Em entrevista exclusiva ao Jornal Opção Online, Lívia Fiori disse acreditar no trabalho das forças policiais, mas criticou a legislação brasileira, que, segundo enfatizou, permite o avanço da criminalidade

À esquerda Lívia Fiori, ao lado da irmã Ana Maria, assassinada em março por um motoqueiro em um suporto assalto | Foto: Acervo Familiar
À esquerda Lívia Fiori, ao lado da irmã Ana Maria, assassinada em março por um motoqueiro em um suporto assalto | Foto: Acervo Familiar

Irmã da assessora parlamentar Ana Maria Victor Duarte, de 26 anos, a policial civil Lívia Fiori não esconde a dor que tem sentido nos últimos quatro meses. Foi no dia 14 de março que sua irmã foi morta por um motoqueiro em um suposto assalto. Ana Maria é apontada como a segunda vítima da série de 13 assassinatos semelhantes investigados por uma força-tarefa. Em entrevista no início da tarde desta quinta-feira (7/8), enquanto preparava o almoço e cuidava de seus filhos, que são crianças, Lívia Fiori lamentou a quantidade de assassinatos de mulheres e relatou que o clima no seio familiar é de consternação. “Está difícil levar a vida para frente. Ela era a nossa princesa, nosso tesouro, a caçulinha.” Mais adiante, admitiu que tem tomado muitos remédios para amenizar os sintomas da depressão.

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Atualmente na Delegacia Estadual de Atendimento à Mulher (Deam), Lívia está de licença para atuar no caso da irmã, a cargo da Delegacia de Investigações de Homicídios (DIH), e também por conta do abalo emocional causado pela tragédia. Lívia Fiori ressaltou a atuação da polícia e criticou a legislação brasileira, classificada por ela como frouxa e responsável pela impunidade no País.

*Leia Mais: Filha de promotor assassinada em lanchonete pode não ter sido vítima de latrocínio
Caminhada pela paz pede justiça no caso da jovem assassinada durante assalto em sanduicheria

Filha do promotor de Justiça aposentado Uigvan Duarte e ex-delegado da Polícia Civil, Ana Maria Victor Duarte era assessora do deputado estadual Helio de Sousa (DEM). Ela estava com alguns amigos em uma sanduicheria no Setor Bela Vista, numa noite de sexta-feira, quando o bandido deu voz de assalto. Na ocasião ela não estava com o aparelho celular. Segundo relato de testemunhas, o primeiro disparo falhou e o homem então disparou novamente, a atingindo fatalmente.

A família da jovem divulgou recentemente que está disposta a pagar R$ 10 mil para quem tiver informações contundentes que possam auxiliar nas investigações. Confira a entrevista:

Como policial civil de Goiás e irmã de uma das vítimas, como analisa esse atual momento da segurança pública no Estado?
Olha, tenho vivido um momento horrível. De muita preocupação por trabalhar na instituição e pelo que ocorreu na minha família. O medo está cada vez maior, porque a lei está cada vez mais frouxa, favorável aos bandidos. Eu não acredito de forma alguma que seja culpa da polícia, pois são as leis do País que são frouxas e não intimidam o bandido. A polícia prende, mas a lei solta, o que favorece essa onda de criminalidade. O criminoso volta a cometer os mesmos crimes e nós da polícia estamos enxugando gelo. Nos sentimos frustrados como profissionais. Tem todo um trabalho investigativo, que é complexo, para depois ver o bandido sendo solto, às vezes [os criminosos] saem da delegacia antes da gente, antes de o expediente encerrar, e riem da nossa cara. E olha, a frustração é geral entre as polícias. Meu esposo é policial federal e também se sente assim.

Há quanto tempo está na Polícia Civil?
Há 14 anos e meu esposo é policial federal há 15.

Por quais delegacias a senhora passou?
Atualmente estou na Delegacia da Mulher, mas já atuei na Delegacia de Homicídios, no 2º DP de Aparecida de Goiânia e na delegacia de polícia de Abadiânia.

A senhora está atuando nas investigações do caso da sua irmã, o que é possível repassar de informação neste sentido? Como a senhora vê essa possibilidade de um assassino em série?
Realmente estou concentrada no caso da Ana Maria, mas digo que realmente não sabemos se é uma pessoa ou uma facção que está cometendo esses crimes. Não dá ainda para afirmar se se trata de uma pessoa ou de 10, e se alguém estaria aproveitando dessas especulações para cometer mais assassinatos e passar despercebido. Volto a afirmar, não é culpa da polícia [a demora na elucidação dos casos]. Tenho contato com familiares de outras vítimas, no que for possível ajudar [em outros casos], eu estou empenhada, mas o principal caso para mim é o da Ana [Maria].

No final de semana o governador determinou uma força-tarefa para acelerar os resultados, após a morte da Ana Lídia, de 14 anos. A sua irmã foi assassinada em março, esse reforço chega no momento certo ou poderia ter começado antes?
Não vejo como uma falta da polícia em si. A gente trabalha com as ferramentas que são disponibilizadas e com a equipe que temos. Penso que as autoridades máximas da segurança pública poderiam ter idealizado essa força conjunta antes sim, mas não é hora para isso [esse tipo de questionamento]. Por exemplo, o delegado que está com o caso da minha irmã, o Thiago [Damasceno] é empenhado, muito atencioso com a gente da família. Acontece que como o assassino estava de capacete dificulta muito. De capacete todo mundo é igual e nós não tivemos a sorte de ter uma câmera que captasse a imagem dele. A luta agora é para descobrir se é um louco ou muitos [que está cometendo os assassinatos]. [Nós da polícia] vamos fazer a nossa parte, que será prender o criminoso, agora se a Justiça será cumprida não é possível afirmar.
Queria aproveitar essa entrevista para registrar a nossa frustração como policiais, por investigar, fazer operações, e ver os bandidos sendo soltos pela Justiça. Estamos cansados de enxugar gelo, porque bandido gosta de aparecer. Lembra o caso do Leonardo Pareja?[criminoso de meados da década de 90 que ganhou fama nacional por, mesmo foragido, conceder entrevistas e debochar das forças policiais. Buscava holofotes envolvendo em seus crimes personalidades públicas. Em 1996 comandou uma rebelião Centro Penitenciário de Goiás (antigo Cepaigo), em Aparecida de Goiânia. Foi morto no mesmo ano e sua morte segue uma incógnita]. E se estivermos diante de um caso desses?

É possível falar em expectativa a partir dessa repercussão e cobrança da sociedade pela elucidação dos casos e combate da violência, sobretudo contra mulheres?
Continuamos assustados, mas estamos com esperança sim, de a polícia prender quem está fazendo isso. Já se sabe de algumas prisões [em relação também a casos que não envolvem a suspeita de um assassino em série] e também que outros suspeitos morreram em confrontos com a polícia. Não acredito que após a prisão será feita a justiça no sentido da punição, principalmente se for mais de um. Se, por acaso, fosse um, talvez [haveria punição adequada], porque daí responderia por várias mortes e a pena seria maior, o que faria cumprir mais tempo, mas se forem realmente casos isolados…

Poderia falar de como sua família, em especial seus pais, têm conseguido enfrentar esse momento? O que dizer a outras pessoas que também estão passando por isso?
Para te falar a verdade, eu estou conversando com você nesta tranquilidade porque estou sedada. É muito difícil. Estamos arrasados. Está difícil levar a vida para frente. Ela era a nossa princesa, nosso tesouro, a caçulinha. Eu tenho meus filhos, três crianças, vou continuar vivendo por eles, mas minha vontade é entrar no quarto e não sair mais de lá. Eu e minha mãe tomamos remédio o tempo todo.