Quarta-feira, 12 de julho, o relógio marca 8h28, esse é o momento em que chego no Abrigo Lar do Animais do Instituto Transformare, na região noroeste de Goiânia. O local é uma chácara simples rodeado por árvores. Na porta um pedido: “Não jogue lixo. Não abandone animais”.  

Quem me recebe é a dona Mônica Aquino. Aguardo cerca de 20 minutos para conseguir me apresentar. A protetora de animais não para de receber telefonemas sobre uma intimação para desocupar o local que serve de abrigo para acolher mais de 700 animais resgatados das ruas ou de situações de maus-tratos. Percebo também algumas ligações pedindo resgate.  

“Não atendo mais número que não conheço, é mais um pedido de resgate. Não consigo, é muito difícil para mim”, desabafa. No momento, percebo mais de 2 mil mensagens no Whatsapp, em sua maioria pedidos de ajuda.

Portal do Abrigo Lar do Animais do Instituto Transformare | Foto: Stéfany Fonseca

Desocupação

Com aluguéis atrasados, o proprietário do imóvel entrou com uma ação judicial solicitando a desocupação do local por falta de pagamento. O pedido foi deferido e deveria ser cumprido voluntariamente até esta quarta, 12, às 8h. De acordo com o processo, os aluguéis não são pagos desde janeiro de 2022, o valor devido é de R$ 40.555,20.

“Ontem às 23 horas e 18 minutos, eu recebi uma mensagem do prefeito Rogério Cruz dizendo que o procurador-geral do Município entraria no processo de despejo tentando retirar o processo e encaminhar para uma negociação na qual nós não precisaríamos ser retirados com 700 animais do abrigo”, relata Mônica, nitidamente abatida.

O Ministério Público de Goiás (MPGO) solicitou em caráter de urgência à Justiça, em ação contra a Prefeitura de Goiânia, um suporte para a retirada dos animais que estão no Lar. O promotor de Justiça Juliano de Barros Araújo pediu ao Município que garanta um local provisório e adequado para realocar os animais.

Mônica reconhece o problema, porém alega que o proprietário nunca regularizou a área, e esse é um dos motivos pela falta de pagamento. Além dos altos custos para manter os animais.

“O prazo do contrato se excedeu em dezembro. O proprietário quer a área para vender”, afirma.

Desocupação voluntária

Conforme assessoria do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO), “não há nos autos expedição de mandado de despejo para o Instituto”. “O que existe e que pode estar confundindo a parte é um mandado de citação e intimação para desocupação voluntária. Mas não há ainda mandado de despejo”.

Conforme o tribunal, existe também uma ação civil pública que exige medidas da prefeitura para proteção de animais. “Nessa ação, o MPGO, ciente da questão do abrigo, fez a juntada de pedido de tutela incidental para que se encontre uma solução para esses animais, mas o pedido ainda não foi analisado”, finalizou.

O Lar

“Esse abrigo com 700 animais, custa mensalmente sem vacinas e sem clínicas e sem exames R$ 200 mil reais mensais. A nossa necessidade é ter 15 funcionários aqui. Eu preciso de gente aqui 24h por dia”, relata ao dizer da dificuldade para cuidar dos bichinhos.

Durante nossa conversa, Mônica recebe uma ligação e precisa sair. Fiquei no local com um rapaz que ajuda a cuidadora com os gatos e cachorros. Durante a caminhada pelo abrigo, é possível observar cachorros de varias raças e tamanhos.

Cachorros do Lar | Foto: Stéfany Fonseca

Alvoroçados, foi assim que os amigos de quatro patas me receberam. Para organizar os animais, é feita uma divisão. São por macho e fêmea; castrado ou não; doente ou não; os dóceis, os mais bravos e os novatos de casa. Além disso existe a dinâmica de limpeza do ambiente; alimentação e o principal, afeto.

O que diz a Prefeitura de Goiânia

Procurada pelo Jornal Opção sobre a ameaça de despejo dos animais do abrigo Lar dos Animais, a Prefeitura de Goiânia declarou o que segue:

“Diante do fato em que a Prefeitura de Goiânia não foi notificada, aguarda, portanto, a decisão judicial. E apesar disso, a Amma e o Centro de Zoonoses seguem reunindo com equipes da Procuradoria-Geral do Município, para tomar medidas que auxiliem de forma legal a manutenção do cuidado dos animais e até suspenda a liminar, em diálogo com o judiciário e o Ministério Público.

  • A Amma e a SMS participam de reuniões com os abrigos e o Ministério Público, a fim de aprimorar as políticas públicas para auxiliar os espaços de acolhimento a se regularizarem na capital, com adequação exigida, para garantir que os animais sejam sempre bem acolhidos.
  • Quanto aos fatos, o município de Goiânia não é parte na ação de despejo, pois o abrigo é particular e não público. Desta forma, o município não foi intimado pelo judiciário para cumprimento da liminar.
  • Quando foi intimada da liminar de despejo, a ONG apresentou recurso solicitando a participação do Ministério Público e do município no processo. O requerimento apresentado pelo Instituto Transformare ainda não foi julgado pelo judiciário.
  • A Amma reforça que garante políticas públicas voltadas para o bem-estar animal. Neste ano, iniciou a castração de animais de famílias de baixa renda, a fim de promover o avanço das políticas públicas de controle populacional de animais.
  • Além disso, a Amma incentiva a posse responsável de animais, tendo em vista que são seres vivos e, ao adotá-los, o cidadão se responsabiliza por todo o cuidado necessário para a qualidade de vida e bem-estar.”

Secretaria Municipal de Saúde (SMS) e Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma) – Prefeitura de Goiânia

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