Estado foi o sétimo a decretar estado de calamidade financeira e conseguiu, por meio de liminar no STF, se enquadrar às exigências do RRF. PEF é alternativa caso a entrada no regime não seja aceita

Muito se fala sobre uma crise financeira generalizada entre os Estados brasileiros e que tem conduzido as entidades federativas com maior arrocho a buscarem ajuda junto à União em um acordo chamado Regime de Recuperação Fiscal, o RRF. No entanto, grande parte da população ainda não consegue entender o que seria esse modelo e quais implicações ele traria para o orçamento estadual.

Outra solução apresentada pelo Governo Federal, mas com menos efeitos, seria o Plano Mansueto ou o Programa de Equilíbrio Fiscal (PEF). Qual seria a diferença entre eles e qual a melhor solução para ser adotada pelo Estado de Goiás, que anunciou já no começo do mandato do governador Ronaldo Caiado (DEM), em janeiro do ano passado, a previsão de um rombo de R$6 bilhões nos cofres públicos, em 2019, que conseguiu ser controlada?

RRF

Defendido pelo governo estadual e pela secretária da Economia, Cristiane Schmidt, o RRF ganhou aprovação no Congresso Nacional em 2017, por meio da Lei Complementar 159. Ele teria vindo para fortalecer a Lei de Responsabilidade Fiscal, fornecendo aos estados com crise acentuada financeira as ferramentas necessárias para remediar a situação.

Segundo o Tesouro Transparente, do Governo Federal, “o desequilíbrio financeiro é considerado grave quando a Receita Corrente Líquida (RCL) anual do Estado é menor do que a Dívida Consolidada ao final do último exercício; quando o somatório das suas despesas com pessoal, juros e amortizações é igual ou maior que 70% da RCL; e quando o valor total de obrigações é superior ao valor das disponibilidades de caixa. Assim, só poderá aderir ao RRF o Estado que cumprir esses três requisitos de entrada.”

Goiás foi o sétimo a decretar calamidade financeira. Antes dele, Roraima, Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul também haviam publicado decretos da mesma natureza. Quando pediu socorro ao Governo Federal, Goiás não tinha certeza se se enquadrava em um dos três requisitos exigidos pelo RRF: sobre a receita corrente ser menor que a dívida consolidada líquida. De acordo com a Secretaria de Economia do Estado, o governo anterior teria deixado uma herança de R$1,8 bilhão em salários de funcionários atrasados do mês de dezembro, R$1,8 bilhão em contratos com fornecedores e apenas R$11 milhões no caixa.

Mesmo assim, a resposta da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), do Ministério da Economia, por meio de relatório, foi de que Goiás não atendia aos critérios para adesão ao RRF e que sua nota era C na avaliação de capacidade de pagamento (Capag). Por meio de uma liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Goiás conseguiu a suspensão por seis meses dos pagamentos de seis empréstimos garantidos pelo Tesouro e a devolução de valores bloqueados ou descontados, caso tenha ocorrido execução ou bloqueio de contragarantias.

Secretária da Economia, Cristiane Schmidt /Foto: Felipe Cardoso/Jornal Opção

Em dezembro de 2019, durante oitiva na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Incentivos Fiscais, na Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (Alego), a secretária justificou seu apego a alternativa do RRF. “Continuaríamos com a nossa dívida suspensa e podendo ter crédito para nos ajustarmos mais rapidamente. Podemos ficar sem o RRF? Podemos, mas a dor do povo vai perdurar por mais tempo, porque os 7 milhões de goianos vão continuar sem os serviços que deveriam estar tendo e não tem dinheiro para fazer os investimentos. Tão simples quanto isso”, afirmou aos deputados presentes.

“Os investimentos que estamos fazendo são pelas vias federais. O capital político do nosso governador é tão alto que ele chega em Brasília e consegue junto ao Bolsonaro e vários ministros trazer dinheiro para cá e fazer os vários investimentos, senão não conseguiríamos fazê-los. Precisamos recuperar nossa capacidade de investimentos justamente para poder devolver à população tudo que ela merece”, declarou Schmidt na Casa de Leis.

“O cálculo  da STN desconsidera a Despesa de Exercício Anterior (DEA) e riscos a pagar, além desses R$3,2 [positivos no orçamento], a gente tem R$1,8 bi [receita extraordinária de depósito judicial] que veio de uma receita que não vai ser permanente. Ainda, temos uma dívida [R$250 milhões/mês] que não estamos pagando mensalmente, porque está suspensa caso não entremos no RRF”, explicou a secretária, posteriormente, em coletiva à imprensa.

Em artigo escrito pela própria secretária, ela observa: “O curioso é que a origem da crise de todos os estados é similar: concerne à folha de servidores (ativos e inativos), às renuncias e às vinculações”, escreveu. “Como ‘não existe almoço grátis’, uma vez que os custos de entrada no RRF são maiores do que os do PEF, os benefícios do RRF também são maiores do que os da PEF”, continuou.

Entre os sacrifícios em que os Estados têm que se submeter pelo RRF, está a aprovação de leis dentro de um pacote de econômico, com objetivo de manterem o orçamento organizado e polido. Goiás já deu os primeiros passos com a aprovação na Alego de leis como a Reforma da Previdência estadual, o Estatuto do Magistério e do Servidor e a LOA. Além disso, o Estado poderá passar por aumentos de impostos e privatizações. Em troca, ganha a suspensão temporária da dívida, como já citado na fala de Schmidt, e a “garantia da União de que o Estado poderá pegar emprestado no mercado um montante expressivo”.

PEF

Já no PEF, Goiás teria a responsabilidade de pagar uma dívida de cerca de R$250 milhões mensais para a União. O PEF não suspende temporariamente os pagamentos. “Valor similar ao seu déficit da previdência. É um montante significativo no fluxo de caixa do Estado”, diz a secretária em seu artigo. O Plano Mansueto é a alternativa defendida por diversos deputados que ainda não vêem necessidade do Estado adentrar ao RRF. Um dos que ainda não se mostraram convencidos, é o presidente da Alego, o deputado estadual Lissauer Vieira (PSDB).

Deputado estadual, Lissauer Vieira (PSB) / Foto: Fábio Costa/ Jornal Opção

“Respeito a opinião da secretária, mas vejo o Regime de Recuperação Fiscal como um remédio muito amargo para todos os setores. Inclusive para o governador, que terá sobre a batuta dele pessoas do governo federal, da Secretaria do Tesouro Nacional, a conduzir a gestão do governo. Isso não é viável, na minha opinião. Não é saudável para o Estado de Goiás. Precisamos repensar e rever isso”, falou em entrevista recente ao Jornal Opção.

“Como disse anteriormente que era contra o Regime de Recuperação Fiscal, mas a favor de fazer ajustes. E estamos fazendo esses ajustes. Tudo que falei estamos cumprindo. Estou junto com o governo, lado a lado, para poder fazer os ajustes necessários. Mas o Regime de Recuperação Fiscal ainda não estou convencido de que seja o melhor caminho”, declarou Lissauer.

No PEF,  o valor do empréstimo do Tesouro é reduzido e liberado em parcelas anuais. Em 2019, a STN anunciou o valor máximo de R$ 10 bilhões para os 15 Estados elegíveis (CAPAG C ou D). Para Cristiane, o RRF é mais aconselhável, porque “permite um ajuste mais célere, reduzindo o custo para a minoria privilegiada e aumentando o beneficio para a maioria”.

Em nota da STN, ficaram esclarecidas as regras para os estados comprovarem que estão aptos a cumprirem com suas obrigações financeiras: “privatização de empresas e utilização dos recursos para quitação de dívidas; redução dos incentivos tributários; extinção de benefícios aos servidores estaduais ou municipais não previstos para os servidores públicos federais; adoção do teto dos gastos; eliminação das vinculações de receitas de impostos não previstas na Constituição; criação de conta única similar à da União; adoção de medidas voltadas à prestação de serviço de gás canalizado; e adoção do modelo de concessão para os serviços de saneamento básico.”

O fato é que alguma das medidas terá que ser adotada para que o equilíbrio fiscal seja estabelecido no Estado.