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Para associação, atual gestor vem promovendo ações anti-indígenas e sucateamento da entidade que comanda

Sede da Funai: órgão passa por crise interna após morte de Bruno Pereira e Dom Phillips | Foto: Divulgação

Servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai) anunciaram que vão entrar em greve a partir de quinta-feira, 23, em todo o País. A manifestação vem no contexto da morte do jornalista Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira, servidor licenciado do órgão e que então trabalhava para a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Unijava).

Há duas motivações para a movimentação, segundo a associação de servidores da fundação Indigenistas Associados (INA): a primeira será manifestar “profunda tristeza e indignação pelo assassinato bárbaro” de Bruno e Dom, além de exigir a identificação e responsabilização de todos os culpados.

A segunda é exigir a saída imediata do presidente do órgão, Marcelo Augusto Xavier da Silva, que, segundo a INA, “vem promovendo uma gestão anti-indígena e anti-indigenista na instituição”. “Por uma Funai indigenista e para os povos indígenas! Pela proteção das/os indigenistas, dos Povos Indígenas e de suas lideranças, organizações e territórios! Convidamos as/os parceiras/os indígenas, indigenistas e da sociedade em geral para o Ato Nacional de Greve da Funai!”, diz o comunicado, divulgado nas redes sociais da associação.

https://www.instagram.com/p/Ce9D3xJLvtS/

A nota também afirma que a fundação promove perseguição a servidores e lideranças indígenas, somada a uma militarização de cargos estratégicos e a esvaziamento de quadros da entidade. Além disso, apontou esvaziamento orçamentário, assédio institucional, alinhamento com a agenda ruralista e omissões na esfera judicial.

A nomeação de Xavier como presidente do órgão, em julho de 2019, é apontada no documento como uma forma de alinhar a Funai a interesses ruralistas. O servidor, que é delegado da Polícia Federal, já provocou a abertura de um inquérito pela PF para investigar um procurador federal que atua na própria Funai e que elaborou um parecer jurídico a favor dos indígenas.

O presidente da Funai acusou o procurador Ciro de Lopes e Barbuda de apologia do crime, e essa iniciativa resultou na abertura de inquérito pela PF no Distrito Federal. O Ministério Público Federal (MPF), porém, discordou da existência do procedimento e apontou crime de constrangimento ilegal na iniciativa.

Na mesma linha, já houve notícias-crime contra Sonia Guajajara, coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), e contra o senador Fabiano Contarato (PT-ES), que denunciou atos contra indígenas. Os dois procedimentos foram arquivados.

Reportagem da Folha de S.Paulo mostrou que a Funai tem hoje seu menor quadro de funcionários permanentes desde 2008, ao mesmo temo em que vê pedidos para abertura de concursos públicos negados.

Documentos mostram que apenas 4 em cada 10 cargos do órgão estão atualmente ocupados. De um total de 3,7 mil postos, cerca de 1,4 mil têm servidores permanentes em atividade, enquanto o restante encontra-se vago —soma-se a isso um contingente de 600 trabalhadores temporários, contratados após uma ordem do Supremo Tribunal Federal (STF).

Ouvidos sob condição de anonimato, servidores da Funai afirmam que a falta de recursos é hoje um dos maiores obstáculos para a atuação do órgão, o que inclusive dificultou as operações de busca de Bruno Pereira e Dom Phillips.