“Fui vítima de uma prisão arbitrária”, diz médica Bianca Butterby
16 dezembro 2025 às 17h18

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A médica Bianca Borges Butterby afirmou ter sido vítima de uma prisão arbitrária, de exposição pública indevida e de um processo criminal que terminou arquivado por inexistência de crime.
Em entrevista ao Jornal Opção, ela detalhou os impactos emocionais, profissionais e físicos sofridos desde a investigação iniciada a partir da denúncia de uma única paciente. Ela diz que toda a investigação começou após a insatisfação de uma paciente com os resultados do tratamento de emagrecimento.
“Foi a partir da denúncia de uma única paciente. Não é que ela não tenha emagrecido, mas não emagreceu o tanto que queria. E a gente sabe que isso não depende só do médico”, afirmou.
A médica relatou que, a partir dessa denúncia, foi deflagrada uma ação conjunta envolvendo Polícia Civil, Vigilância Sanitária e outros órgãos. “Isso culminou nesse episódio trágico que eu venho enfrentando até hoje”, disse.
Bianca afirmou que foi chamada à delegacia sob a justificativa de prestar depoimento, sem saber que havia contra ela um mandado de prisão. “Todo mundo já sabia que eu estava sendo presa, menos eu. Já havia um vídeo sendo gravado dentro da clínica falando da minha prisão”, relatou.
Segundo ela, o vídeo foi feito por integrantes da Polícia Civil. “O vídeo foi feito pelo delegado Humberto Teófilo. Quando cheguei à delegacia, tentaram me algemar. Eu perguntei o que estava acontecendo, porque eu estava ali para prestar depoimento”, disse.
Em seguida, recebeu voz de prisão pelo suposto exercício ilegal da medicina. “Isso não fazia sentido, porque eu sou formada pela UFG, tenho CRM e minha clínica é regularizada.”
Internação, algemas e sequelas
Após passar horas detida, Bianca passou mal e precisou ser hospitalizada. “Fiquei seis dias algemada ao leito do hospital, pelo tornozelo. Foi um sentimento indescritível, uma mistura de revolta com vergonha”, contou. Segundo ela, tentou esconder as algemas com o lençol para não ser vista.
Durante a internação, desenvolveu complicações graves. “Tive pico hipertensivo, sangramento hepático, precisei de cirurgia e fui para a UTI”, afirmou. Mesmo após a expedição do alvará de soltura, ela não pôde voltar para casa imediatamente por causa do estado de saúde.
Depois da alta hospitalar, Bianca ficou cinco meses afastada das atividades profissionais. “Desenvolvi síndrome do pânico e estresse pós-traumático. Eu saía de casa apenas para ir à psicóloga e à psiquiatra”, disse.
Ela também relatou ataques nas redes sociais. “Sofri um linchamento virtual. Me chamaram de médica fake, atacaram meu corpo, minha condição como mulher. Sofri gordofobia”, afirmou. Atualmente, Bianca retomou parcialmente o trabalho.
“Voltei à clínica e a alguns plantões, mas ainda não consegui resgatar minha carga horária. Estou priorizando minha saúde mental”, explicou.
Defesa detalha atuação e questiona prisão
O advogado Darô Fernandes, que atua no caso ao lado dos escritórios Daroszewski Advocacia e Éboli Consultare (Leonardo Éboli e Henrique Éboli), afirmou que houve ilegalidades graves e anunciou medidas judiciais contra o Estado e contra responsáveis pela difamação da médica.
Fernandes afirmou que a defesa atuou desde o primeiro momento com uma equipe formada por dois escritórios. “Nós atuamos com a doutora Bianca desde o primeiro momento. A fiança foi arbitrada inicialmente em R$ 150 mil e, na audiência de custódia, a juíza majorou para R$ 250 mil”, relatou.
Segundo ele, a defesa recorreu imediatamente. “No dia seguinte, entramos com pedido no Tribunal de Justiça, que reduziu a fiança para o equivalente a 10 salários mínimos, pouco mais de R$ 15 mil”, disse.
Como a médica estava com o celular apreendido e sem acesso a contas bancárias, foi organizada uma vaquinha on-line. “Familiares e amigos ajudaram a arrecadar o valor para que ela fosse colocada em liberdade.”
Darô Fernandes explicou que, no curso do inquérito policial, a defesa apresentou pareceres técnicos demonstrando a inexistência de crime. “Não existia falsificação de medicamento, não existia propaganda enganosa, nem exercício ilegal da medicina”, afirmou.
Mesmo assim, segundo ele, a delegada responsável pelo inquérito indiciou Bianca por falsificação de medicamento e propaganda irregular. “Nós despachamos diversas vezes, apresentamos novo parecer e levamos a discussão ao Judiciário”, disse.
O advogado relatou que a promotora do caso analisou o material e pediu o arquivamento. “A promotora entendeu que ela era médica regularmente inscrita, que não existia crime algum e pediu o arquivamento do inquérito. Foram feitas diligências complementares, todas apontando que não houve crime”, afirmou.
Para o advogado, o que ocorreu com a médica foi grave. “O que aconteceu com ela foi um ato grave. Um ato criminoso”, disse. Ele também criticou a tentativa de enquadrar a médica por exercício ilegal da medicina.
“Isso é uma falácia. Qualquer médico, a partir do momento em que tem CRM, pode atuar. Não havia necessidade nenhuma de criminalização.” Darô Fernandes afirmou que a defesa pretende buscar reparação.
“Vamos entrar com ações contra pessoas que injuriaram e difamaram a doutora Bianca e o Instituto Nutri, clínica onde milhares de pessoas foram atendidas”, disse. Segundo ele, “quando o investigado é inocentado, é preciso dar a mesma visibilidade ao desfecho que foi dada à acusação”.
Apesar de tudo, Bianca afirma que pretende seguir na medicina. “Vou continuar atuando com ética, transparência e respeito ao paciente, como sempre fiz”, declarou.
Ela ressaltou que escolheu atuar na área do emagrecimento por experiência pessoal. “Eu sempre fui uma paciente obesa. Sei a dor do preconceito. Meus pacientes dizem que se sentem compreendidos, e isso me dá força.”
Entenda
A Justiça de Goiás arquivou definitivamente o inquérito contra a médica Bianca Borges Butterby, presa em maio sob suspeita de falsificação de medicamentos, propaganda enganosa e exercício ilegal da medicina.
O Ministério Público concluiu que não houve crime e pediu o arquivamento por atipicidade da conduta, sem oferecimento de denúncia. Formada pela UFG, com registro ativo no Cremego e especialização em Nutrologia, Bianca teve a reputação abalada ao ser tratada publicamente como “falsa médica”.
A defesa afirmou que todas as acusações foram desmontadas durante a investigação, que durou cerca de seis meses e envolveu pedidos de habeas corpus no TJGO e no STJ. Com o arquivamento, ela retomou gradualmente os atendimentos e afirma buscar reconstruir a carreira.
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