico. Mandou outro ofício ao Congresso cancelando aquele da véspera. Enfim, percebeu-se que a urgência não fazia sentido. Se os congressistas aceitam o pedido, a urgência apenas tranca a pauta, não permite que outros projetos sejam votados antes. Além disso, a oposição ameaçou ir ao Supremo Tribunal Federal se a urgência passasse.
Agora, os governistas esperam votar o projeto na Comissão Mista do Orçamento no meio desta semana. Em seguida, viria votação final no plenário do Congresso uma semana depois. Então, os senadores e deputados teriam um mês para votar propriamente o orçamento do próximo ano antes do recesso parlamentar em 22 de dezembro.

[caption id="attachment_20825" align="alignright" width="620"] Empresários são levados detidos por agentes da Polícia Federal | Reprodução/G1[/caption]
A nova etapa de repressão da Operação Lava Jato desencadeada na sexta-feira pela Polícia Federal dedicou atenção especial aos corruptores, as grandes empresas que pagam propina para ter a Petrobrás em sua carteira de clientes e financiam campanhas eleitorais para serem simpáticas aos políticos.
Com 86 mandatos de prisão foram presos 17 presidentes e altos executivos das principais empreiteiras do país. Elas possuem R$ 59 bilhões em contratos com a Petrobrás. Outro ex-diretor foi para as grades, Renato Duque, que dirigiu Serviços, sempre foi mencionado, mas apenas agora trancafiado, no Rio. Depois levado para Curitiba, como todos.
A permanência do petrolão em cartaz até a próxima campanha presidencial, em 2018, está mais do que garantida. A dimensão do petrolão conhecida até então já era o suficiente para consolidar a longa vida do escândalo e sua repercussão. Vieram, durante a semana outros reforços, além da sétima rodada da Lava Jato.
Entre as novidades, soube-se de duas investigações em instituições federais nos Estados Unidos. A auditoria do Departamento de Justiça e da SEC, principal agência reguladora do mercado de capitais. Eles querem saber se empresas e pessoas do país participaram dos negócios do petrolão.
Na Holanda, o Ministério Público anunciou que a empresa SBM Offshore pagará a multa de 240 milhões de dólares pelas propinas que ofereceu no fornecimento de instalações petrolíferas, como plataformas, à Petrobrás e empresas de Angola e Guiné Equatorial.
A exportação do petrolão multiplica a desconfiança dos mercados doméstico e estrangeiros não apenas em relação à Petrobrás. Atinge o PT que nomeia dirigentes e controla os negócios da estatal desde o tempo de Lula, que deseja voltar a ser presidente. Compromete a imagem internacional de Lula e presidente Dilma.
Agora, quando se pensa na repercussão política de tudo isso nas eleições de 2018, imagine-se o que as novas prisões não renderão em delações premiadas de criminosos. Além do que as antigas prisões já estão rendendo. Pense-se nos políticos que serão processados.
Com toda essa dimensão que o petrolão já assumiu, não é possível interromper o andar da carruagem da apuração de algo perto do qual o mensalão foi fichinha. Carruagem com as rédeas entregues ao aplicado juiz Sérgio Moro, da Justiça Federal em Curitiba, onde estão os presos.
Na volta, agora, ao expediente no Planalto, a presidente Dilma terá de encarar o roubo de dinheiro público na Petrobrás, que a Polícia Federal avaliava, antes da semana passada, em R$ 10 bilhões desde que se instalou o petrolão.
“É o maior escândalo da história do TCU”, anunciou o presidente do Tribunal de Contas da União, Augusto Nardes, no ambiente aberto e livre de uma entrevista coletiva no meio da semana, a partir da avaliação do rombo de R$ 3 bilhões em apuração apenas no superfaturamento de investimentos recentes apurado em processo de auditoria no TCU. O tribunal possui 127 anos, fundado ainda no Império, em janeiro de 1883. O gaúcho Nardes, 62 anos, assumiu um lugar de ministro na casa em 2005, quando renunciou ao mandato de deputado pelo PP no governo Lula. Mas não se suspeita de sua avaliação sobre os anteriores 118 anos do TCU. Os números já eram suficientemente fortes e os rastros de políticos também. A certeza de que houve roubo com a participação de políticos inverteu um processo, veio a certeza de que os acusados serão investigados até o fim. Veja-se Nardes. Ele sempre foi governista, desde que, na ditadura, filiou-se à Arena, em 1970, para se candidatar a vereador em Santo Ângelo. Na cadeira de presidente do tribunal, possui compromisso com a apuração. Sendo um político governista por vocação desde a ditadura militar, Nardes assumiu, em sua declaração sobre o maior escândalo da história do tribunal, a responsabilidade como presidente da casa em tocar severamente a apuração do petrolão. Pelo menos com o seu voto pessoal, que, a maioria governista do TCU poderá derrubar. A evidência despertou o interesse do PT, que deseja indicar o candidato à vaga que se abre na terça-feira, quando o ministro José Jorge se aposenta ao completar 70 anos. Os petistas até fizeram a conta: Lula e Dilma indicaram, juntos, sete ministros com origem política nos aliados. Agora seria a vez de um petista entre os nove ministros do TCU – hoje, apenas dois são técnicos. Os petistas gostariam de colocar na vaga a secretária de Direitos Humanos, Ideli Salvatti, antiga senadora por Santa Catarina, que enfrentou a oposição em defesa de mensaleiros. Tem preciosa experiência e combatividade na área. Os aliados peemedebistas também estão de olho na vaga para se valorizarem a participação no governo recém-reeleito de Dilma. Pensam no senador Vital do Rêgo, derrotado no mês passado na disputa pelo governo da Paraíba. Seria um prêmio a Vitalzinho pela defesa do governo que faz como presidente da CPI Mista da Petrobrás. Levaria a experiência ao TCU.
A presidente assumiu a articulação do novo governo e deixou de lado a função de gerente executiva da administração pública
[caption id="attachment_20169" align="alignleft" width="326"] Guido Mantega, demissionário e sem autoridade, vai a encontro do G20 Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil[/caption]
A presidente Dilma demonstra a ideia de encarar a mudança na economia apenas depois da escolha do novo ministro da Fazenda, coisa para mais adiante. Antes, deseja conhecer Brisbane, na Austrália, no próximo fim de semana. A cidade sediará a reunião do G20, grupo que, por ironia da história, ainda considera o Brasil uma das 20 economias mais fortes do planeta.
Ainda não se sabe se a presidente está disposta a nomear o novo ministro assim que voltar da viagem ou se os despachos com o companheiro Guido Mantega entrarão em dezembro, último mês do atual governo. O atual ministro é outro que deverá conhecer Brisbane, mas que autoridade teria para negociar se todos sabem que ele está com aviso prévio desde setembro?
A própria troca do ministro da Fazenda numa economia em decadência também é tratada pela presidente mais como uma peça de articulação política do que uma providência de gestão federal. A costura política domina a retomada da agenda presidencial há uma semana, desde a volta da praia baiana no domingo. Vejamos.
Na segunda-feira, a agenda ficou em branco, sem anunciar a visita noturna de Lula à residência no Alvorada. Na terça, Dilma foi ao Planalto conversar com o governador do Ceará, Ciro Gomes (Pros), sobre alianças. Na quarta, recebeu líderes do PSD para tratar da base aliada. Depois, pediu ao governador e ao prefeito do Rio, Luiz Fernando Pezão e Eduardo Paes, que tirem do deputado Eduardo Cunha a ideia de ser líder do PMDB.
Ainda na quarta, a presidente encerrou o dia com um programa social, sem conversa política: distribuiu a artistas populares medalhas do Mérito Cultural, coisa dos companheiros que atuam no Ministério da Cultura.
Na quinta, não foi ao Planalto, ficou no Alvorada para confraternizar com companheiros do PT entre vinhos, salgados e doces. O clima de festa com muita gente não permitiu aos petistas comunicarem à companheira o que ela já sabe: eles desejam maior participação no segundo mandato. Na sexta, foi ao escritório à tarde para receber o presidente do Uruguai, José Mujica.
[caption id="attachment_20167" align="alignright" width="620"] Tucano Aécio Neves é alvo de mensagem do PT extravasando o ódio mostrado durante a campanha eleitoral Foto: Wilson Dias/ Agência Brasil[/caption]
Ao avaliar a aprovação da reeleição da presidente Dilma, a burocracia que compõe a executiva nacional do PT editou uma resolução onde sugere que aliados de centro-direita não contribuíram à vitória. Os partidos de esquerda foram mencionados, mas não se falou na centro-direita, caso do PMDB, PP, PSD e PR, que não mereceriam cargos.
O veneno da executiva está no início do extenso documento com 1.766 palavras. Na abertura, o papel considera que o planeta festejou a reeleição, com destaque ao bolivarianismo regional:
— Uma vitória comemorada por todos os setores democráticos, progressistas e de esquerda do mundo e, particularmente, na América Latina e no Caribe.
A seguir, a resolução aponta os inimigos da reeleição na “duríssima” disputa contra o desafiante tucano Aécio Neves:
— Foi uma disputa contra adversários apoiados pela direita, pelo oligopólio da mídia, pelo grande capital e seus aliados internacionais.
Então, o texto, aprovado no início da semana, indica os quatro responsáveis pelo sucesso da reeleição:
“Vencemos graças à consciência política de importantes parcelas do nosso povo; da mobilização da antiga e da nova militância de esquerda; da participação de partidos de esquerda; e da dedicação e liderança do ex-presidente Lula e da presidenta Dilma.”
Bem, os líderes Lula e Dilma não possuem compromisso com a análise e as recomendações da executiva, onde falta autocrítica e sobram autoelogios. Começa que outro órgão da burocracia interna ainda vai discutir a resolução, o diretório nacional do PT, que se reúne no fim do mês – o planeta esteja atento.
Além disso, a palavra final é de Lula e Dilma, que decidirão a composição da nova equipe, com o loteamento da Esplanada. Eles dirão onde termina o presidencialismo de coalização, que inclui partidos de centro-direita; e começa o território da militância, valorizada no documento, no aparelhamento do governo.
Logo no início, o texto com nove páginas revive o ódio com que o PT faz campanha política, que, na realidade do partido, não passa de guerra contra os adversários. Refere-se à concorrência e amaldiçoa a oposição:
“Encabeçada por Aécio Neves, além de representar o retrocesso neoliberal, incorreu nas piores práticas políticas: o machismo, o racismo, o preconceito, o ódio, a intolerância, a nostalgia da ditadura militar.”
Vagamente, o papel acusa “manobras golpistas” contra o novo mandato de Dilma, mas convida os militantes a um golpe no Congresso, uma manobra para derrubar a decisão da Câmara que anulou o decreto presidencial sobre a ação de conselhos populares. “Reverter a derrubada da Política Nacional de Participação Popular”, propõe.
A mais evidente provocação ao confronto não estavano site do PT, mas num texto no Facebook que serve ao partido. “Militância, às armas”, a nota conclamou os amigos e simpatizantes. “Mantenha-se informado em nossos canais e arme-se com argumentos para combater a ignorância nas redes e nas ruas”, e emendou:
— Representantes do atraso, verdadeiros fantasmas do passado, eles tentam criar um terceiro turno na disputa eleitoral ao suscitarem sandices como intervenção militar e até o impeachment da presidenta. Esqueceram que o povo não é bobo.
O povo não é bobo, abaixo a Rede Globo – tudo a ver com a velha palavra de ordem de companheiros nas ruas em manifestações contra a mídia. Nova é a convocação a armar-se nas ruas com argumentos. A violência física é um argumento, como aquele ataque ao prédio da Editora Abril, em São Paulo, no protesto contra a “Veja”.
[caption id="attachment_20149" align="alignleft" width="300"] Petista Humberto Costa desdenha Aécio: “Foi Dilma quem venceu a eleição”[/caption]
O clima de beligerância do PT ao longo da campanha favoreceu a reeleição da presidente Dilma, mas, como se esperava, provocou o nascimento de uma nova oposição mais combativa sob a liderança do senador Aécio Neves, que não seria mais aquele mineiro de trato ameno e discreto.
Aécio mudou e levou a oposição consigo. Na semana em que o PT festejou a reeleição e Dilma teceu acordos políticos, Aécio ressurgiu em Brasília com a força de um novo poder paralelo que emerge de uma derrota presidencial pela frágil diferença de 3,28% dos votos contra a máquina do governo. Não há ponto de retorno ao presidenciável derrotado e ao PSDB.
A força com que Aécio retornou à cena expôs nele uma qualidade que não existia antes da derrota: carisma. Tornou-se um líder de fato a dividir com Dilma e o PT o protagonismo político da semana. Transformou a derrota numa festa que agregou a oposição, a mídia e a opinião pública. Consolidou a falta de espaço para a volta tucana ao que era antes.
A festa da oposição contrastou e enciumou as comemorações do governo renovado para mais quatro anos de poder. Dilma desceu do pódio da vitória e, com toque de ciúme, censurou a festa tucana como se contestasse a reeleição. Ocorreu no discurso ao receber a visita do PSD para conversar sobre participação no novo governo, na quarta-feira.
Quis dizer que a campanha passou e agora é hora de “desmontar palanque” e ensinou que os eleitores julgam as propostas dos candidatos e cabe ao derrotado acatar a decisão:
— Há que se saber ganhar, como há que se saber perder.
Note-se ainda a reação, preocupada, de petistas na sessão do Senado onde Aécio discursou em tom exaltado de oposição. O senador Jorge Viana, do Acre, empregou a mesma imagem do palanque e também ensinou postura:
— Quem ganha tem de descer logo do palanque e governar. Quem perde reluta em descer, mas vai descer. Acabou a eleição.
Outro foi o líder do PT no Senado, pernambucano Humberto Costa, que desdenhou e corrigiu a festa num aparte a Aécio:
— Vossa excelência foi guerreiro, teve uma grande votação, mas a vencedora é a presidenta Dilma.

Menos poderosa, a presidente reeleita deverá repensar os projetos políticos e considerar o diálogo como algo aberto ao compartilhamento de poder