O chega pra lá de Dilma em Lula abre espaço para a oposição e outros petistas na sucessão
02 janeiro 2015 às 15h16
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A emancipação da sucessora deixou o ex sem ter olhos e ouvidos no Planalto que o informem sobre o que se passa na intimidade presidencial
Ao refugiar-se por quatro dias no litoral baiano, a presidente Dilma se isolou do PT naquele momento em que deveria anunciar a escolha de novos ministros do partido. A manobra incluiu o isolamento de Lula, que perdeu o secretário-geral Gilberto Carvalho e ficou sem ter quem seja seus olhos e ouvidos ao redor da sucessora.
Começa que Dilma retirou do palácio dois companheiros paulistas próximos a Lula, Carvalho e Ricardo Berzoini. O segundo, removido da Secretaria de Articulação Institucional, que se entende com políticos, para o Ministério das Comunicações, com a função de servir os petistas com o desengavetamento do projeto de controle da mídia.
No lugar de ambos, dois companheiros inexpressivos, mas gaúchos, como Dilma se adotou, Miguel Rossetto e Pepe Vargas. O primeiro, coordenador da campanha da reeleição, na Secretaria-Geral. O segundo, na articulação com políticos. Ambos, sem maior ligação com Lula, embora Rossetto fosse ministro do Desenvolvimento Agrário no governo dele.
Restou um paulista no palácio, o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, a quem Lula faz restrições porque considera o companheiro autossuficiente, alguém que pensa apenas em si próprio. Mercadante conta com Dilma para se fortalecer no governo e no partido e, com o afastamento de Lula, deve usar a Casa Civil para irrigar sua candidatura presidencial em 2018.
A divisão do PT é previsível não apenas porque Dilma isolou Lula do poder. A troca de ministros do partido agora feita pela presidente descompensou o antigo equilíbrio entre as correntes internas do PT na distribuição de posições. Rossetto e Vargas, por exemplo, representam um grupo minoritário, Democracia Socialista (DS), contra a supremacia da Construindo um Novo Brasil (CNB).
Os companheiros se queixam de que Dilma entregou o poderoso Ministério da Educação ao ex-governador cearense Cid Gomes, do inexpressivo Pros. Mas há a possibilidade de que Gomes, instalado na Esplanada, peça transferência para o PT. Ele já foi do PMDB, PSDB, PPS e PSB. Não custa nada ter um sexto partido. Se for para o PT, não se aliará a Lula e pensará em 2018.
A redistribuição de poder feita pela presidente deve estimular a competição entre as correntes petistas pela conquista de posições no segundo escalão, o que pode acentuar as divisões internas entre os companheiros. Lula poderia pagar a conta se tornando mais fraco no partido, o que já é fato desde que a companheira presidente não o prestigiou.
O isolamento entre o criador e a criatura (como Lula gosta de dizer para desgosto da sucessora) se evidenciou desde que a candidata boicotou o que ele mais queria, com os olhos em 2018: assumir a coordenação da campanha dilmista. Seria uma forma de influir não apenas na campanha, mas também no governo que viria com a reeleição.
Recordemos que, em março, Lula irrompeu no Alvorada com um grupo de ilustres petistas e praticamente se autoinvestiu como coordenador. Trouxe de São Paulo até o fotógrafo que fez aquela foto onde ele e Dilma, reunidos em torno de uma mesa da biblioteca do palácio, ficaram em pé e cruzaram os punhos como símbolo de um pacto. Não era. A candidata ignorou.
Mais tarde, em agosto, Lula tentou bloquear a emancipação da afilhada. Mandou dois recados por porta-vozes informais. O primeiro veio quando o companheiro Carvalho admitiu que não continuaria na Secretaria-Geral. No segundo, o presidente do PT, Rui Falcão, confirmou, em entrevista a ideia do ex em ser sucessor da sucessora:
“Precisamos eleger a Dilma para o Lula voltar em 2018. Isso significa que, ela, reeleita, começa o ciclo de debate, de planejamento para que o nosso projeto (de poder do partido) tenha continuidade com o retorno de Lula, em 2018, que é a maior segurança eleitoral de que o projeto pode continuar.”
Abertamente, Falcão afirmou que um segundo mandato de Dilma seria necessariamente melhor do que o primeiro porque ela “aprendeu muitas lições”. Uma delas seria a de aumentar a presença de Lula no governo. Nessa versão, ex-presidente não teria sido protagonista até aquele momento apenas porque desejou, espontaneamente, não ofuscar a sucessora.
Antes de captar o distanciamento da presidente, Lula se sentia à vontade para se meter no palácio. Em 2011, ela não tinha um ano de governo quando foi à França e ele reassumiu o governo na prática, por telefone. Pela manhã, ligou para Carvalho e reclamou uma reação contra a avaliação brasileira pelo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), das Nações Unidas.
“O governo precisa reagir”, queixou-se Lula, porque o Brasil avançou apenas uma posição em avaliação feita pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Entre os 187 países avaliados, o bem-estar dos brasileiros ficou em 84º lugar, conforme o noticiário do dia visto pelo ex no apartamento em São Bernardo.
Surpreendido, Carvalho, levou a queixa à então chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que à tarde se reuniu com a ministra do Desenvolvimento Social, Tereza Campello. A seguir, Campello convocou uma entrevista coletiva para comunicar a resposta ao Pnud: a pesquisa teria usado dados defasados. Aqueles seriam de 2006.