O dólar disparou nesta terça-feira, 2, atingindo R$ 5,70, em meio a reações do mercado às críticas recentes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Banco Central do Brasil (BC), principalmente ao seu presidente, Roberto Campos Neto.

Durante uma entrevista à Rádio Sociedade em Salvador (BA), Lula alegou a existência de um “jogo de interesse especulativo” contra o real e mencionou que o governo está considerando medidas para contrapor essa situação. Ele argumentou que a recente valorização do dólar não tem justificativa e é uma resposta às suas críticas ao Banco Central.

Na segunda-feira, Lula afirmou que o próximo presidente do BC irá considerar o Brasil “do jeito que ele é, e não do jeito que o sistema financeiro fala”. Após essas declarações, o dólar encerrou o dia sendo vendido a R$ 5,6527, o maior valor desde 10 de janeiro de 2022.

Em um discurso noturno, Lula enfatizou que suas responsabilidades são com o povo pobre do país, não com banqueiros ou ricos. Nesta terça, Roberto Campos Neto, em resposta indireta, afirmou que a interrupção na queda da taxa básica de juros é mais influenciada por “ruídos” do que pelos fundamentos econômicos.

O Ibovespa, principal índice da bolsa de valores brasileira, a B3, oscilou durante o dia. Às 13h35, o dólar subia 0,70%, sendo cotado a R$ 5,68924, alcançando o pico de R$ 5,7004. No dia anterior, o dólar subiu 1,15%, fechando a R$ 5,6527. Com isso, acumulou uma alta de 1,15% na semana, no mês e de 16,49% no ano.

No mesmo horário, o Ibovespa caía 0,09%, aos 124.656 pontos. No dia anterior, o índice subiu 0,69%, chegando aos 124.765 pontos. Com esses movimentos, acumulou alta de 0,69% na semana, no mês, mas uma perda de 7,02% no ano.

Declarações

Os investidores continuam atentos às declarações de Lula sobre o Banco Central, seu presidente e a política monetária do país. Lula insistiu que não se pode criar crises e culpou a alta do dólar nas suas declarações. Ele defendeu a autonomia do BC, acusando Campos Neto de ter um viés político.

“É um absurdo. Obviamente que me preocupa essa subida do dólar. Há uma especulação. Há um jogo de interesse especulativo contra o Real nesse país. Eu tenho conversado com as pessoas o que a gente vai fazer. Estou voltando quarta-feira, vou ter uma reunião. Não é normal o que está acontecendo”, argumentou Lula.

“A gente precisa manter o Banco Central funcionando de forma correta, com autonomia, para que o presidente do Banco Central não fique vulnerável às pressões políticas. (…) Quando você é autoritário você resolve fazer com que o mercado se apodere de uma instituição que deveria ser do Estado. Ele não pode estar à serviço do sistema financeiro, ele não pode estar à serviço do mercado”, disse.

O mandato de Campos Neto termina em 2024 e, desde 2021, a legislação brasileira garante a autonomia do BC, que deve tomar decisões sem interferência política. Lula prometeu indicar alguém comprometido com o crescimento do país para a presidência da instituição.

“Eu estou há dois anos com o presidente do Banco Central do [ex-presidente Jair] Bolsonaro, não é correto isso”, afirmou o presidente nesta segunda-feira, ponderando que a autonomia do BC foi aprovada pelo Congresso e será respeitada.

“Eu tenho que, com muita paciência, esperar a hora de indicar o outro candidato, e ver se a gente consegue… ter um presidente do Banco Central que olhe o país do jeito que ele é, e não do jeito que o sistema financeiro fala”, acrescentou, destacando que “quem quer BC autônomo é o mercado”.

A legislação atual estabelece que o presidente e diretores do BC têm mandatos de 4 anos, não coincidentes com a presidência da República. O presidente da República indica os nomes para o comando do BC, sujeitos à aprovação do Senado Federal.

Lula reafirmou seu compromisso com a responsabilidade fiscal e com a inflação baixa, destacando a manutenção da meta de 3% para a evolução dos preços.

As recentes declarações de Lula complementam suas críticas anteriores ao BC, onde argumentou que a taxa de juros de 10,5% é irreal para uma inflação de 4%, sugerindo que a Selic deverá melhorar com a nomeação de um novo presidente do BC.

O mercado também observa o cenário fiscal do país, após o déficit superior às expectativas divulgado na semana passada. “O que aconteceu no Brasil é que as expectativas começaram a subir apesar de os dados correntes [de inflação] estarem vindo conforme o esperado”, explicou o presidente do BC.

Externamente, a atenção se volta para a economia dos Estados Unidos. Dados do Departamento do Comércio dos EUA mostraram uma inesperada queda de 0,1% nos gastos com construção em maio, devido às altas taxas de hipoteca que afetaram a construção de residências unifamiliares.

Além disso, o Instituto de Gestão de Fornecimento (ISM, em inglês) indicou que o setor manufatureiro dos EUA se contraiu pelo terceiro mês consecutivo em junho, com uma leitura de 48,5, abaixo do limiar de crescimento de 50.

Haddad

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta terça que é essencial melhorar a comunicação sobre a autonomia do Banco Central (BC) e a rigidez do arcabouço fiscal para controlar a alta do dólar.

“Eu acredito que o melhor a fazer é acertar a comunicação, tanto em relação a autonomia do Banco Central como o presidente fez hoje de manhã quanto em relação ao arcabouço fiscal. Não vejo nada fora disso, autonomia do Banco Central e rigidez do arcabouço fiscal, é isso que vai tranquilizar as pessoas”, disse o ministro em coletiva a jornalistas no Ministério da Fazenda.

Durante uma entrevista na manhã desta terça-feira, Lula foi questionado sobre possíveis medidas para conter a depreciação do real e afirmou que alguma ação é necessária, mas não especificou qual seria.

“Temos que fazer alguma coisa, mas não posso falar porque estaria alertando meus adversários”, disse. Após as declarações de Lula, surgiram especulações de que o governo poderia reduzir o IOF para conter a depreciação do real.

No entanto, durante a coletiva de imprensa desta manhã, Haddad negou qualquer alteração na cobrança do tributo como uma medida para combater a depreciação do real. “Não sei de onde saiu esse rumor”, disse o ministro.

Leia também: