Um casal morre de mãos dadas no Estados Unidos e prova que morrer não dói em uma situação: quando a gente vai embora levando na bagagem quem a gente gosta

Casal de idosos morre de mãos dadas nos EUA. Foto: Reprodução | DailyNews
Casal de idosos morre de mãos dadas nos EUA. Foto: Reprodução | DailyNews

“Morrer não dói”, disse Caio Fernando de Abreu pra mim. Disse pra mim, foi sim. Eu sei. Eu ouvi a voz meio rouca no meu ouvido dizendo baixinho um grito: “morrer não dói”. Sim, eu acredito. E foi acreditando nisso que continuei proseando com o escritor falecido. “Penso ser um fardo, essa tal morte, só pra quem continua em terra. Encarnado na carne, na falta, na saudade, ou seja, na paz e na guerra”, declarei. Lembro-me mal dá primeira morte que chorei. Acho que era um tio meu, na verdade eu nem sei, só lembro que sentia falta e o defunto lá, esticado na sala. Tenho certeza que ele sua ausência nem notava. “Morrer é entrar em outra”, era o Caio respondendo.

E uma manchete no jornal vai me lembrando de outros tempos. De outras que entrei. Falava de um casal que morreu, lá nos Estados Unidos. Pois é, já vem uma ironia atrás da orelha, quem diria, lá onde o povo é tão desunido, desamigo. Caio, a manchete era linda, falava de uma morte, mas não havia agonia ou coisa amarga, pois a causa era “a hora chegou” e mais nada. Ele tinha 83 e ela 82. Juntos os dois viveram 60 anos. Um no outro e uma vida na outra entrelaçada.

Foi uma coisa meio engraçada, esquisita, assim, acho que isso todo mundo já esperava, pois como disse,  a idade era avançada. Os dois se amavam, ele dizia que morreria do lado dela, Caio. Falando assim parece até que é inventado. E assim, quando viu que ela já ia embora, chamou o médico, o filho e sua nora e disse: preciso ver sua mãe. Estou morrendo, eu preciso vê-la.

Daí, Caio, levaram ele para o lado dela, deixaram os dois no mesmo quarto. Uma coisa romântica, igual quando chega na peça o último ato, sabe? Ele levantou a mão e encostou nela, sem muito alarde sentiu seu tato, trocaram juras de amor, de calor e acho que aconteceu um “até mais tarde”, pois logo que ela morreu, Caio, o estado de saúde dele foi piorando. A vida foi se juntando na cama e não dava mais pra segurar. Morreu. E olha Caio, foi tanta beleza que dizem que nem doeu.