Conselhos populares surgem como meio de estar no poder mesmo sem a reeleição

14 junho 2014 às 12h19

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A fórmula para sair do governo sem perder o poder é simples. A seis meses e meio do fim de mandato, a presidente Dilma, com a reeleição em xeque, colocou na rua o decreto que cria conselhos populares destinados a acompanhar, com poder de decisão, as ações de governo a partir de uma superestrutura que alcança em todos os níveis dos mais de 5 mil municípios.
A construção recebeu no palácio o nome de Política Nacional de Participação Social, onde os conselhos se tornam instituições que, em nome da sociedade civil, operam com poder de tutela junto a todos os níveis de gestão pública, inclusive as Forças Armadas. Os meios de ação terão todos os recursos à disposição da participação social, como as audiências públicas.
Outras ferramentas de atuação pública mais ampla são as ouvidorias, fóruns, comissões de políticas setoriais, meios de consulta e conferências – todo esse aparelho em níveis desde o comunitário ao nacional. A atuação seria a título de atuar de todas as formas na articulação das relações do governo com a sociedade em processos desde implementações a decisões.
Ainda falta definir como será o recrutamento dos membros dos conselhos. Poderão ser pessoas eleitas ou indicadas pela sociedade, num processo a ser regulamentado ainda neste governo pela Secretaria-Geral da Presidência da República, entregue aos cuidados do companheiro Gilberto Carvalho, que ainda não se sentiu à vontade para sugerir em público formas de recrutamento.
Trata-se de um mecanismo que, na prática, concorre com o legislativo, desde os vereadores aos senadores. Assim como compete em ação executiva desde secretarias municipais a ministérios. Os comandos dos poderes executivos e legislativos podem passar de um partido a outro, mas os conselhos populares ficam com seus mecanismos.
Tenham os conselheiros mandatos ou não, nenhum partido estará mais bem credenciado do que o PT ao preenchimento das vagas. Nenhuma outra associação se dedica há 34 anos à formação de quadros desde a militância à criação ou infiltração em movimentos sociais. Nenhum outro partido possui a mesma vocação pelo assembleísmo, a caráter dos conselhos populares.
Há uma coerência nessa fixação do PT na relação entre poder e organização social. As propostas petistas de reforma política insistem em privilegiar quadros organizados. É o caso da reforma proposta pela presidente Dilma a partir de uma Constituinte exclusiva com pauta aprovada em plebiscito. Um constituinte esnobaria a agenda determinada pelos eleitores?
Tem mais. A proposta pelo conselho é coerente com o empenho do PT em conquistar meios de impor o controle social da mídia. Os veículos de comunicação passariam a ser orientados pelo Estado com base em apelos de massas chavistas articuladas pela onda bolivariana que atravessa a América do Sul. Coisas que ressurgem quando se registram, sem saudosismo, os 50 anos da ditadura militar.
A criação da estrutura por decreto é uma solução para afastar o Congresso da formulação e, ao mesmo tempo, montar o sistema ainda neste ano. A constitucionalidade do aparelho será inevitavelmente questionada no Supremo Tribunal Federal, onde a aposentadoria do ministro Joaquim Barbosa oferece ao Planalto a chance de ampliar o círculo de amigos entre os juízes.