Na capital das ruas numeradas, vias com nome de pessoas são quase incomuns em Goiânia. Mesmo assim, alguns ilustres que dão nome às vias são desconhecidos do cidadão de hoje, apesar de terem feitos grandiosos no passado. Em um país de memória curta, vale (re)lembrar algumas dessas pessoas imortalizadas nas placas e endereços.

Um desses exemplos é a rua que passa ao lado da Praça do Sol leva o nome de João de Abreu, que foi governador de Goiás entre os anos de 1936 e 1937. Ele também foi deputado federal, entre 1946 e 1959, e vice-governador, de 1959 a 1961. Foi vereador e prefeito de Arraias (TO), na época cidade goiana e também vereador por Goiânia. Foi ainda advogado, professor de Economia Política, dentista e servidor público.

O ex-governador José de Abreu | Foto: Câmara dos Deputados

Se formou no Liceu de Goiás, onde fez o equivalente ao Ensino Médio. Na faculdade de Odontologia do Rio de Janeiro, se tornou odontólogo em 1911 e terminou os estudos de advocacia em 1925 na Faculdade de Direito de Goiás.

Foi ainda chefe de polícia, professor da Faculdade de Odontologia e da Escola de Comércio de Goiás; procurador da Fazenda Pública, secretário de Finanças e Segurança Pública; secretário da Fazenda; secretário da Junta Comercial, diretor do Departamento de Economia do Estado de Goiás, presidente do Conselho Penitenciário e do Conselho de Economia de Goiás.

No site da Câmara Federal, inclusive, a grafia do seu nome aparece como João D’Abreu. Nasceu em Santa Maria de Taguatinga (na época território goiano, hoje no Distrito Federal) e morreu em 1976.

Atílio Correia Lima

Já a avenida que abriga do Detran Goiás tem o nome do primeiro urbanista formado do Brasil. Seu trabalho mais famoso foi o plano urbanístico de Goiânia. Como paisagista, trabalhou para a família Matarazzo, em São Paulo, para a família Marinho, no Rio de Janeiro e fez o jardim da Granja Comary, em Teresópolis (RJ). Morreu aos 42 anos, em um acidente aéreo no Aeroporto Santos Dummont.

Jamel Cecílio

Agora quem passa pela avenida Jamel Cecílio a caminho do shopping, do Centro Cultural Oscar Niemeyer, do autódromo ou dos condomínios fechados, pode não saber, mas trafega por uma rua que tem o nome de um empresário, pecuarista e deputado federal: Jamel Cecílio. Como político, ajudou a implantar o Distrito Agroindutrial de Anápolis (DAIA).

Ricardo Paranhos, além de político, também era escritor

Outro exemplo é a rua de um dos endereços mais nobres de Goiânia, que leva o nome de Ricardo Paranhos. Ele foi deputado estadual (1891 a 1894) e senador (de 1901 a 1908 e de 1913 a 1916). Sobrinho dos deputados estaduais Alfredo e Álvaro Paranhos, é o patrono da cadeira n.º 22 da Academia Goiana de Letras. Escreveu quatro livros: O Crime de Catalão; Os Canibais; Repiques e Badaladas; e Sátiras e Humorismo. Nasceu em Catalão (1866) e morreu em Corumbaíba (1942).

Couto de Magalhães, o político visonário

Já no Setor Pedro Ludovico, tem a Alameda Couto Magalhães, que desemboca no Parque Areião. Em texto publicado por Hélio Rocha no Jornal Opção, o jornalista traz uma breve biografia de Couto de Magalhães, “uma das figuras mais importantes da história de Goiás”, na visão dele. Isso porque Couto, político e empreendedor, queria implantar um sistema de navegação fluvial unindo Goiás e Pará, por meio dos rios Araguaia e Tocantins. José Vieira Couto Magalhães era mineiro – nasceu no município de Diamantina, em 1837, e morreu em 1898.

O que determina que alguém seja imortalizado como nome de rua?

A arquiteta e urbanista, professora da PUC Goiás, Lana Jubé, explica que para que alguém seja imortalizado como nome de rua, primeiramente, precisa estar morto. “Também é preciso ter relevância histórica para a cidade, Estado ou país”, completou. Segundo ela, geralmente, grandes avenidas, desde quando um loteamento é aprovado, já dão nomes de pessoas importantes para a História.

Para Lana, que é doutora em Arquitetura e Urbanismo, mudar um nome de uma rua que já é muito conhecida, é muito difícil. “Pra mudar o nome da Avenida 85 é muito complicado. Envolve todo o comércio da via, que precisa alterar a documentação”, explicou. Além disso. É preciso justificar a mudança de forma fundamentada, revelando a importância histórica do homenageado.

No ano passado, a Câmara Municipal aprovou a mudança do nome da Avenida Castelo Branco, que passaria a chamar Agrovia Iris Rezende Machado. A Avenida Castelo Branco tem 7,6 km de distância e a estimativa é que, só nela, existam mais de 600 lojas, sendo referência no mercado de produtos agropecuários em Goiás.

No entanto, apesar da sanção do prefeito Rogério Cruz (Republicanos), a Justiça suspendeu a alteração do nome da via. Na decisão, a juíza Jussara Cristina Oliveira Louza, destacou que a alteração teria um grande impacto social e que poderia “acarretar confusão de referência de localização, além de impor gastos aos residentes e comerciantes do local”, avaliou.

Apesar do poder judiciário ter barrado a alteração, Lana Jubé afirma que a mudança seria positiva. “Iris Rezende é muito mais importante para a história de Goiânia do que Castelo Branco. Até porque hoje, com a revisão da história, um ditador não seria alguém que mereceria esse tipo de homenagem”, avaliou a professora.

Ditadores dares nome a ruas e avenidas não é exclusividade de Goiânia e isso, na visão da urbanista, se dá por conta do processo histórico que construiu o Brasil, privilegiando as elites em detrimento da grande massa da população.

A (falta de) lógica dos números nas ruas

Voltando à particularidade da capital de Goiás no quesito ruas que são nomeadas com números, a urbanista critica a falta de ordenamento com que isso foi feito em Goiânia. “A numeração tinha que estar ligada ao lugar em que cada rua se encontra, deveria seguir uma lógica. Por exemplo, as ruas ímpares vão num sentido, as ruas pares em outro”, exemplificou.

E ela tem razão: no mapa da capital, muita coisa não parece fazer sentido. Por exemplo, descendo a Avenida Goiás rumo à Praça do Trabalhado, no início até vai vem: a via cruza com as ruas 1, 2, 3 e Anhanguera. Logo na sequência, passa pelas ruas 4, 5, 6 e Paranaíba. A partir daí, a falta de lógica impera.

Continuando descendo pela Avenida Goiás, a próxima rua a ser cruzada é a 51. Ou seja, a numeração pula 45 números e segue como se nada tivesse acontecido. Não bastasse isso, depois da 51, a próxima rua com que o cidadão se depara antes de chegar na Avenida Independência é a 61. Ou seja, um salto de mais dez números.

Outro exemplo dado pela urbanista fica no Setor Jaó, em que as ruas são numeradas, acompanhadas pela letra J. “Historicamente, o bairro foi ocupado por imigrantes da Alemanha que fugiram do nazismo. Essas ruas acabaram tendo essa formatação para que fosse mais difícil descobrir o endereço”, explicou.