Larissa Rezende de Oliveira

Especial para o Jornal Opção

“Chegamos muito recentemente à Terra e vamos embora em breve”. — Henry Gee, editor da revista científica Nature.

Segundo a corrente predominante da Paleontologia, houve cinco extinções em massa das espécies, antes de nossa era geológica. Sempre causadas por fenômenos naturais.  A última teria ocorrido há 65 milhões de anos, em razão da queda de um asteroide, com impacto ambiental monstruoso, alcançando todo o globo, tornando a Terra insalubre para cerca de 80% das espécies, que foram desaparecendo após o desastre. Exemplo: os dinossauros.

Na janela de oportunidade de um clima ameno, na era cenozoica, já no período quaternário, no qual nos encontramos, deu-se o surgimento da vida humana, há aproximadamente 2,5 milhões de anos. Considerando que nos registros fósseis são encontradas evidências de organismos vivos de 3,5 bilhões de anos atrás, o período de tempo que nós humanos estamos aqui é, comparativamente, muito pequeno. Uma vírgula num texto de mil páginas. Um estalar de dedos, comparado a todos os ruídos do mundo.

Diferentemente das espécies anteriores à nossa, chegamos dotados de alto potencial de recurso embarcado, que deu início, há 67 mil anos, à  revolução cognitiva. Com ela veio a consciência de si mesmo, o aprendizado, o desenvolvimento e a acumulação cultural, as narrativas míticas do surgimento do universo. Inclusive Deus, como narrativa e objeto de fé, surgiu da efervescência mental de nossa espécie.

Paul J. Crutzen, cientista: Prêmio Nobel de Química de 1995 | Foto: Reprodução

Prêmio Nobel de Química de 1995, o holandês Paul Crutzen propõe o entendimento de que, com a Revolução Industrial, iniciada há 300 anos, foi dado início a uma nova era, o Antropoceno, cujas alterações predominantes no meio ambiente, não são naturais, como nas outras eras. Mas artificiais, resultado da ação direta do homem. A atividade humana vem afetando o meio ambiente de forma turbinada e crescente, com a queima de combustíveis fósseis, o descarte de materiais plásticos, o lançamento brutal de gás de efeito estufa no ar, a dizimação dos biomas pela agricultura de terra arrasada, a poluição sem limites da terra, da água e do ar. É como se houvesse acendido a lenha na caldeira que habitamos e a temperatura sobe, dia após dia, numa velocidade sem precedentes.

Há pouco mais de duas décadas, ainda estudante de Biologia, iniciei um trabalho sem tréguas de preservação, restauração, consciência e educação ambiental para crianças e jovens. Primeiramente acreditei que meu trabalho se juntaria ao de outras pessoas, levaria consciência a uma nova geração que poderia sensibilizar seus pais para a causa ambiental, a tempo de proceder a reversão dos extremos climáticos.

Hoje, percebo que meu trabalho e de meus colegas, se não foi de todo inútil, foi no mínimo ineficaz para combater a ameaça que avança sobre a vida, de forma obstinada, cujo prazo de reversão está se esgotando. Desastres ambientais de dimensões inéditas, tais como tufões, enchentes, deslizamento de barreiras, secas, desertificações, fogaréus incontroláveis, calores escaldantes e nevascas rigorosas já se espalham ao redor do planeta, sem distinção de zona climática. O que era previsível pela ciência, mas só daqui a décadas ou até mesmo séculos, já está acontecendo agora, diante de nossos olhos. Estudos de instituições ligadas à ONU atestam que o Brasil, em pouco tempo, será, em grande parte, inundado, desertificado e insalubre para a vida humana e a outras espécies coabitantes. Diante do iminente desastre, nem os estados nacionais, nem os organismos de representação supranacional, têm dado conta, ou mesmo feito questão de enfrentar tais desafios.

Rio Formoso, no Parque Nacional das Emas, com a mata ciliar preservada (caso raro) | Foto: Euler de França Belém/Jornal Opção

Durante a turbulência de passagem de períodos geológicos, um dos acontecimentos marcantes é o desaparecimento em massa das espécies. As conclusões mais aceitas garantem que uma nova extinção em massa das espécies já está em curso, de uma forma antecipada e atípica, vez que se dá, não pelo ciclo natural da Terra, mas pela ação predatória do homem sobre o ambiente em que vive. Nós somos o equivalente à queda do asteroide. O desaparecimento não atingirá apenas as espécies que nossa santa ignorância julga não fazerem falta, como as formigas, as abelhas, os urubus, os vaga-lumes e as águas-vivas. Uma das espécies prioritárias para o desaparecimento será nada menos que a do Homo sapiens, a espécie que nos classifica no reino animal. Somos elementos integrantes e sensíveis da biodiversidade. No entanto, há uma distopia em nosso comportamento atual. Quando há um inimigo comum, a reação normal de qualquer espécie é se unir para se defender. Temos um feroz inimigo comum. E até agora, lamentavelmente, não conseguimos nos mobilizar contra ele. 

O desaparecimento de nossa espécie implica na perda de tudo o que nossa revolução cognitiva conquistou em seu período de existência: a cultura, o acúmulo de saberes, o desenvolvimento científico e tecnológico, a narrativa sempre em evolução do universo. Implica, inclusive, no desaparecimento de Deus, como narrativa e objeto de reverência.

Não deixarei de realizar meu trabalho de restauração, preservação e conscientização ambiental. Porém, faço um apelo para que cada pessoa pense mais na preservação da vida do que se dar bem economicamente. Que recalibre suas ações e  hábitos de consumo, de modo a cooperar com o bem-estar no mundo.  Comece a observar as recomendações de pessoas e instituições qualificadas para se tornar um operador da causa da preservação da vida de nossa espécie. Mantenha hábitos sustentáveis e reduza seu rastro ecológico.

Parque Lagoa Vargem Bonita, em Goiânia (perto do Campus da UFG): preservação (ao lado há uma plantação de soja) | Foto: Euler de França Belém/Jornal Opção

Não se esqueça nunca de que a Terra é o suporte da vida. Não há outro planeta  à vista para o qual possamos migrar, levando nossa cultura, crença, desenvolvimento de saberes e, enfim, todo o nosso tesouro cognitivo que, infelizmente, está contaminado por afetos de autodestruição. Essa história do magnata Elon Musk de que levará o ser humano para habitar o planeta Marte é apenas uma balela de marketing, para aumentar a cotação das ações de suas empresas e garantir sua posição de “o homem mais rico do universo”, até que a extinção das espécies o carregue. 

10 dicas de hábitos e ações sustentáveis

1

Vote em políticos realmente comprometidos com a causa do meio ambiente (e acompanhe suas ações e cobre se for o caso);

2

Discuta questões ambientais (ou promova palestras) no trabalho, com amigos e familiares, com leveza, sem radicalismo. O radicalismo mais afasta do que agrega;

3

Preserve as nascentes e as matas ciliares. Evite o desperdício de água. Use água da chuva e de reuso para lavar calçadas, carros e irrigar jardins;

4

Evite a impermeabilização de terrenos. Plante árvores e gramados;

5

Dê preferência a produtos orgânicos. Reduza o consumo de carne. Evite produtos químicos e venenosos;

6

Respeite áreas de reserva e proteção ambiental. Reserve mais do que o obrigatório por lei;

7

Use técnicas de preservação do solo e faça plantio direto ou consorciado;

8

Use transporte compartilhado entre parentes e amigos. Evite combustível fóssil. Faça pequenos percursos a pé ou de bicicleta.

9

Separe os resíduos para recolhimento seletivo e reciclagem;

10

Pratique o consumo consciente. Antes de comprar, responda honestamente: “Realmente eu preciso disso?”    

Lembre-se: ações individuais refletem coletivamente. Toda revolução começa com uma ação individual.

Larissa Rezende de Oliveira é bióloga e mestra em Ciências Ambientais e Saúde, pela PUC-Goiás, autora do livro a sair: “Guia Prático de Educação Ambiental em Zoológicos”. É colaboradora do Jornal Opção.