Há 26 anos, depósito do Césio-137 era inaugurado e ainda hoje é referência em segurança e estudos

15 julho 2023 às 08h33

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O depósito que recebeu os rejeitos do acidente radioativo do Césio-137, ocorrido em Goiânia em 1987, foi inaugurado em cinco de junho de 1997, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. O Parque Estadual Telma Ortegal (Peto), onde o depósito está situado, é conhecido não apenas pelos dois morros artificiais e perfeitamente simétricos cobertos por grama seca e cascalho, mas também pelos seus 165 mil hectares de extensão, cercados pela vegetação seca do cerrado. Além disso, o parque abriga um museu, um auditório e instalações de pesquisa, como o Laboratório de Radioecologia, o Laboratório de Radioproteção e um Centro de Informações, com objetos e aparelhos relacionados à radiação.

Entre o acidente e a inauguração do depósito definitivo, 10 anos depois, as remessas de objetos contaminados como tijolos, telhas, madeira, areia e outros materiais de construção, roupas, utensílios domésticos e material hospitalar, os itens ficavam estocados em um local provisório. Os rejeitos estão acondicionados em cilindros de aço ou cimento, tambores de aço, com 4 milímetros de espessura.

A peça que continha a cápsula de Césio-137, vazada de uma máquina de radioterapia foi concretada dentro do prédio da Vigilância Sanitária para depois ser levada para o depósito. Ela havia sido levada em um saco de linhagem pela esposa de Devair Alves Ferreira, dono do ferro-velho onde a peça havia sido vendida pelos dois catadores.
Monitoramento e controle
A área do depósito do acidente radioativo será monitorada por técnicos da comissão durante mais 24 anos, totalizando um monitoramento de 50 anos. Esse período de monitoramento é considerado suficiente para detectar possíveis falhas no projeto e vazamentos radioativos, uma vez que parte dos resíduos continuará apresentando atividade radioativa por até 300 anos ou mais. O engenheiro civil Alex Fabiano destaca que o reflorestamento do parque contribuiu para ampliar a fauna local e que o local é responsável pelo controle institucional e controle radiológico ambiental das áreas afetadas pelo acidente e que foram descontaminadas.

A cada três meses, são realizadas análises da água subterrânea, águas de superfície, vegetação e sedimentos. Esses dados são coletados e analisados pelos técnicos do Programa de Monitoramento Ambiental (PMA) de Rejeitos Radioativos do CRCN-CO. Os resultados das análises são incluídos em um relatório anual encaminhado a órgãos como o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Ministério Público.
Resistência e segurança
Apesar de inicialmente enfrentar resistência por parte da população local, o Centro Regional de Ciências Nucleares do Centro-Oeste (CRCN-GO), onde o depósito está instalado em Abadia de Goiás, tornou-se uma referência no alojamento de materiais radioativos, inclusive reconhecido pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Embora ainda existam preocupações com a segurança, especialmente por parte dos pais e mães dos alunos que visitam o parque, é enfatizado que testes regulares no solo e na água são realizados e que nenhuma anomalia foi detectada até o momento.
Pesquisa e educação
Além do monitoramento ambiental, o CRCN-GO desempenha atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação na região Centro-Oeste em colaboração com diversas instituições. O centro também mantém um programa educacional que inclui palestras e atividades com alunos e empresas, visando promover o uso seguro e benéfico das tecnologias nucleares.

O acidente com o Césio-137 em Goiânia
Era setembro de 1987, e Goiânia se via imersa em um cenário de perigo silencioso. Enquanto a cidade se preparava para receber o Campeonato Mundial de Motovelocidade, um acidente devastador estava prestes a acontecer. Tudo começou quando dois catadores de recicláveis, Roberto Santos e Wagner Mota Pereira, encontraram uma peça intrigante em um prédio abandonado. Sem saber da terrível ameaça que carregava, levaram-na para um ferro-velho, onde o proprietário, Devair Alves Ferreira, também se encantou com o brilho misterioso emitido pela peça.

Os dias passaram e aqueles que tiveram contato com o objeto começaram a adoecer. Vômitos, febre, diarreia e perda de cabelo assolavam suas vidas, enquanto a causa permanecia um enigma. Foi então que um físico renomado, Walter Mendes Ferreira, foi alertado sobre os sintomas alarmantes. Desconfiando do impensável, ele decidiu investigar a presença de radioatividade. Com um detector em mãos, a confirmação chocante veio à tona: o césio-137, elemento altamente perigoso, estava presente.
A notícia se espalhou rapidamente, alcançando as autoridades competentes, inclusive a Comissão Nacional de Energia Nuclear. Uma operação de emergência foi montada, envolvendo mais de 700 profissionais da saúde e especialistas em radiação. A área contaminada foi isolada e os contaminados foram removidos para receber tratamento médico adequado.
Assistência às vítimas e medidas de descontaminação
Para descontaminar as pessoas afetadas, foram adotados métodos como banhos mornos com sabão neutro, aplicação de ácido acético para tornar a substância radioativa solúvel, uso de dióxido de titânio e lanolina nas áreas mais contaminadas, além de métodos abrasivos para a pele. Luvas e botas plásticas com resinas de trocas iônicas foram utilizadas.
Os pacientes foram isolados no Hospital Geral de Goiânia, com áreas específicas para proteção radiológica, quartos e monitorização para detecção de contaminação residual. Medidas terapêuticas foram adotadas para eliminar o material radioativo do organismo e minimizar os efeitos, incluindo exercícios físicos, banhos de sol e medicamentos para acelerar a eliminação do césio-137.
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