Em 2010, Wilson Cardoso de Melo vislumbrou a oportunidade de empregar suas habilidades no basquete ao participar de um concurso no programa “Caldeirão do Huck”, transmitido pela Rede Globo. Os Harlem Globetrotters são famosos em todo o mundo por sua habilidade em transformar o esporte em um verdadeiro espetáculo, combinando acrobacias impressionantes com a bola de basquete.

O prêmio oferecido no concurso do “Caldeirão do Huck” era a oportunidade de se tornar um Harlem Globetrotter de verdade por um ano inteiro. O vencedor teria o privilégio de participar dos jogos da equipe e viver nos Estados Unidos, com todas as despesas pagas, incluindo um salário. Após demonstrar fintas espetaculares e arremessos precisos, Wilson foi coroado como o grande campeão. Toda a jornada foi transmitida para milhares de espectadores do programa nas tardes de sábado em 2010.

Residente do Distrito Federal, Wilson tomou a decisão de trancar a faculdade e deixar seu emprego para se dedicar completamente à nova vida como um Harlem Globetrotter. Essa escolha o levou a terminar seu noivado, uma vez que teria que se mudar para os Estados Unidos.

Entretanto, sem ter um contrato de trabalho formalizado, Wilson teve o visto negado pela Embaixada dos Estados Unidos, situação que o impediu de participar da equipe. Com isso, de acordo com a advogada Liana Raquel, que representa judicialmente o ganhador do concurso, a Rede Globo ofereceu, em compensação, apenas um salário de R$ 1 mil por 12 meses.

Indignado com a frustração do seu sonho, o brasiliense decidiu processar a empresa de comunicação e aguardou, por mais de uma década, o resultado da ação. Por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Rede Globo foi condenada a pagar mais de R$ 877 mil para o vencedor do Globetrotter Brasileiro, sendo que R$ 681 mil foi por dano material.

Os valores iniciais da indenização foram reajustados com correção monetária. O caso teve baixa definitiva no dia 15 de maio, e a rede de televisão, segundo a advogada, já começou a depositar parte do montante na conta de Wilson.

Argumentação da defesa da Globo

Após diversos recursos no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), o processo judicial referente ao caso foi analisado pelo ministro Marco Aurélio Bellize, do STJ. A defesa da emissora argumentava que a decisão anterior estipulava um valor do dano material que não correspondia ao real dano sofrido pela parte. Além disso, para a Globo, não seria possível presumir que o visto negado a Wilson aconteceu, exclusivamente, pela não entrega do contrato.

Outra questão era que “não foi apontada qualquer conduta culposa ou abusiva da ora agravante [Rede Globo], que foi condenada em razão da solidariedade com a produtora do evento, a sociedade empresária W7 Empreendimentos Artísticos, circunstância suficiente, por si só, para ensejar a redução do quantum indenizatório”. A W7 Empreendimentos Artísticos é a empresa que representa os Harlem Globetrotters no Brasil.

O entendimento era que a Rede Globo se limitou “a promover a publicidade da competição, não tendo contribuído nas causas que supostamente impediram o agravado [Wilson] de imigrar para os Estados Unidos”. A rede de comunicação ainda indicou que a sua responsabilidade jamais se estendeu além da participação de Wilson no programa televiso do Caldeirão do Huck, onde ficou claro que a responsável pelos termos contidos no regulamento era da W7 Empreendimentos.

“A ora Agravante [Rede Globo] em nenhum momento descumpriu o inicialmente pactuado, haja vista que, para a implementação da avença entre o agravado [Wilson] e o time de basquete norte-americano, era necessário aquele ingressar nos Estados Unidos da América”, indicou a defesa.

Decisão do STJ

Segundo o entendimento do STJ, de acordo com as cláusulas do regulamento do concurso, as rés assumiram, de forma conjunta, a obrigação em formalizar a contratação entre o vencedor e o time de basquete. Inclusive, executou todas as fases do concurso dentro de um dos seus programas televisivos, o que denota o viés econômico.

“Além disso, é inegável que, apesar de não apontar os motivos de recusa do visto americano, a falta de um vínculo de trabalho, decorrente da não contratação do embargado, prejudicou de forma grave a referida autorização de viagem”, indicou a decisão do tribunal. Com isso, os ministros da 3ª Turma do STJ, em sessão virtual de 17 de abril, decidiu por unanimidade negar provimento ao recurso da Rede Globo.