Vaca Amarela, Jesus, Maria e a hipocrisia
25 agosto 2016 às 18h31

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Raíssa Martins
Estou tentando entender por que a Igreja Católica e seus fiéis acham que detém o direito de imagem dos seres humanos que escolheram para adorar. Entendo que a imagem de figuras públicas e históricas, como de artistas, políticos, mártires, heróis, vilões e, por que não, de santos, está sujeita às mais diversas interpretações e reproduções, que dependem da subjetividade de cada um que se aventura a representá-las.
Ao invés de cuspirmos regra e tentarmos impor nosso jeito de pensar a quem pensa diferente da gente, proibindo a manifestação artística e intelectual de cidadãos que vivem em um país (teoricamente) regido pela laicidade e pela liberdade de expressão, deveríamos tirar um tempo para refletir e debater sobre a construção das imagens dos santos pela Igreja Católica, por exemplo, e sobre alguns de seus preceitos.
Deveríamos refletir sobre o fato de Deus ter um gênero definido, e desse gênero ser o masculino. Deveríamos tentar entender o fato de Jesus Cristo ter sido (e ainda ser) retratado como um cara de pele branca, traços finos, cabelo loiro e olhos claros, mesmo tendo nascido no Oriente Médio. Deveríamos questionar como uma garota virgem gerou e pariu um filho e como esse filho um dia conseguiu caminhar por sobre as ondas de um mar revolto e transformar água em cachaça.
O que deveria afrontar a nossa fé e nos ofender não é a imagem de Nossa Senhora fantasiada de Malévola, de Galinha Pintadinha ou de Vaca Amarela, e sim os casos de pedofilia encobertos pela Igreja, a obrigatoriedade do celibato, as Cruzadas, a Inquisição, todo ouro e bens do Vaticano que estão lá porque um dia foram roubados, a catequização forçada dos indígenas, a influência da religião na política e, principalmente, as regras retrógradas que todo mundo só finge que segue (ou tá todo mundo esperando casar para transar?).
Fui criada dentro da religião católica, frequentando missa, participando de novena e entrando na fila da hóstia, mas hoje minha fé, que permanece forte, é sincrética e sem regras. Nunca li a Bíblia, sou fã do Bhagavad Gita e tenho uma Aparecida tatuada no braço. Ignoro as imposições, incorporo pensamentos e filosofias de outros credos que fazem mais sentido, agradeço pela vida e tento, sempre que possível, fazer o bem.
No mais, sou louca pra ter uma escultura da Santa Blasfêmia na minha casinha, assim como uma Marilyn Monroe de Andy Warhol e um Neymar de Romero Britto.
Raíssa Martins é jornalista