Negros são maioria entre os candidatos a vereadores no Entorno, mas ainda enfrentam discriminação racial
09 setembro 2024 às 18h44
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Hellen Lopes – repórter do Jornal Opção Entorno
No pleito municipal deste ano, entre as 12 cidades da Região Metropolitana do Entorno, mais da metade dos candidatos a vereadores dos municípios analisados se autodeclaram pretos ou pardos. Ou seja, dos 2.570 concorrentes, 1.483 se declaram pardos e 385 pretos. O levantamento feito pelo Jornal Opção Entorno baseia-se em informações do Portal de Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) referente às cidades de Águas Lindas, Cidade Ocidental, Cocalzinho, Cristalina, Formosa, Luziânia, Novo Gama, Padre Bernardo, Planaltina de Goiás, Santo Antônio do Descoberto e Valparaíso de Goiás.
O município com maior índice de candidatos negros – pretos e pardos – é Luziânia, com 235. Já o menor número é de Cocalzinho, com 81 candidatos. Novo Gama, por sua vez, traz a maior quantidade de candidatos pretos, com 56 registros.
Discriminação racial e ataques pessoais
Em busca da reeleição, Neném da Civil, do Partido Progressistas (PP), é um dos 32 candidatos a vereadores que se declaram pretos em Santo Antônio do Descoberto. “Atualmente, eu sou o único vereador preto em uma Câmara com 15 vereadores. Fui criado pela minha mãe, estudei em escolas públicas, tenho TDAH e sou o único vereador com quatro cursos superiores: Direito, Psicologia, Contabilidade e Gestão Pública”, disse o candidato.
Para ele, ainda há muito a ser feito para que mais pessoas negras ocupem espaços de poder. Entre os desafios, segundo ele, está a elaboração de um projeto político nacional sob a ótica da população negra brasileira. “Muitos candidatos negros enfrentam discriminação racial, que pode se manifestar em ataques pessoais, deslegitimação de suas propostas e estigmatização pela sociedade. Esses desafios são complexos e interligados, e precisamos superá-los para promover uma representação mais equitativa na política”, declarou Neném da Civil.
Na opinião do vereador Abadyas Damasceno (União Brasil), que também busca reeleição na Câmara de Vereadores de Águas Lindas de Goiás, apesar do aumento das candidaturas de pretos e pardos, essa participação ainda é muito tímida. “A representatividade vem crescendo ao longo dos anos, o que é importante para mostrar que o negro tem a capacidade de fazer gestão pública em todas as áreas, realizar grandes projetos na política e inspirar outras pessoas”, disse ele.
Abadyas aponta a desigualdade financeira entre os principais problemas que precisam ser superados para alcançar a equidade racial. “Um dos desafios que o negro tem na vida pública é essa desigualdade financeira, e não a intelectual. O negro tem que provar que ele é capaz todos os dias”. O cenário ainda fica pior com a aprovação da PEC da Anistia. De acordo com projeções do Pacto pela Democracia, iniciativa que reúne mais de 200 organizações da sociedade civil, as candidaturas negras vão deixar de receber R$ 1,1 bilhão nas eleições municipais devido à nova regra.
Representatividade racial e cotas
Na avaliação de Aline Karina, uma das coordenadoras do Núcleo de Base Mulheres Negras PT Brasil e Plenária Negra, a representatividade das candidaturas negras nas mídias não é hegemônica. “Temos um número expressivo de candidatos negros nas eleições, mas a gente não vê e não sabemos quem são essas pessoas. Então, a gente precisa de mídia, de tempo de TV ou de um marketing mais avançado para visibilizar essas candidaturas”, indagou a coordenadora.
Ela enfatizou, ainda, que a cota para negros é um importante instrumento para reduzir a desigualdade social no país. “As cotas para os candidatos são de extrema importância, porque a gente ainda não superou a desigualdade racial e social no Brasil. Então, para podermos superar essa desigualdade, é necessário que a gente equipare e equilibre essa balança com essas cotas”, disse.
Durante conversa com o Jornal Opção Entorno, Aline Karina criticou a anistia a partidos políticos que deixaram de financiar candidaturas de pessoas pretas e pardas nas eleições. “Um dos maiores desafios da representatividade racial e de gênero é a questão econômica, porque a gente precisa de recursos para as nossas candidaturas. Em agosto, foi aprovada a PEC da Anistia, que perdoou os partidos políticos de não repassarem os 30% do fundo eleitoral. É um absurdo vermos candidatos negros fazendo vaquinha, sendo que tem R$ 5 bilhões no fundo para investimentos”, questionou.
Ao abordar o movimento negro, ela ressalta as conquistas alcançadas. “O movimento social negro é organizado, o Núcleo de Base Mulheres Negras PT Brasil e a Plenária Negra, que eu atuo, vem dessa luta histórica do movimento. No entanto, sabemos que precisamos avançar e um dos pontos é justamente ocupar espaços de decisão. Nós temos o direito de ser candidatas, de votar, de ser votadas, pois a política é uma forma de visibilidade, existência de exaltar a nossa potência”, frisou Aline, destacando alguns nomes de candidatas a vereadoras no Entorno, como Maju Rocha, de Planaltina de Goiás; Linda Abadia, de Novo Gama; e a Professora Nilza, de Formosa.
Percentual de candidaturas de pessoas negras
Águas Lindas de Goiás
Candidatos a vereadores: 299
Parda: 184 (61,54%)
Preta: 39 (13,04%)
Cidade Ocidental
Candidatos a vereadores: 190
Parda: 111 (58,42%)
Preta: 25 (13,16%)
Cocalzinho de Goiás
Candidatos a vereadores: 108
Parda: 73 (67,59%)
Preta: 8 (7,41%)
Cristalina
Candidatos a vereadores: 200
Parda: 111 (55,5%)
Preta: 32 (16%)
Formosa
Candidatos a vereadores: 316
Parda: 168 (53,16%)
Preta: 49 (15,51%)
Luziânia
Candidatos a vereadores: 331
Parda: 198 (59,82%)
Preta: 37 (11,18%)
Novo Gama
Candidatos a vereadores: 257
Parda: 136 (52,92%)
Preta: 56 (21,79%)
Padre Bernardo
Candidatos a vereadores: 137
Parda: 81 (59,12%)
Preta: 26 (18,98%)
Planaltina de Goiás
Candidatos a vereadores: 243
Parda: 147 (60,49%)
Preta: 38 (15,64%)
Santo Antônio do Descoberto
Candidatos a vereadores: 216
Parda: 118 (54,63%)
Preta: 32 (14,81%)
Valparaíso de Goiás
Candidatos a vereadores: 273
Parda: 156 (57,14%)
Preta: 43 (15,75%)
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