Chinesa leva principal lote no maior leilão de energia do Brasil, com previsão de investimentos em Goiás
15 dezembro 2023 às 16h27
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A State Grid conquistou o principal lote no maior leilão de energia registrado na história do Brasil, realizado nesta sexta-feira, 15, na sede da B3, em São Paulo. A estatal chinesa ofereceu o deságio mais significativo para a construção de linhas de transmissão nos estados do Maranhão, Tocantins e Goiás, com um investimento previsto de mais de R$ 18 bilhões.
O leilão contemplou três lotes, somando investimentos de R$ 21,7 bilhões para reforçar a infraestrutura de transporte de energia no país. A concorrência baseou-se na proposta com o maior deságio da RAP (Receita Anual Permitida Contratada), e os vencedores foram os grupos que ofereceram os maiores descontos para operar as linhas de transmissão.
Para o primeiro lote, a State Grid apresentou uma oferta de R$ 1,9 bilhão, representando um deságio de 39,9%. O projeto foi dividido em quatro sublotes, e a State Grid foi a única a fazer lance para adquirir o lote completo.
O segundo lote foi arrematado pelo consórcio brasileiro Olympus XVI, que ofereceu R$ 239,5 milhões, resultando em um deságio de 47%. Este projeto prevê investimentos superiores a R$ 2,5 bilhões e abrange os estados de Goiás, Minas Gerais e São Paulo.
A terceira oferta bem-sucedida foi da empresa espanhola Celeo, que venceu o terceiro lote com um deságio de 42,39%, oferecendo R$ 101,2 milhões para um projeto de investimento de R$ 1 bilhão, destinado à construção de linhas de transmissão entre Minas Gerais e São Paulo.
Operação
Os três lotes serão operados por meio da criação de uma SPE (sociedade de propósito específico), sendo responsabilidade da State Grid Brazil Holding buscar recursos financeiros (funding) para esses empreendimentos.
“Já estamos trabalhando, todos os estudos prévios foram feitos, inclusive para poder chegar a apresentar esta proposta bem-sucedida, com deságio muito significativo”, disse Ramon Haddad, vice-presidente da State Grid.
Quando questionado sobre a origem dos materiais, o vice-presidente da empresa chinesa mencionou que o projeto demanda tecnologia avançada, e a State Grid utilizará soluções mistas, provenientes do mercado brasileiro e internacional. Quanto aos leilões futuros, o representante da State Grid expressou interesse contínuo.
“A gente está constantemente em busca de vencer os leilões, implantar, operar e manter”, afirmou. “A proposta da State Grid Brasil é de longo prazo, é de crescimento contínuo. A gente tem agora em nossas mãos um projeto muito grande, que nós temos responsabilidade de implantar, mas não é por isso que deixaremos de estar de olho.”
Já está programada a realização de outro certame em março do próximo ano, oferecendo 15 lotes para a construção de 6.460 quilômetros de linhas e novas subestações, estimando-se um investimento de R$ 18,2 bilhões.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) destacou que o objetivo do leilão era fortalecer a interligação entre as regiões Norte e Nordeste com as demais partes do país, visando ampliar a capacidade de escoamento de excedentes de geração.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e o diretor da Aneel, Ricardo Tili, celebraram o resultado do leilão, que registrou um deságio médio de 40,85%. Esse êxito, segundo o ministro, impulsionará novos investimentos em geração de energia renovável, contribuindo para o alcance da marca de R$ 40 bilhões em linhas de transmissão contratadas no Brasil em 2023.
“A minha expectativa era um pouco de preocupação com esse deságio. Superou minha expectativa”, disse em entrevista coletiva.
Problema significativo
Uma das questões abordadas no leilão dizia respeito à sua incapacidade de resolver um problema significativo no setor de energia. Atualmente, a expansão da geração de energias renováveis ocorre a um ritmo muito mais rápido do que a construção das redes necessárias para conectá-las.
Ao ser questionado sobre o desafio de o Brasil não possuir carga elétrica suficiente para absorver a crescente produção renovável, Sandoval Feitosa, diretor-geral da Aneel, reconheceu que isso representa, de fato, um desafio, mas afirmou que está sendo avaliado.
“Há uma fronteira tecnológica que terá que ser rompida nos próximos anos. Nós teremos que eletrificar nossa economia, o governo federal tem planos para isso. Então, temos que massificar o uso de veículos elétricos, transporte de massa”, afirmou.
Thiago Prado, presidente da EPE, também abordou o risco de subutilização dos ativos leiloados, destacando que a EPE não recomenda licitar linhas de transmissão sem uma necessidade de mercado e projeção de demanda que respalde o projeto.
“Tenho certeza de que esses ativos serão utilizados, não se trata de um investimento afundado com uma expectativa futura. São ativos que têm embasamento nas projeções de mercado da EPE e com uma visão de curto e médio prazo do Operador Nacional do Sistema Elétrico”, disse.
Prado expressou satisfação com os resultados do leilão, enfatizando a importância dos ativos para o sistema elétrico brasileiro e assegurando que foi contratado aquilo que o país precisa do ponto de vista tecnológico, e não necessariamente o que os fabricantes desejavam.
No leilão, foi contratado um sistema especial de transmissão em corrente contínua, conhecido como HVDC, diferenciando-se dos pacotes recentemente concedidos. Essa tecnologia específica é mais cara que o sistema convencional em corrente alternada, explicando os investimentos recordes em um número reduzido de lotes.
O tipo de sistema leiloado faz sentido para grandes distâncias e potências elevadas, permitindo maior controle do fluxo de energia elétrica entre as regiões, com alta confiabilidade e menores perdas.
Novos grupos
Embora grupos bem estabelecidos no setor elétrico, como Cemig, Taesa e Copel, não tenham participado do leilão, especialistas consideram positiva a presença de possíveis novos grupos no setor.
A participação da State Grid, uma empresa chinesa que está no Brasil desde 2010, foi destacada como significativa, com especialistas afirmando que faz sentido a gigante interessar-se e adquirir o primeiro lote.
“A China é reconhecida como um dos maiores e melhores players em transição de alta voltagem, e esse lote é muito complexo tecnicamente”, disse Alberto Bull, sócio da área de Energia do Veirano Advogado.
O resultado do certame também confirmou a percepção de que o elevado valor de investimentos é um fator restritivo da concorrência, algo observado em outros setores de infraestrutura, como rodovias, aeroportos e portos.
“Esse tem sido sempre um diferencial para restringir a concorrência. Mesmo assim houve competição e deságios significativos, na faixa dos 40%”, afirma.
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