O que era para ser motivo de orgulho para os goianos e em especial aos anapolinos, se tornou uma dor de cabeça crônica. O Aeroporto de Cargas, anunciado como instrumento que iria ser um marco para economia goiana, especialmente para o potencial logístico da região, hoje se mostra uma obra repleta de falhas, de alto custo para o cidadão e sem nenhum retorno –  talvez nunca tenha.

Iniciada em 2010, a obra do Aeroporto de Cargas de Anápolis ainda não foi entregue de forma que entre em operação. Mas chegou a ser inaugurada em um evento com conotação política. Em abril de 2018, antes de renunciar ao cargo de governador para concorrer ao Senado, Marconi Perillo (PSDB) chegou a descerrar a placa. Entretanto, o terminal aeroviário nunca entrou em operação, e nem sequer recebeu  autorização das autoridades responsáveis para haver pouso e decolagens na pista, que já custou cerca de R$ 340 milhões, segundo o gestor do Distrito Agroindustrial de Anápolis (Daia), Marlon Caiado.

A obra do Aeroporto de Cargas apresenta uma série de falhas estruturais graves. Em parte se deve ao projeto que tem erros indicados desde o seu planejamento. Depois do gasto milionário, utilizado principalmente para terraplanagem – o local escolhido para construção possuí um grande desnível –  observou-se o erro na drenagem da água da chuva. Essa falha, como era de se esperar, provocou uma erosão que compromete toda a estrutura da chamada “cabeceira” da pista.  Também foram apontados graves irregularidades no contrato com a empresa que executou a obra. Para piorar a situação, a empreiteira entrou em recuperação judicial.

“Menos da metade do que foi gasto até hoje dava para desapropriar um terreno plano na região e construído a pista. Já podia estar funcionando há anos. Mas ao contrário, obra gastou um volume monstruoso de terra para fazer o nivelamento da pista. O aterro não funcionou, causou problemas para pista e problemas ambientais, já que provocou o assoreamento do Córrego Extrema, que ajudava a abastecer o Daia. O prejuízo hoje é na casa dos R$ 340 milhões”, aponta do gestor do Daia.

Pista do Aeroporto, embora nunca tenha sido usada, já apresenta danificada

Na tentativa de salvar o que já foi feito durante governos anteriores, a gestão Agência Goiana de Infraestrutura e Transportes (Goinfra) fez um termo de cooperação técnica com a Infraero. A ideia era fazer com que pelo menos parte da pista pudesse ser homologada pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Mas devido às falhas graves e principalmente pelo processo erosivo que existe na cabeceira o processo não caminhou. 

Mesmo já tendo consumido mais de R$ 300 milhões, a obra do Aeroporto de Cargas de Anápolis ainda demanda investimentos para que a pista possa ser utilizada ao menos por aeronaves menores –  já que a infraestrutura para pouso e decolagem de aviões de grande porte ainda continua inviável e talvez nunca se concretize. O governo do Estado autorizou o início de uma de recuperação do canal de drenagem – essa é uma tentativa de consertar um erro no projeto original.

A empresa que está fazendo o serviço, vencedora da licitação, é a LJA Engenharia S/A, que receberá R$ 9.714.843,70. O prazo para conclusão da obra é de quatro meses.  Além de criar um canal de escoamento que suporte a água das chuvas e a preparação do ponto do Ribeirão Extrema que receberá esse volume, o projeto indica cobertura vegetal nas laterais da pista e recuperação da voçoroca que vem comprometendo a cabeceira.

Justiça

Em outubro de 2020 a  juíza Mônice Souza Balian Zaccariotti determinou que a Goinfra suspendesse parcialmente as obras do Aeroporto de Cargas de Anápolis. A medida impedia que a construção seguisse  em uma área específica onde houve a falta de drenagem.

A obrigação decisão da justiça é em resposta a uma ação movida pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO), em 2017. Na ação, a promotora de Justiça Sandra Mara Garbelini destacou os danos ambientais causados pelas obras do aeroporto de cargas, decorrentes de processos erosivos, carreamento do solo e assoreamento provocado pela construção.

Segundo o MP-GO, a situação mais grave está na cabeceira da pista, por afetar a Área de Preservação Permanente (APP) dos Córregos Barreiro e do Descampado, em razão da falta de obra de disciplinamento das águas pluviais no local.

Conforme apurado pela 15ª Promotoria de Anápolis, os processos erosivos, com o carreamento do solo e assoreamento, estão ocorrendo em razão de não ter sido executada uma obra de contenção ainda no estágio inicial do projeto, em 2014, visando regular adequadamente o escoamento das águas pluviais. Quando detectado o problema, já naquela época, foi firmado um termo de ajustamento de conduta (TAC) entre o MP e a empresa que executa as obras, a Loctec Engenharia, celebrado em agosto de 2015, tendo esta assumido a obrigação de elaborar um Plano de Recuperação de Área Degradada (Prad), o qual deveria ser executado de acordo com o cronograma aprovado pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Recursos Hídricos, Infraestrutura, Cidades e Assuntos Metropolitanos (Secima), atual Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).

Após a celebração do TAC, as obras foram paralisadas pelo Estado por falta de recursos financeiros, tendo os processos erosivos na área se agravado, especialmente em decorrência dos períodos de chuva. Em razão disso, novas denúncias foram levadas à 15ª Promotoria de Justiça da comarca, dando conta de que minas d’água na área de abrangência do aeroporto estariam assoreadas. Essas reclamações levaram à instauração de novo inquérito civil público para apurar os fatos.

De acordo com Sandra Garbelini, “obras estão causando grave dano ambiental de erosão e assoreamento de APP pela falta de um projeto de drenagem, que não foi elaborado e executado pela então Agetop, ameaçando a cabeceira da pista de romper”.