O nome dele virou sinônimo de Palmas. Depois de Siqueira Campos, a figura ligada a Palmas mais lembrada pelos palmenses é o arquiteto Walfredo Antunes. E não é por menos. O profissional participou de forma ativa de todo o processo de construção da capital do novo Estado do Tocantins, mais do que tem sido contado. Walfredo foi opinião decisiva na coordenação dos estudos e na definição da área geográfica, passando pela escolha do nome, até a elaboração do projeto arquitetônico, que apresenta traços bem originais.

“Palmas é uma cidade que permite uma maior liberdade. Tanto na localização de atividades que estão agrupadas por similaridades, como na colocação morfológica que seguem regras gerais, com linhas estabelecidas, mas que fica também ao sabor e pela iniciativa daqueles que promovem as construções”, define Walfredo.

Ao fazer um balanço da sua obra, Walfredo, avalia que o projeto de Palmas ainda resiste depois de trinta e tantos anos e aponta o bem-estar das pessoas e a funcionalidade da cidade como comprovação da qualidade do projeto. “Palmas não tem favela, não tem congestionamento e não apresenta dificuldade nenhuma para as pessoas fazerem as três funções primordiais da vida urbana que é trabalhar, morar e ter lazer. Eu penso que é um projeto que em comparação com outras cidades que nós conhecemos, estamos em situação melhor”, defende.

Sobre a influência ou inspiração do projeto de Palmas, o arquiteto explica que não tem nada mais equivocado do que comparar a cidade a Brasília. Para ele, as duas cidades seguem projetos distintos que nada têm a ver entre si. A capital federal segue o modelo de separação de atividades e Palmas, o de agrupamento das atividades. “A base de Palmas é o que vem desde antes da Roma antiga, que é o padrão da malha quadriculada, que é largamente usada na história, no mundo em geral.”

Graduado em arquitetura pela Universidade Católica de Goiás (hoje PUC-GO), com mestrado em Planejamento Regional e Urbano pela Escola de Economia da Universidade de Londres e doutorando em Urbanismo pela Universidade de Lisboa, ele é professor do curso de Arquitetura da Universidade Federal do Tocantins (UFT). Em Goiás, dirigiu o Instituto de Planejamento Urbano e Regional (Indur) e ocupou a Secretaria de Coordenação Municipal em Goiânia, tendo dirigido também o Instituto Municipal de Planejamento. Ocupou a diretoria de Crédito do Banco Nacional de Crédito Cooperativo (BNCC) no governo federal e foi secretário de Estado do Turismo e assessor especial da Governadoria no Tocantins. Tem extensa atuação em projetos de arquitetura e urbanismo. Exerceu a vice-presidência do Instituto de Arquitetos do Brasil – Direção Nacional, e recebeu deste a Medalha Lúcio Costa, na categoria Urbanismo.

Nesta entrevista exclusiva ao Jornal Opção, dentro da série Palmas 34 anos, Walfredo releva como surgiu o projeto de Palmas, fala dos desafios da cidade e aponta possibilidade de futuro da última capital planejada do século 20.

Meu tio [deputado Antunes Oliveira] dividiu gabinete com Siqueira Campos e assim nasceu nossa relação

Onde o sr. estava e o que estava fazendo quando o Tocantins foi criado? E como o sr. se inseriu no processo de construção de Palmas?

Essa história começa um pouco antes. Uma questão prosaica. O meu tio, que usava o nome Antunes de Oliveira na política, era deputado federal pelo Amazonas. Quando o Congresso Nacional aumentou o número de deputados e teve de fazer mais gabinetes, não dava tempo de construir o anexo. Então, eles pediram os deputados de cada região que dividissem os gabinetes com quem tivessem maior afinidade. E o meu tio dividiu o gabinete com Siqueira Campos. Eu ia lá eventualmente com meu pai, ele tinha muita boa relação com o irmão e conheci Siqueira Campos lá. Então, esse processo nasce na relação com Siqueira Campos.

Depois, participei do Ministério do Interior junto com Renato Campelo Ribeiro, que já faleceu e que deveria ter um lugar melhor na memória aqui da cidade. Ele fez parte de uma comissão que participou da divisão do Estado e começou a discutir as alternativas da Constituição para uma nova capital. A essa altura, eu tinha voltado de um trabalho em São Paulo, estava no escritório da campanha de Siqueira Campos, a primeira campanha, e lá essa coisa foi discutida. Nova capital, nova cidade, pensando como fazer. E eu tinha mestrado mais ou menos nessa área e comecei a conversar com ele [Siqueira Campos] e com outras pessoas. Então, se constitui essa ideia de uma nova capital e de um projeto para essa nova capital. Assim que Siqueira assumiu, nos chamou para essa missão. Escolhemos o local – eu tinha sido presidente do Instituto Desenvolvimento Urbano e Regional de Goiás (Indur) e tínhamos feito um estudo capitaneado por Flávio Peixoto, que depois foi até ministro do Desenvolvimento Urbano [de José Sarney]. Ele trabalhava junto comigo no instituto e tinha feito um trabalho primoroso sobre a rede urbana de Goiás. Eu atualizei esse estudo e com essas informações sobre a rede urbana do Tocantins, o conjunto, nós começamos a escolha do local, depois o desenho da cidade e os prédios públicos. Essa é a história toda.     

O projeto em si é produto de uma associação entre Walfredo e o Grupo 4

O que era exatamente o Grupo 4 e como esse escritório conquistou a oportunidade de elaborar o projeto arquitetônico da nova capital?

O Grupo 4 era uma associação da qual eu comecei a participar antes de me graduar, em Goiânia. Eu atrasei minha graduação, era para ter graduado na [Universidade] Mackenzie [de São Paulo], mas acabei me transferindo por razões familiares para a Universidade Católica de Goiás. O Fernando [o arquiteto Luiz Fernando Cruvinel Teixeira, conhecido como Xibiu] ainda estava na Inglaterra terminando a pós-graduação dele e nós fundamos o Grupo 4. Quando eu entrei no governo de Goiás, por razões éticas me afastei do grupo. Mas já tinha feito trabalho, tinha boa relação, o Grupo 4 tinha uma equipe permanente muito firme. De modo que, quando veio essa nobre missão de planejamento da capital, eu e o Grupo 4 nos associamos. Eles, com a base técnica, eu tinha preferência para fazer o projeto, mas chamei o Fernando e o Grupo 4 e então, o projeto em si é produto de uma associação entre o Walfredo e o Grupo 4.

Como foi o processo da escolha da localização e do nome?

A localização dependeu de estudos técnicos primorosos. As pessoas não se lembram mais, mas está na Assembleia. Nós precisávamos apresentar à Assembleia Constituinte os estudos sobre a rede urbana de um local, não era um local exato, então nós tínhamos um local de preferência para manter o equilíbrio da rede urbana do Estado com o advento de uma nova cidade da importância de uma capital. Isso resultou num quadrilátero de 42 por 42 quilômetros. Nesse quadrilátero nós fizemos estudos de áreas, que resultaram em quatro áreas. Uma área que é mais ou menos onde nós estamos, mas que se dividia em duas, uma do outro lado do rio [Tocantins] que se chamou Mangues e a outra que se chamou área do Canela, porque já tinha o povoado que eu até já o conhecia – tinha visitado como autoridade do governo de Goiás. Havia uma área em cima da serra, para o norte de Paraíso, e havia uma área que chamávamos de Serra das Cotias, que era muito próxima da aldeia [Xerente].

Na época se falava da Aldeia do Funil [Xerente]?

Não, o Funil é uma consequência da aldeia maior, que está mais adiante. Os indígenas que queriam ficar mais perto da cidade vieram para a Aldeia do Funil. Eles eram originários dessa aldeia maior. E não tinha cabimento, já desde aquela época, em função de preocupações ambientais, colocar uma cidade junto a uma aldeia indígena, do mesmo modo em que a parte que estava em cima da serra é muito bonita, esse lugar até hoje é avistado de Palmas, quem olhar para Noroeste vai ver a serra lá. Mas ficamos pensando que, no desenvolvimento da cidade, de repente ela começasse a cair pelas beiradas desse platô. Aí esta área aqui foi escolhida. Na verdade, a área escolhida, um quadrilátero menor – e que já chamei a atenção da Assembleia [Legislativa] e do governo várias vezes para isso –, é a área que envolve o lado de lá do rio e do lado de cá, o que daria ao governo hoje um instrumento para controlar o desenvolvimento às vezes descontrolado de Luzimangues, que é [distrito de] Porto Nacional e é muito longe da sede, mas o governo ainda não prestou atenção nisso. Mas a área escolhida foi um quadrilátero que abrigava os dois lados do rio. Esse foi o estudo muito bem feito, apresentado à Assembleia Constituinte, ao governo e que teve aprovação. Aí vem o desenho da cidade propriamente dito e aí, por nossa formação, tanto eu quanto o Fernando dirigimos a equipe. Nós tínhamos mestrado nesta área e começamos a cuidar do desenvolvimento da cidade.   

Primeiros prédios públicos em construção em Palmas, em 1989; ao fundo, o Palácio Araguaia, mais à frente o Tribunal de Justiça e pelo menos três secretarias | Foto: Márcio di Prieto

Pudemos escolher o nome Palmas fazendo referência a São Joaquim da Palma e à quantidade de palmáceas     

O nome, é uma história curiosa. Quando Teotônio Segurado propôs a autonomia dessa parte norte do Estado de Goiás, na época uma ouvidoria, chamava-se Joaquim da Palma. Nós fizemos uma série de estudos depois nesse quadrilátero, foram feitos estudos geológicos e de ocupação agrícola, não tinha sentido colocar cidade em cima de área produtiva, estudos sobre a consistência dos terrenos, abastecimento de água, possibilidade de comunicação, nós fizemos todos esses estudos até chegarmos àquelas áreas que depois se consolidaram nesta aqui onde estamos hoje.

Um desses estudos era sobre estudo de avaliação ambiental. Parece que o meio ambiente surgiu na imaginação das pessoas de alguns poucos anos para cá, mas já existia naquela época, 30 e tantos anos atrás, essa preocupação. O escritório de Ruy Ohtake [1938-2021, renomado arquiteto brasileiro] que fez este estudo, que mostrou que, por causa do caminhar ecológico, esse lugar aqui é a localização do País onde existe a maior concentração de palmáceas, desde o coco-da-baía, o tucum etc., são 16 ou mais espécies de palmáceas.

Então, começou a surgir o nome Palmas. Claro, apresentamos isso para o governador, ele achou interessante, na época havia uma brincadeira, as pessoas diziam que a gente queria colocar o nome de Palmas para significar as palmas de espantar os mosquitos. Houve uns óbices, a assessoria do governador apontou que tinha uma cidade Palmas no norte do Paraná. Nós descobrimos que, pela Constituição, não pode ter cidade de mesmo nome de mesmo status, mas a cidade lá era município e aqui seria capital, então pudemos escolher o nome Palmas, fazendo referência a São Joaquim da Palma e à quantidade de palmáceas.      

A morfologia de nossas construções é mais diversificada e a separação de zonas é suficiente para organizar a cidade

Se fala muito que Palmas é uma Brasília com rotatórias. O projeto urbanístico de Palmas foi inspirado na capital federal?

Uma de minhas curiosidades é sobre as pessoas de pronto compararem Palmas ou entenderem Palmas como cópia de Brasília. As cidades não têm nada a ver uma com a outra. Eu posso falar com liberdade. Lúcio Costa [1902-1998, arquiteto e urbanista que projetou o Plano Piloto de Brasília], foi um gênio da raça – eu tenho a Medalha Lúcio Costa, conferida pelo Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), medalha urbanismo, tenho de honrar a memória dele. Mas ele veio de uma época de um planejamento que se chamava de planejamento corporativo. Um planejamento de separação de atividades. Pode-se perceber que em Brasília a marcação, a separação das atividades é muito específica, muito determinada. De mais a mais, Brasília tem o que se chama de “plano de massa”. A morfologia, ou seja, a maneira como os edifícios se comportam em relação à cidade, é pré-desenhada. E Palmas não tem isso. Palmas parte de uma concepção de nossos estudos sociais, fora do País, e de nossa experiência aqui, é uma cidade que permite uma maior liberdade. Tanto na localização de atividades que estão agrupadas por similaridades, como na colocação morfológica, que segue regras gerais, com linhas gerais estabelecidas, mas que fica também ao sabor e pela iniciativa daqueles que promovem as construções. Nossa morfologia é mais diversificada, o conjunto dos edifícios é mais diversificado e essa separação de zonas é o suficiente para organizar a cidade, mas não é tão determinada como é o caso de Brasília.

As pessoas costumam comparar Brasília a um avião. Lúcio Costa nunca pensou em asa nenhuma, aí vêm “Asa Sul” e “Asa Norte”, virou avião mesmo, mas não tem nada a ver. Aqui já compararam a alguns animais, não tem. A base de Palmas é o que vem desde antes da Roma antiga, que consolidou esse padrão, da malha quadriculada, largamente usada na história, no mundo em geral. Manhattan foi concebida dessa maneira, existem várias cidades desse modo. Nós partimos dessa malha com uma adaptação ao terreno, evidentemente e com a distribuição das funções principais, através de pesquisa e da experiência. Isso resultou no traçado que temos hoje. Não se copiou nada. Quando eu estudei na Inglaterra já nos acusaram de copiar Milton Keynes [cidade do sudeste da Inglaterra, a 70 quilômetros de Londres, fundada em 1967], onde as quadras e a divisão morfológica são mais ou menos parecida. Depois uma pessoa me acusou em público de estar copiando Almere, que é uma cidade da Holanda. Eu não conhecia Almere e tive oportunidade de, em viagem à Europa, marcar com o prefeito e ir a Almere para conhecê-la. São soluções parecidas, porque ambas seguem a malha quadrangular.

Quanto à arquitetura dos prédios públicos, que também apresenta um padrão bem particular, há alguma influência ou inspiração? De onde vem?

Nós procuramos respeitar uma espécie de padrão vernacular da história da arquitetura do Tocantins. Daí essa coisa de colocar cerâmica em todos os prédios, daí os arcos do Palácio [Araguaia, sede do governo estadual], que remetem ao arco que temos em Natividade (TO), os arcos do Tribunal de Justiça, numa versão, é claro, modernizada. Nos prédios públicos procuramos repetir de uma maneira contemporânea naquela época a tradição vernacular da arquitetura que existia no Tocantins.    

As rotatórias, consulte-se qualquer manual de trânsito, são a solução de tráfego mais segura que existe no mundo

Com quase 400 mil habitantes, 34 anos de existência, já são notáveis as reclamações sobre a funcionalidade da cidade. O próprio ex-governador Siqueira Campos já admitiu publicamente necessidade de revisão das rotatórias, símbolo de Palmas. Como o sr. ver esse debate?

Nessa idade em que ele está, é possível que esteja perdendo um pouco o juízo que sempre teve. As rotatórias, consulte-se qualquer manual de trânsito, são a solução mais aperfeiçoada, mais contemporânea, mais segura que existe em termos de tráfego no mundo. Para ter ideia, cruzamento em 90 graus causa, na movimentação do tráfego, 36 oportunidades de conflito. A rotatória causa 16, se souberem usá-la bem. Tem gente que ainda até hoje não sabe, mas, em princípio, seguindo a preferência da pista mais à direita, manobrando o tráfego com o cuidado devido, a rotatória é a solução preferida. Para isso, tenho de me basear na opinião dos outros. Todas as pessoas que vêm a Palmas, colegas meus de seminário, colegas professores, visitantes de qualquer origem ou ordem, sentem-se bem em Palmas. E, da notícia que tenho, os habitantes de Palmas têm noção e orgulho da capital que têm. Temos um sistema viário que talvez não haja com essa quantidade, nessa dimensão nas Américas, essas avenidas de três pistas, circulando em todas as quadras; nós temos uma distribuição de um comércio local, comércio vicinal e os equipamentos bem distribuídos; eu me aposentei agora como professor universitário; se eu chegasse na universidade e percebesse que tinha esquecido o roteiro de minha aula em casa, não me demoraria mais do que 12 a 15 minutos para vir em casa e voltar à universidade, ainda continuaria a dar aula. As quadras, a respeito de ocupação predeterminada, tem uma boa condição de convivência, vizinhança, os equipamentos estão nos eixos principais. Acho que o projeto ainda resiste, depois desses 34 anos.    

Algumas coisas podem ter saído do lugar. Fico pensando que deveria ser função nossa. Foi um erro nosso. Deveria ter previsto que algumas quadras que ficam próximas do comércio deveriam se voltar para esse outro comércio e isso não ficou um espaço para estacionamento suficiente, mas são todos problemas que, com atenção da parte de gestão e planejamento do município, podem ser facilmente resolvidos.

Vista do Palácio Araguaia | Foto: Márcio di Prieto

É um projeto que, em comparação a outras cidades que conhecemos, nos coloca em situação melhor

É possível apontar o que deu certo e aquilo que não funcionou e deve ser corrigido?

Deram certo o bem-estar das pessoas e a funcionalidade da cidade. Palmas não tem favela, não tem congestionamento e não apresenta dificuldade nenhuma para as pessoas fazerem as três funções primordiais da vida urbana – trabalhar, morar e se divertir. Eu penso que é um projeto que, em comparação a outras cidades que conhecemos, nós coloca em situação melhor.

As críticas de que Palmas foi planejada para quem tem carro dizem menos sobre o projeto do que sobre a falta de transporte coletivo eficiente?

Nesta atual circunstância universal, todas as cidades são para quem tem algum modo de se locomover. Mas é verdade, falta em Palmas a solução de um sistema de circulação de transporte público mais eficiente. Nós fizemos nossa parte. Esse eixo, que tem a largura que tem, não é para se parecer com o Eixo Monumental de Brasília; é para poder ter o transporte de massa circulando na ilha central com caudatários ou contribuintes ou linhas que chegam para conversão. Isso é claro e evidente. Foi tentado um projeto pelo prefeito Carlos Amastha [prefeito entre 2013 e 2018], que, por razões outras, não deu certo. O município parece que se esqueceu disso e o Estado, também. É preciso ter um plano de circulação que permita tanto aos que têm carro como aos que dependem do transporte público, particularmente estes últimos, de circular de maneira melhor.  

Palmas 34 anos, como o sr. avalia os desafios e possibilidades da última capital planejada do século 20?

O grande obstáculo desta cidade e de qualquer outra é o confronto entre a gestão articulada e bem feita e a lei de Gerson, aquela coisa de alguém querer a qualquer custo fazer aquilo que quer, do jeito que quer, no lugar que quiser e às vezes a Prefeitura não tem tido os instrumentos para controle. Prova disso é a proliferação de loteamentos irregulares, fora do Plano Diretor. Isso nem era necessário, o Plano Diretor prevê no desenho atual uma ocupação para 1,5 milhão de habitantes. Se a gestão tivesse sido mais aprimorada, como muitas terras eram do Estado, poderíamos ter a população que está aí espalhada gerando problema de transporte, de infraestrutura, de todo tipo, poderia estar no Plano Diretor sendo bem atendida.

Não posso deixar de ter essa relação com a cidade que foi concebida com minha participação significante

O sr. foi professor de Arquitetura da Universidade Federal do Tocantins (UFT). Teve oportunidade de debater com os estudantes a elaboração do Plano Diretor de Palmas?

Eu evitei até o ponto em que podia tratar de Palmas em área de planejamento urbano, por uma razão óbvia: estaria divulgando meu próprio trabalho. Na medida do possível, meus alunos fizeram projetos de parcelamento aqui em Palmas; nas aulas de planejamento urbano, a experiência de Palmas é sempre citada no lugar que tem. Mas a relação que eu tenho com Palmas, isso sei muito bem como responder: a relação que tenho hoje é como se fosse minha terceira filha. É uma relação paternal. Até por reclamação de minhas duas filhas, “pai, o senhor está cuidando demais da sua terceira filha”. Então, não posso deixar de ter essa relação com a cidade que foi concebida por mim e por outras pessoas, com participação significante minha e na qual eu vivo e convivo há tantos anos, observando todo o desenvolvimento. A relação que eu tenho com Palmas, me desculpem quem achar que isso é inapropriado, mas é uma relação paternal.

A soma do interesse de cada um de nós não é o interesse público. O interesse público é o somatório dos interesses comuns a todos nós

Palmas nasceu numa busca de antecipar o futuro. Como o sr. avalia o futuro de Palmas?

Acho que devemos refletir sobre isso. Por enquanto, entre calços e percalços, penso que estamos bem. Seria apropriado que a gestão pública municipal desse mais atenção à atividade de planejamento constante, diuturno, à reflexão sobre a cidade. Porque nós, que somos autores do projeto universal, até fazemos nosso papel. Eu publico artigo em jornal, chamo atenção das autoridades quando posso, mas nosso tempo é o tempo da concepção. O tempo da gestão, o tempo da implantação, o tempo do cuidado, isso é na gestão municipal. Então, é de se notar que o Instituto de Planejamento Urbano (Ipup) precisa ter mais força e maiores condições de trabalhar. A Secretaria de Desenvolvimento Urbano precisa estar apetrechada para controlar e propiciar a localização das atividades certas nos lugares próprios, o que requer, ao que eu penso, um reforço dessa atividade na gestão municipal.

Acontecendo isso, como Palmas tem seu desenho original previsto para mais de 1 milhão e tantos – e nós atualmente, no Plano Diretor só temos um número que não chega a 180 mil habitantes –, é ir preparando essas áreas para receber novos habitantes. E, se for o caso, atrair esses que estão espalhados por aí de qualquer maneira para virem se fixar no Plano Diretor. E assim devem ser cumpridas as regras gerais, não porque eu concebi algumas delas nem que elas tenham partido do projeto original, mas, porque e quando forem convenientes para todo mundo, tem de haver esse regramento geral. A soma do interesse de cada um de nós não é o interesse público. O interesse público é o somatório dos interesses comuns a todos nós. E é isso que a administração, tanto municipal quando do Estado, tem de procurar preservar.