Aos 82 anos, Eduardo Suplicy, um dos políticos mais longevos do Brasil com 44 anos de vida pública, foi diagnosticado com Parkinson em setembro de 2023. O que chamou a atenção foi sua escolha de tratamento: derivados da Cannabis sativa, a planta da maconha.

Após uma série de exames, Suplicy descobriu que tinha Parkinson em estado leve durante uma consulta com um geriatra. Desde então, ele começou a tomar medicamentos tradicionais, ajustando as dosagens conforme necessário.

Paralelamente, Suplicy passou a acompanhar o trabalho da pesquisadora Cidinha Carvalho, mãe de uma menina com síndrome de Dravet e presidente da Cultive, uma associação de pacientes que utilizam Cannabis terapêutica. Cidinha foi a primeira mãe em São Paulo a obter permissão judicial para cultivar Cannabis.

“Conheci a filha dela, até que me tornei amigo dela. Vi como a sua qualidade de vida tinha melhorado muito e também de como ela vinha também cuidando, através da associação, de muitas outras pessoas”, comenta Suplicy, em entrevista a Lucas Veloso na coluna VivaBem do portal Uol.

Em julho de 2023, Suplicy visitou a Associação Flor da Vida em Franca (SP), onde conheceu pacientes medicados com Cannabis medicinal. Impressionado com a atuação da organização, Suplicy escreveu uma carta à Anvisa relatando suas observações e elogios.

Início do tratamento

Pouco tempo após a visita, Suplicy começou a tomar CBD (canabidiol), inicialmente importado. “O primeiro óleo tinha uma cor diferente, porque era em doses da Cannabis medicinal infantil. Fui tomando pouco a pouco: cinco gotas por dia”, lembra.

Com o tempo, a dosagem aumentou gradativamente, e hoje ele toma 27 gotas diárias, distribuídas entre as refeições. Os benefícios incluem a redução de dores musculares e a melhora nos tremores e na rigidez, facilitando atividades cotidianas como usar o celular e ler. “Sumiram”, resume. “Também passei a andar com maior firmeza, e eu faço isso, sempre fui um bom esportista”, diz.

A decisão de usar CBD foi bem acolhida por sua família. Suplicy compartilhou seu diagnóstico e tratamento com seus filhos e netos durante um almoço, recebendo apoio também da sociedade, apesar do tabu em torno da Cannabis.

“Todos me apoiaram, disseram para contar com eles, que iam me acompanhar. Sempre me perguntam da saúde. Eu transmito a eles que, felizmente, estou melhorando”, conta. “As pessoas perguntam como está a minha saúde, eu conto o progresso que tenho tido”, pontua.

Médica

A neurologista Luana Oliveira, do Hospital Sírio Libanês, acompanha Suplicy. Ela explica que o Parkinson é um distúrbio neurodegenerativo que afeta o controle do movimento, causado pela perda progressiva de células que produzem dopamina. A pesquisa sobre o uso de Cannabis medicinal para Parkinson visa entender como a planta pode ajudar no tratamento de doenças degenerativas.

Os sintomas típicos incluem tremores, rigidez muscular, lentidão de movimentos e instabilidade postural. Embora a causa exata não seja totalmente compreendida, fatores genéticos e ambientais parecem desempenhar um papel importante.

Atualmente, no país, o tratamento com Cannabis medicinal não faz parte dos métodos tradicionais. No jargão médico, o que Suplicy está recebendo é conhecido como tratamento “off-label” (algo como “fora da bula”), o que significa que é parte de uma pesquisa clínica. Na prática, isso envolve prescrever um medicamento já comercializado para uma finalidade diferente daquela especificada na bula e autorizada para comercialização.

“O que estamos fazendo não é substituir o tratamento tradicional do Parkinson, os medicamentos já aprovados, mas compor a terapia com a Cannabis para melhorar alguns sintomas dos pacientes” explica a médica. “Ao invés de eu usar um medicamento para dor, outro para ansiedade, outro para insônia, tenho a possibilidade, com a Cannabis medicinal, de usar o óleo para tratar os múltiplos sintomas”, completa.

Nas primeiras visitas, Luana lembra que dores musculares e a falta de sono foram as principais queixas de Suplicy, problemas que apresentaram melhoras nos atendimentos seguintes. A questão dos tremores, da lentidão e da rigidez está na meta clínica, mas a pesquisadora indica que nem sempre isso é contido com as dosagens de Cannabis.

Além de melhorar o quadro clínico do paciente, os resultados obtidos fazem parte de uma pesquisa em andamento com a Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), cujo objetivo é entender as variações em cada paciente e como a Cannabis pode colaborar no tratamento de algumas doenças degenerativas.

Defesa

Suplicy continua a desempenhar suas funções legislativas intensas e defende o acesso à Cannabis medicinal para todos, especialmente os mais pobres. Sua rotina inclui palestras em sindicatos, congressos, escolas e universidades.

Em agosto de 2023, durante uma viagem à Coreia do Sul, Suplicy teve que interromper o uso de CBD devido à proibição da Cannabis em Dubai, onde fez escala. Após retornar ao Brasil, retomou o tratamento.

“Um advogado me disse que ele estava com um cliente que estava preso há algum tempo, uns dois anos, e condenado à prisão por 15 anos. Então fui para a Coreia do Sul sem tomar nada”, conta.

Além de sua defesa pelos direitos humanos e pela Renda Básica da Cidadania, Suplicy agora levanta a bandeira da Cannabis medicinal.

“Procuro colaborar cada vez mais para que a legislação brasileira seja mais adequada para permitir que as pessoas mais pobres, nas áreas periféricas de nossas cidades ou no campo, possam ter acesso ao tratamento”, diz.

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