À beira da falência, Correios gastam R$ 200 milhões com “vale-peru”
14 dezembro 2024 às 16h31
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A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) surpreendeu ao anunciar a volta do tradicional “vale peru”, benefício de fim de ano para seus 84.700 funcionários, apesar do grave cenário financeiro enfrentado pela estatal. Cada colaborador receberá R$ 2.500, em duas parcelas, totalizando um custo de R$ 200 milhões. A decisão, comunicada no último dia 10 de dezembro, contrasta com recentes declarações da própria empresa sobre o risco de insolvência, após registrar prejuízo recorde de R$ 2 bilhões em 2024.
O benefício havia sido suspenso em 2020, durante a gestão do Floriano Peixoto Vieira Neto, mas sua retomada foi negociada no Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) de 2024. A primeira parcela, de R$ 1 mil, será paga na sexta-feira, 13, e os R$ 1,5 mil restantes estão programados para o dia 8 de janeiro de 2025. Além de um alívio aos trabalhadores, a medida é vista como um esforço para fortalecer a relação da atual gestão, liderada por Fabiano Silva dos Santos, com o sindicato da categoria.
Contradições no orçamento
A ECT vive uma crise financeira sem precedentes. Apenas nos primeiros nove meses de 2024, acumulou um déficit de R$ 2 bilhões, o pior da história da instituição para o período. Projeções indicam que o déficit anual pode ultrapassar os R$ 2,1 bilhões registrados em 2015. Em resposta, medidas emergenciais, como a imposição de um teto de gastos de R$ 21,96 bilhões e a suspensão de contratações, foram implementadas para “evitar a insolvência”. No entanto, a destinação de R$ 200 milhões para o benefício de fim de ano gerou questionamentos sobre a consistência do ajuste fiscal adotado pela empresa.
Histórico do “vale peru”
O pagamento de um benefício natalino é uma tradição que remonta a décadas nos Correios, sendo apelidado de “vale peru” em alusão ao prato típico da ceia natalina. O valor pago em 2024, R$ 2.500, representa um acréscimo em relação ao último benefício antes da suspensão, que era de R$ 1.000. Segundo o sindicato, a negociação pelo retorno do vale buscava resgatar um direito retirado na gestão passada, quando cortes foram realizados para conter gastos.
Porém, o anúncio deste ano ocorre em um contexto delicado: em outubro, circulou internamente um ofício assinado pelos principais dirigentes financeiros dos Correios, detalhando a necessidade de “medidas urgentes” para conter a deterioração das contas. O documento destacava a previsão de um saldo em caixa 83% menor no fim do ano em comparação ao início de 2024.
Desde que assumiu a presidência da estatal no início de 2023, Fabiano dos Santos, advogado e aliado político do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, enfrenta pressão para apresentar soluções estruturais à crise. Sua proximidade com o grupo Prerrogativas e com figuras centrais do Partido dos Trabalhadores, como o deputado federal Zeca Dirceu, trouxe expectativas de modernização, mas as decisões financeiras geraram controvérsias.
Enquanto o retorno do “vale peru” foi recebido com alívio por boa parte dos empregados, setores da opinião pública enxergam o gesto como contraditório diante do esforço fiscal necessário para manter os Correios operando. Não é a primeira vez que a estatal enfrenta dificuldades financeiras graves.
Embora a destinação do benefício esteja assegurada no Acordo Coletivo, analistas defendem que a prioridade da ECT deveria ser estabilizar as finanças antes de assumir novos custos. Em resposta, a diretoria da estatal justifica que o acordo foi estabelecido dentro da previsão orçamentária e que medidas adicionais estão sendo estudadas para reduzir despesas operacionais em 2025.
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