General Augusto Heleno Ribeiro: “Golpe de novo seria estupidez” | Foto: Antônio Cruz/ABr
General Augusto Heleno Ribeiro: “Golpe de novo seria estupidez” | Foto: Antônio Cruz/ABr

As articulações da reserva militar pelo aniversário do golpe de 1964 se calaram nas redes sociais desde que, na terça-feira, o governo anunciou a abertura dos centros de violência contra os direitos humanos no Exército, Marinha e Aeronáutica.

Estranhamente, não se abriram as portas às investigações aos serviços de inteligências das Forças Armadas, nos quais se realizou a coleta de informações que ofereceu material humano à prisão, tortura e assassinato de oposicionistas. O ministro da Defesa, Celso Amorim, anunciou a abertura, mas se negou a informar sobre a inteligência, onde Dilma não quis se meter.

Se entrasse na área, o Planalto teria mais problemas, pois o silêncio dos agitadores militares não significa rendição. Digamos que trata de uma pausa para reflexão nas manifestações. Não passagem dos 50 anos do golpe notou-se que a agitação em torno da ocasião não foi restrita aos que foram contra o golpe ou exigem punições dos algozes dos direitos humanos.

A turma que defende a ditadura também marcou presença na manifestação em dimensão nacional. É possível afirmar que a articulação do grupo surpreendeu e tornou-se visível porque a turma se expôs, mostrou a cara. Considere-se que ela não é tão voluntária como a militância política de esquerda, nem tão jovem.

Num dos eventos do outro lado em Brasília, a maçonaria providenciou, a título de ilustração histórica, uma palestra do general reformado Augusto Heleno Ribeiro, ex-comandante da Amazônia e da força de paz das Nações Unidas no Haiti. Ele encampou a tese de que não é mais possível, no país, dar golpe como antigamente.

Em resposta a uma pergunta do público, o general Heleno, com veemência, desestimulou a hipótese de uma nova intervenção militar. “Seria uma estupidez porque o mundo hoje é outro”, reagiu. “É uma coisa insensata, não tem o menor sentido.” Afirmou que hoje há democracia no país, que, “com todos os defeitos, é o melhor regime”.

Esse comportamento militar, ao contrário do que se pensa na academia de estudos políticos, não indica que, no Ministério da Defesa, os comandos do Exército, Marinha e Aeronáutica cederam a pressões da opinião pública, ativistas dos direitos humanos ou Comissão Nacional da Verdade. Tem mais a ver com a disciplina funcional, além da possibilidade de não se cumprir a missão como foi determinada.

Nem repitam acadêmicos que a abertura dos centros de torturas e assassinatos em nome da defesa da ditadura é acatada pelos três comandos militares como uma oportunidade para o serviço da ativa se isolar do pessoal da reserva, onde se feriram os direitos humanos e se faz a agitação política livre da disciplina do pessoal em atividade.

A ativa e a reserva são mais coesas do que a academia pensa. Entre ambas, há o mesmo receio de que a abertura de centros de violência seja apenas o preâmbulo da revisão da anistia, a abrir caminho para processos judiciais que responsabilizem e punam militares, inclusive em casos individuais. Não adianta a presidente Dilma se dizer contra a revisão. Na ótica militar, ela é suspeita.

A criação da Comissão Nacional da Verdade se deu na era Dilma e a pressão da criatura e seus apêndices sobre a criadora chegou agora à investigação de instalações onde ocorreram violações dos direitos humanos de presos políticos. Se a presidente se reeleger, ela poderá se sentir autorizada a um passo adiante.

A família militar, digamos assim, não se sente segura quanto ao tempo presente e menos ainda em relação ao futuro. A pausa deste momento na agitação da reserva — estimulada pela ativa, registre-se — poderá recuperar energia na corporação para a campanha eleitoral a partir de uma estrutura de ação que já se exibiu nos últimos dias.

Afinal, o que significa a abertura dos centros? Nada mais de que militares investigarão a si mesmos, sem a participação de civis, muito menos de vítimas e seus representantes. Cada comando com a sua sindicância interna para apurar o tratamento a presos políticos a partir de documentos que já teriam desaparecido nos serviços de inteligência.

A apuração se limita a sete instalações militares distribuídos por quatro capitais estaduais: São Paulo, Rio, Belo Horizonte e Recife. Porém, ocorreram torturas e assassinatos realizados em endereços não oficiais que eram invisíveis ao público, como a trágica ou fantasmagórica Casa da Morte, em Petrópolis. Como diria o mensaleiro Delúbio Soares, nesses endereços informais ocorreram crimes não contabilizados. As informações levantadas estarão incompletas.