O linguista estadunidense Noam Chomsky, de 93 anos, fez críticas ao modo como o PT tem feito suas campanhas. Um dos principais aspectos é a ausência da ocupação de espaços públicos por seus apoiadores, enquanto o presidente Jair Bolsonaro (PL) reúne multidões por onde passa.

A esquerda brasileira, ele relembra, já foi marcada justamente por essa presença ostensiva em grandes manifestações de rua. “Não basta artistas do seu lado, ou acadêmicos, é preciso sair às ruas e se organizar para realmente ter forças populares reais ali”, diz. “A gente conversa com as pessoas, e as pessoas não sabem que se beneficiaram dos programas que o Lula criou, não sabem que ele foi o responsável por seus filhos poderem entrar na faculdade, por terem conseguido abrir um pequeno negócio. É Deus, é sorte, ou algo assim. Não o PT.”

Chomsky deu o depoimento à rede BBC. Nela, também faz uma comparação entre o PT e o Partido Democrata dos Estados Unidos, que teria se afastado do trabalhador e da população mais pobre, “abraçando” agendas neoliberais e perdendo a “conexão histórica com seu eleitorado”.

Para ele, esse processo teria aberto espaço para que a “direita radical” conseguisse capturar essa fatia do eleitorado. Chomsky aponta também o que chama de “falta de capilaridade de base do PT e da esquerda brasileira” como fundamental para explicar o êxito da propagação de fake news contra o candidato, o partido e a esquerda de modo geral durante a campanha.

— Se você tivesse um partido político ou qualquer organização geral defendendo os trabalhadores e os pobres, eles poderiam reagir a isso na base, via organização local. Os democratas não têm. E acho que não existe nada parecido no Brasil. O PT simplesmente não está se organizando na base, no chão de fábrica — explica. — Eles precisam começar a se organizar entre a população em geral. Não basta ter artistas do seu lado, ou ter acadêmicos, é preciso sair às ruas e se organizar para realmente ter forças populares reais ali.

Chomsky considera que pautas como o aborto e o armamento civil são “estratégias diversionistas” para desviar o foco dos mais pobres em relação às políticas econômicas. Para o linguista, “o pior crime de Bolsonaro é destruir a Amazônia”, o que pode pôr em risco a sobrevivência da humanidade.

Ele vê paralelos entre a política nos EUA e no Brasil, incluindo pesquisas eleitorais que não medem com exatidão o desempenho de populistas de direita ou o risco de acontecer algo como a invasão do Capitólio nos Estados Unidos, em 6 de janeiro do ano passado, quando apoiadores de Donald Trump, derrotado nas urnas, tentaram impedir a certificação da vitória de Joe Biden. “Bolsonaro fez declarações alegando possíveis fraudes tão extremas que a comunidade diplomática internacional se opôs fortemente. Então eu acho que eles vão se abster desse tipo de movimento. Mas é perfeitamente possível que eles possam replicar o 6 de janeiro. Lembre-se, o 6 de janeiro chegou muito perto de um golpe e só não o foi porque meia dúzia de pessoas decidiram diferente.”