O governo federal tem endurecido o tom contra o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) depois que terras da União sofreram com invasões orquestradas pelo grupo. Mesmo assim, há quem cobre do governo federal o mesmo empenho com a questão das ocupações ilegais de terra quanto o que tem com relação à invasão das sedes dos Três Poderes no dia 8 de janeiro.

No último sábado, 16, o MST invadiu uma área da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) na cidade de Petrolina, em Pernambuco. Em nota, o movimento informou que a invasão seria “mais uma ferramenta de denúncia e pressão para realização da Reforma Agrária” e que foi “uma forma de sinalizar que a Embrapa deveria estar desenvolvendo projetos de pesquisas para a Agricultura Familiar e Camponesa”.

Mas a ocupação não foi vista com bons olhos pelo governo federal. O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, avaliou a invasão às terras da Embrapa como “inaceitável”. “Sempre defendi que o trabalhador vocacionado tenha direito à terra. Mas à terra que lhe é de direito. O agro produz com sustentabilidade e se apoia nas pesquisas e todo o trabalho de desenvolvimento promovido pela Embrapa”, condenou em sua conta pessoal no Twitter.

Para o ministro, que classificou o ato do MST como criminoso e negacionista em sua rede social, atentar contra a Embrapa – que, para ele, é um dos maiores patrimônios do país -, “está muito longe de ser ocupação, luta ou manifestação”, mas atentar contra a ciência e a produção sustentável.

Área da Embrapa ocupada pelo MST em Pernambuco | Foto: MST

Câmara trabalha para endurecer leis contra invasões de terra

Na Câmara do Deputados, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) está empenhada na proteção do patrimônio e já protocolou um pedido de instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para se opor ao que chama de maior onda de invasões de terra no Brasil nos últimos 15 anos.

Dados divulgados pela Frente, com base em relatórios de governos estaduais, contabilizam 41 ocupações ilegais nos primeiros três meses de 2023. Só em Goiás, teriam ocorrido duas invasões, sendo o sexto Estado com maior número de terras invadidas neste ano.

Para a deputada Marussa Boldrin (MDB), que faz parte da frente, “as invasões de terras são um problema que não atinge só o produtor”. “Abre um precedente perigoso para toda a sociedade”, alertou a parlamentar, que acredita que invadir terras é “um crime que leva à insegurança jurídica e risco produtivo, o que impacta da geração de empregos até a chegada da comida na mesa”.

Atualmente, pelo menos seis projetos que tratam o tema tramitam na Câmara. Entre eles, está o projeto de lei 149/ 2003, que há 20 anos tenta classificar como terrorismo atos violentos contra propriedades públicas e privadas. Outra proposta em discussão é o PL 8262/2017, que pretende permitir a ação da polícia sem a necessidade de ordem judicial para a retomada de propriedades invadidas.

Durante todo o mês de abril, a Frente realiza a Campanha de Combate às Invasões e tem utilizado as redes sociais para denunciar ocupações ilegais de propriedade rurais em todo o Brasil, alertando para os prejuízos que esse tipo de ação causa. “Invasões de terras geram impactos negativos para a economia do país e, consequentemente, para a população. Afinal, nessas áreas são produzidas grande parte dos alimentos que chegam a mesa dos brasileiros e também do mundo”, diz o texto de uma das postagens.

Historicamente, a FPA sempre se posicionou a favor do direito à propriedade privada e contra todo e qualquer tipo de invasão de terra. Atualmente, os parlamentares da frente trabalham para aumentar as punições para invasores, criminalizando atos desse tipo em nome da paz no campo e da segurança alimentar ao resguardar as terras destinadas à produção de alimentos.

Superintendente do Incra em Goiás é indicação do MST

Por pressão dos movimentos sociais, no início do mês, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) trocou o comando regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em sete Estados e Goiás é um deles. Até então, ocupavam essas posições nomes indicados durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) e os nomeados foram pessoas que teriam respaldo do MST.

Patrícia Cristiane, da direção nacional do MST, confirmou o apoio do movimento a Elias D’Angelo Borges na superintendência do Incra em Goiás. Mas ela ressalta que é também uma indicação de todos os movimentos da luta pela terra no Estado. “Ele é uma pessoa que tem acúmulo na questão da reforma agrária, sabe das demandas e sabe também construir coletivamente saídas pra esse imbróglio que está tendo no Estado”, defendeu.

Há quase um mês, mais de 600 famílias ocuparam a Fazenda São Lukas, no município de Hidrolândia, com o objetivo que a propriedade seja destinada para a reforma agrária. De acordo com o MST, a área é da União desde 2016 e antes a propriedade pertenceria a um grupo criminoso, condenado em 2009, pelos crimes de exploração sexual e tráfico internacional de pessoas.

600 famílias invadiram fazenda em Hidrolândia – GO | Foto: MST

Segundo o MST, atualmente 1.500 famílias vivem em acampamentos em Goiás. Além de Hidrolândia, existem ocupações em Catalão, Formosa, Ipameri, Jataí, Morro Agudo, Piranhas e Santa Helena. O Estado já soma mais de três mil assentamentos regularizados.

Mas, para um dos coordenadores do MST em Goiás, Lucas Prates, mesmo com o atual governo federal sendo progressista, ainda há muitos entraves para a questão da terra no país. “Tem crescido massacres, perseguições e assassinatos. Existe uma concentração de propriedades nas mãos de poucos e violência do campo, a perseguição policial, a criminalização dos movimentos sociais e suas lideranças é uma realidade”, explicou.

Além disso, para Lucas, a Justiça tem dado reintegração de posse com muita rapidez sem considerar a fundo cada questão. “O Judiciário atua numa linha repreensiva, que coíbe as ocupações. Se a gente ocupa uma área na sexta-feira, na segunda já tem decisão para reintegração de posse sem analisar direito o mérito da questão”, reclamou.