Além do discurso à lá Goebbles, ministro da Propaganda do nazismo, o agora ex-secretário especial de Cultura quer domesticar a produção artística

Alemães na exposição Arte Degenerada: sucesso de público | Foto: Reprodução

Na trilogia sobre o Terceiro Reich, o historiador britânico Richard Evans relata o plano dos nazistas de conquistar “corações e mentes” de todos os alemães arianos. Para tanto, era preciso controlar a educação, os esportes, a imprensa e a arte. Não só: era fundamental produzir conteúdos que reforçassem o espírito da revolução nazista, de forma que o pensamento e os sentimentos de todos se tornassem homogêneos e não houvesse dissenção no nacionalismo.

Artista frustrado (por não ter sido aprovado pela Academia de Belas-Artes de Viena), Adolf Hitler teve a oportunidade de se vingar ao ascender ao poder absoluto, depois de assumir poderes absolutos com chanceler e führer (líder) da Alemanha.

Em julho de 1937, o presidente da Câmara de Artes Plásticas do Terceiro Reich inaugurou a exposição de “Arte Degenerada”. Eram mais de 600 obras de artistas como Picasso, Matisse, Segall, Ernst e outros, que não seguiam a cartilha naturalista defendida pelos nazistas. Os degenerados (um conceito que abrangia artistas que rejeitavam traços harmônicos e a “perfeição”) eram, enfim, todos aqueles que não se expressavam da forma que os nazistas desejavam esteticamente.

O que os líderes nazistas não esperavam, como normalmente acontece quando governos tomam esse tipo de decisão, é que a exposição fosse um sucesso: mais de 2 milhões de alemães foram vê-la. A saída, em 1938, foi queimar obras de arte consideradas impróprias para o regime.

Ao lançar um concurso nacional de artes, o ex-secretário especial de Cultura do governo Bolsonaro, Roberto Alvim, entrou em um pântano perigoso, recebendo críticas inclusive de gente muito próxima do ideário do atual governo. Além de praticamente reescrever um discurso do ministro da Propaganda de Hitler, Joseph Goebbles, em um vídeo que também esteticamente remete ao nazismo, inclusive com Wagner ao fundo, o próprio Prêmio Nacional das Artes revela seu intento de “purificar” a arte brasileira – ao menos a que recebe incentivos governamentais.

Nas palavras de Alvim, a “nova” arte nacional um “cinema sadio ligado aos nossos valores”. Ele defende uma “cultura dinâmica”, “enraizada na nobreza de nossos mitos fundantes”. Os nazistas também aspiravam ao resgate dos mitos supostamente germânicos. O ex-secretário especial da Cultura de Bolsonaro escorrega, aqui, duas vezes: na tentativa de domesticar a arte e no esquecimento que os “mitos” fundantes do nosso país não são lá muito nobres.